Em 'Por Que Não Nós?', três atores transformam amizade de 18 anos em reflexão sobre educação emocional masculina e papéis de gênero
Nesta segunda-feira (1) o Teatro Gláucio Gill apresenta "Por Que Não Nós?", comédia dramática que nasce da amizade de três atores e se transforma em provocação sobre como a sociedade educa homens para a supressão de sentimentos. Escrita por Júlia Spadaccini e dirigida por Débora Lamm, o espetáculo integra o "Festival Todos no TGG - 30 Espetáculos em 30 dias" que celebra os 60 anos do teatro e que chega ao seu termino nesta terça-feira.
Samuel de Assis, Amaury Lorenzo e Felipe Velozo se conhecem há quase duas décadas, desde os anos 2000, quando migraram de Salvador, Aracaju e Minas Gerais para o eixo Rio-São Paulo apostando tudo na carreira artística. A amizade começou lentamente, mas ganhou intensidade quando passaram a morar no mesmo prédio no Rio. "Acabou que a gente virou a nossa rede de apoio. São três pessoas de fora, morando no Rio por causa do trabalho", disse Samuel em entrevista ao portal Metrópoles.
A decisão de transformar essa amizade em espetáculo foi orgânica. "A gente começou a viralizar nas redes fazendo essas palhaçadas, e aí a gente falou: precisamos botar no palco, porque somos três pessoas que vêm do teatro", relembra. No enredo, três atores ensaiam para espetáculo onde interpretam personagens femininas — Ângela, Celeste e Catarina — que se apoiam mutuamente durante o término de um relacionamento. O texto embaralha constantemente o que é ensaio, o que é performance e o que é vida pessoal dos três homens em cena.
A dramaturgia investiga a chamada masculinidade tóxica. O bordão "homem não chora" persiste na sociedade, impedindo que homens revelem emoções, sentimentos e angústias que carregam escondidos. A sociedade cobra dos homens postura de força, coragem, frieza — nunca emotividade. "O que impede é a nossa criação machista e sexista", afirma Samuel. O que Júlia Spadaccini e Débora Lamm fizeram foi criar espaço onde essa criação opressora pudesse ser examinada através do riso, da comédia, sem pesadez desnecessária.
"A gente levanta as questões, expõe! A discussão acerca de tudo isso é feita no pós-peça! Tudo feito de uma maneira leve, engraçada e dinâmica!", detalha Samuel. E Amaury Lorenzo enfatiza a importância do teatro para esse tipo de debate. "O teatro pode, e muito, contribuir para os debates que brotam das questões de gênero, no mundo em que vivemos, que estão fervilhando e reclamando outros modos de discussão", pontua.
Para Samuel, a capacidade de falar sobre questões pessoais veio através de terapia. "Muitos anos de terapia me fizeram começar a me abrir pro mundo!", destaca o ator que acumula 25 anos de carreira. Felipe Velozo reforça essa busca por compreensão: "Quisemos entender como somos atingidos pela contenção do que sentimos, mesmo rindo das ansiedades e das angústias que essa contenção provoca."
Felipe também exalta o trabalho das mulheres que compõem o espetáculo, particularmente a direção de Débora Lamm. "O grande acerto foi a gente ter a direção de uma mulher. Eu acho que Débora trouxe soluções cênicas brilhantes para a construção do nosso espetáculo." Também destaca Júlia Spadaccini como autora que "derrama o olhar dela de mundo, de sociedade. E nós contribuímos com as nossas questões, as nossas dores, nossas experiências, nossos amores. Eu acredito que o diálogo desse time fez a gente não derrubar, mas dissolver minimamente os muros."
A saúde emocional de homens, suas parceiras e parceiros está no foco desta montagem que percorreu o país e contribui para que tanto seus atores quanto o público passem a ver com outros olhos o universo emocional masculino, reconhecendo que vulnerabilidade não é fraqueza, mas uma chave para conexões verdadeiras.
SERVIÇO
POR QUE NÃO NÓS?
Teatro Gláucio Gill (Praça Cardeal Arcoverde, s/nº, Copacabana) | 1/12, às 20h
Ingressos: R$ 40 e R$ 20 (meia)