Por: Raquel Valli

Câmara de Campinas (SP) divulga balanço 2025, mas não cita R$ 20 milhões com novos assessores

78ª Reunião Ordinária da Câmara de Campinas; escândalos envolveram vereadores em 2025 | Foto: Álvaro Jr

A Câmara de Campinas (SP) divulgou no site da Casa uma espécie de balanço intitulado “Câmara fecha 2025 com intensa produção legislativa e ações que ampliaram a participação cidadã e as políticas públicas sociais”. Entretanto, não divulgou no texto a aprovação de 105 novos cargos comissionados que custarão mais de R$ 20 milhões aos cofres públicos. 

A reforma administrativa foi citada no pé da página, informando que o Legislativo contratou “uma consultoria especializada externa, a FIA (Fundação Instituto de Administração) da USP “para desenvolver estudos sobre a modernização da estrutura, no que se refere ao quantitativo de pessoal para atender as demandas atuais de uma Câmara Municipal do porte de Campinas, uma das maiores cidades do país”. O valor da contratação também não consta no texto. 

Audiências públicas? 

Para o economista José Afonso Bittencourt, conhecido como Zé Afonso, ex-secretário de Desenvolvimento Econômico da Prefeitura, “um aumento de 105 funcionários no primeiro ano da atual legislatura mostra uma grande insensibilidade dos vereadores de Campinas com o dinheiro público. Uma empresa privada, para fazer um aumento deste, teria que dar um lucro muito grande e pedir uma aprovação para seu Conselho de Administração. A Câmara não debateu o assunto através de audiências públicas, aprovou a toque de caixa. Isto não só demonstra a insensibilidade como a falta de respeito com os recursos públicos”, afirma. “E exatamente num ano onde houve um grande escândalo apontado pelo MPE (Ministério Público Estadual) das emendas impositivas com suspeita de rachadinhas por alguns vereadores”, complementa.

Já a Câmara sustenta que as novas contratações são necessárias para “dar mais agilidade aos trabalhos legislativos e aos procedimentos internos e atender às mais novas exigências do TCE (Tribunal de Contas do Estado) de São Paulo”, órgão que permite o aumento desse tipo de gasto.

Para o economista, entretanto, o verdadeiro motivo para contratação de novos servidores indicados politicamente não é fortalecer o serviço administrativo. “É um dinheiro público que vai fortalecer as bases eleitorais dos vereadores. Uma insensibilidade, sobretudo, no atual momento da economia do Brasil”.

Pra quê?

Ao longo do ano, até o último dia 15, a Câmara analisou 141 Projetos de Lei Complementar, 461 Projetos de Lei Ordinária, 300 Projetos de Decreto Legislativo, 18 Projetos de Resolução e 3 Projetos de Emenda à Lei Orgânica. Apresentou 222 Moções, 2.447 Requerimentos e 11.401 Indicações ao Poder Executivo. Atuou em 23 Comissões Permanentes, criou 16 Comissões de Especiais de Estudos e 35 Frentes Parlamentares. Registrou 92 sessões (ordinárias e extraordinárias), 85 solenidades e 51 audiências públicas.

A repositora de estoque Roberta Oliveira, que vive com cerca de dois salários mínimos, questiona: “pra que é que serve tudo isso na vida no povo?” E afirma: “pra nada. O que é que todo esse trabalho inútil reflete na Saúde, na Educação, no Transporte? Nada. Não vejo nenhum vereador pegando fila no Mario Gatti, pegando ônibus, que vive quebrado. É só conversa e gastação de dinheiro”.

Mas, para o presidente da Câmara, Luiz Rossini (Republicanos), “o intenso volume de trabalho na Câmara já é uma realidade frequentemente tanto na quantidade quanto na qualidade de propostas debatidas na Casa. Isso reflete a alta demanda por atividades legislativas e o atendimento às necessidades da população”.

Escândalos 

Só este ano, foram abertas duas Comissões Processantes: uma resultou na absolvição do vereador Vini Oliveira (Cidadania-SP) e a outra, segue em andamento investigando o vereador Otto Alejandro (PL-SP),

Houve também a renúncia do vereador Zé Carlos (PSB-SP), com a posse do suplente Ailton da Farmácia (PSB-SP).

Zé Carlos (PSB-SP)

Renunciou ao mandato em 30 de junho de 2025, logo após admitir ao Ministério Público de São Paulo o pedido de propina para a renovação de contratos de empresas prestadoras de serviço na Câmara. O caso refere-se ao período em que ele presidiu a instituição, entre 2021 e 2022. 

A renúncia ocorreu horas antes do plenário votar a abertura da Comissão Processante, que poderia resultar na cassação e na perda de direitos políticos do parlamentar por oito anos. Com a saída voluntária, o processo foi arquivado. Como parte de um acordo, para evitar um processo criminal, Carlos se comprometeu a pagar uma multa de R$ 151,8 mil.

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Zé Carlos (PSB-SP) renunciou antes de ser cassado | Foto: Câmara Municipal de Campinas

Vini Oliveira (Cidadania-SP)

O plenário decidiu pela absolvição do vereador em julho de 2025, arquivando o processo que poderia resultar na cassação do mandato. A investigação analisou a conduta do parlamentar durante uma fiscalização no Hospital Mário Gatti. Vini, conhecido como o "vereador tiktoker", foi acusado de filmar pacientes e profissionais sem autorização, além de suposto abuso de autoridade.

Otto Alejandro (PL-SP)

A Câmara aprovou em novembro a abertura de uma Comissão Processante por unanimidade para investigar quebras de decoro parlamentar relacionadas a denúncias de violência doméstica, injúria, ameaça e dano, após denúncia feita pela namorada à Polícia Civil. Vídeos foram divulgados publicamente, mostrando Alexandro em situações de conflito.

O colegiado responsável pela investigação, presidido pela vereadora Fernanda Souto (PSOL-SP), tem um prazo de até 90 dias para realizar diligências e apresentar um parecer final que pode levar à cassação do mandato. O vereador nega todas as acusações e afirma ser alvo de perseguição política.

Orçamento

A Câmara aprovou o orçamento de R$ 11,7 bilhões para 2026, além do plano estratégico para os próximos quatro anos. Os vereadores destinaram R$ 113,85 milhões em emendas, sendo que metade desse valor deve ser obrigatoriamente investida na Saúde. 

Também foi oficializado um programa de regularização de dívidas para 2025 e a devolução de R$ 13 milhões economizados pelo Legislativo para que a Prefeitura os aplique em áreas prioritárias. O valor poupado equivale a duas casas em um condomínio de luxo na cidade. 

O Legislativo aprovou a abertura de 500 vagas para agentes de educação infantil e a criação da Secretaria Municipal de Políticas para a Mulher. Destinou R$ 5 milhões para programas de atendimento a crianças e adolescentes, o equivalente a um carro superluxuoso.

Instituiu-se a notificação obrigatória para casos de intoxicação por metanol. Estabeleceu 15 minutos de gratuidade em estacionamentos de hospitais e clínicas, e isenção de taxas de estadia no pátio municipal aos fins de semana e feriados. Proibiu o uso de anticoncepcionais injetáveis em pets, sem indicar como a infração será fiscalizada, e estabeleceu regras para o cuidado de animais comunitários.

Urbanismo

Autorizou a doação de terrenos municipais para a construção de 100 casas do programa Minha Casa, Minha Vida. O déficit habitacional na cidade é de 18 mil famílias, de acordo com os últimos dados disponibilizados pela Cohab, referentes a 2024. 

Doou ainda uma área para a instalação do Hospital Metropolitano. No campo administrativo, atualizou as normas para emissão de alvarás e a criação de microflorestas urbanas.

Gestão e Transparência

O Tribunal de Contas aprovou o exercício de 2023 da instituição, e a Casa recebeu o Selo Ouro da Atricon por manter o índice de transparência acima de 90%. No atendimento ao público, foi lançado o aplicativo Câmara Cidadã.

Comunicação

A TV Câmara utilizou inteligência artificial na apresentação de telejornais e transmitiu eventos culturais. Os programas Parlamento Jovem e Câmara Educa atenderam estudantes de diferentes níveis de ensino para formação cívica, somando centenas de participantes em visitas coordenadas.