Por: Cláudio Handrey - Especial para o Correio da Manhã

CRÍTICA / TEATRO / AOS SÁBADOS: Memórias delicadas

'Aos Sábados' mostra que o amor é capaz de reconectar | Foto: Divulgação

O Alzheimer é uma doença degenerativa do cérebro, que compromete progressivamente as funções cognitivas como perda de memória, raciocínio, produzindo ao paciente apatia, depressão, irritabilidade... e é sobre isso que o texto de Adyr de Paula ocupa-se com extrema delicadeza. Numa respiração tchekhoviana, retratando a vida comum, com tristezas e frustrações, o dramaturgo alcança êxito ao conceber uma escrita repleta de variações sobre o tema e a família de uma mãe com três filhas, imbuídas de amor e conexão, que levam a vida comum até o surgimento de sintomas neuropsiquiátricos. De Paula explora humor na convivência doméstica, o que atenua a gravidade temática, instituindo com sabedoria momentos poéticos como a fala da filha Regina quando a mãe insiste em tomar banho sozinha: “Pensa que você está numa cachoeira, lavando a alma”.

No entanto, Danilo Salomão levanta uma montagem sem teatralidade, exacerbando-se em marcas fixas, em que acomoda as atrizes por muito tempo no sofá e volta a repetir na segunda parte quando as mesmas permanecem na poltrona, todas ao lado direito do palco. Há um excesso de naturalismo, pouco dinamismo, sobre os quais o espetáculo priva-se de cores.

Determinar um caminho realista equipara-se à dramaturgia, mas ausentar-se das especificidades teatrais é perigoso. O diretor André Antoine, na segunda metade do século XIX debruçou-se sobre o naturalismo na França, o que foi reforçado pelo grande Stanislavski e seu método de ensino, do qual o cinema apoderou-se, mas de qualquer forma, o teatro não deve assemelhar-se ao audiovisual.

As atrizes encontram uma perfeita contracena. Experientes, Nedira Campos e Helga Nemetik abrilhantam o palco. Campos trafega com força dramática e entendimento sua Jandira, matizando com eficiência a personagem, que desagua em emoções. Nemetik, além de possuir ótimas expressões vocais/corporais, abusa adequadamente da comediante que é, desvelando encanto e teatralidade cênica. Laura Proença, um pouco menos teatral, segue um percurso convincente em sua Regina, amalgamando-se com graciosidade ao todo.

André Sanches ambienta o palco com um mobiliário adequado à proposta, numa conexão de época. O figurino de Fernando Vieira auxilia na coloração cênica, dando vida às personagens. A luz de Rogério Wiltgen sobressai-se inundando a cena de magia, com elipsoidais criando ruas, que favorecem dinâmica e contribuem para a dramaticidade. E a trilha excelente de Marcelo Alonso Neves invade nossa audição com “Rock and Roll Lullabay”, “Just The Way You Are”, além de “Lady in Red”, inspirando o momento de dança com a matriarca. “Aos sábados” nos faz refletir que devemos sempre amar e acolher nossos amores, que desconectam sem querer.

SERVIÇO

AOS SÁBADOS

Teatro dos 4 (Shopping da Gávea - Rua Marquês de São Vicente, 52)

Até 3/12, terças e quartas (20h)

Ingressos: R$ 100 e R$ 50 (meia)