O Governo do Estado de São Paulo publicou no Diário Oficial de 23 de dezembro de 2025 o Decreto nº 70.286, que autoriza a transferência de R$ 38.434.695,00 à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O valor refere-se à prestação de serviços de assistência médica hospitalar e ambulatorial pelo Hospital de Clínicas (HC) no âmbito do programa SUS Paulista, cujos repasses estavam em atraso.
A iniciativa atende uma demanda antiga da instituição e de categorias representativas, que vinham cobrando a regularização de recursos essenciais ao funcionamento da unidade, que é referência em atendimento público em saúde para a Região Metropolitana de Campinas.
Repasse em atraso e impacto assistencial
Documentos oficiais e correspondências internas obtidos pela reportagem indicam que o HC da Unicamp não havia recebido repasses do SUS Paulista ao longo de 2025, acumulando um atraso estimado em 12 meses até o fim do ano.
Em uma resposta enviada pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo a membros do Sindicato dos Trabalhadores da Unicamp (STU), a pasta afirmou que estava em andamento o cálculo do valor correspondente à produção aprovada do 1º quadrimestre e que, concluída essa apuração, seguiria a tramitação para o remanejamento orçamentário em favor da Unicamp, segundo os procedimentos vigentes.
Representantes do sindicato, que também têm acesso às comunicações oficiais sobre os repasses, confirmam que a ausência de repasses ao longo de 2025 ocorreu apesar dos serviços continuarem a ser prestados pelo hospital.
O membro da diretoria sindical José Pio afirmou à reportagem que a justificativa apresentada pelo Estado envolve “entraves burocráticos” e priorização de repasses a entidades filantrópicas.
Segundo Pio, a falta de recursos impactou a rotina assistencial, com redução de cirurgias eletivas e de atendimentos ambulatoriais, em especial nas áreas de maior demanda, e que esse efeito tem como principal prejudicada a população que depende exclusivamente do SUS.
O decreto e o ajuste dos valores
O Decreto nº 70.286 publicado no Diário Oficial determina a transferência de R$ 38,4 milhões à Unicamp, referente à produção de serviços médicos previstos no SUS Paulista. Esse valor corresponde a um bloqueio parcial de repasses que estavam pendentes, mas não encerra a dívida total acumulada no ano.
Parlamentares que acompanharam a mobilização consideram o montante autorizado equivalente a cerca de cinco meses de serviços prestados pelo HC, e afirmam que remanesce um saldo de atraso superior a R$ 30 milhões referente ao exercício de 2025.
Pressão política e mobilização
A regularização parcial dos valores ocorre após intensificação da cobrança pública, inclusive por meio de ofícios protocolados junto ao governo estadual. Em 18 de novembro, a vereadora Fernanda Souto (PSOL) e a deputada estadual Ediane Maria (PSOL) oficializaram um pedido de esclarecimentos à Secretaria de Estado da Saúde acerca dos atrasos dos repasses. Desde então, acompanharam as respostas do Estado e reforçaram a demanda por soluções.
Para Souto, a liberação dos recursos representa “uma importante vitória da nossa luta em defesa da saúde pública”, mas alerta que a mobilização deve continuar até que o restante dos valores seja repassado e as pendências, totalmente sanadas.
"Ainda faltam mais de 30 milhões que estão em atraso e nós vamos seguir cobrando que seja feita essa regularização o mais rápido possível porque isso tem prejudicado o funcionamento do hospital que é uma referência para uma região mais de dois milhões de pessoas", disse a vereadora.
Contexto financeiro e institucional
O Hospital de Clínicas, que atende exclusivamente via Sistema Único de Saúde, também depende do orçamento da própria universidade. A Unicamp vinha realizando aportes extraordinários para equilibrar o caixa e evitar a paralisação de serviços. Em anos anteriores, repasses atrasados do SUS Paulista já haviam sido regularizados por meio de decreto estadual, prática que não se repetiu espontaneamente em 2025, segundo interlocutores da área.
No final de dezembro, o Conselho Universitário da Unicamp aprovou a proposta de autarquização do complexo de saúde da universidade, que, segundo a Reitoria, visa ampliar a autonomia e o desenvolvimento das atividades de saúde e ensino. A proposta inclui garantias de que o atendimento continuará 100% pelo SUS e que o orçamento da universidade não será prejudicado, além de assegurar os direitos dos funcionários.