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Música e dança como peças de resistência de um povo subjugado

Veias Abertas 60 30 15 | Foto: Ligia Jardim/Divulgação

AAquela Cia. marca seus vinte anos de trajetória com uma proposta audaciosa: transformar a densa obra "As Veias Abertas da América Latina", do uruguaio Eduardo Galeano, em um espetáculo musical que celebra a resistência através da festa. "Veias Abertas 60 30 15", com direção de Marco André Nunes e texto de Pedro Kosovski e Carolina Lavigne, desembarca no Rio de Janeiro para temporada no Sesc Copacabana após passagem por São Paulo.

O livro de Galeano, publicado em 1971 e censurado durante a ditadura militar brasileira, denuncia séculos de exploração econômica do continente latino-americano. A montagem teatral, porém, escolhe um recorte específico dessa narrativa histórica. "A obra de Galeano aborda ciclos de exploração como o ouro, a prata, o café, o algodão e o açúcar. O foco central da narrativa da peça é o da banana, que deu origem à expressão 'República das Bananas', apelidado dado aos países latino americanos e o massacre dos trabalhadores da Union Fruit, na Colômbia em 1928", explica Marco André Nunes.

O massacre de trabalhadores colombianos representa um dos momentos mais emblemáticos da dominação econômica estrangeira na América Latina, tema que ressoa com questões contemporâneas sobre dependência e soberania. Pedro Kosovski, responsável pela dramaturgia, esclarece que "a intenção é ampliar poeticamente o potencial da obra de Galeano, que é muito dura ao tratar de todas as explorações sofridas pela América Latina ao longo dos séculos".

A estratégia cênica adotada pela companhia contrasta deliberadamente com a gravidade do tema. Em vez de reproduzir o tom de denúncia do texto original, o espetáculo aposta na música e na dança como formas de resistência cultural. "A peça se passa em 'aulas de dança' e é dividida por ritmos musicais latinos, incluindo salsa, bolero, mambo, samba e punta (ritmo hondurenho). A trilha sonora inclui canções de artistas como Grupo Niche, La Charo, Nelson Ned, Perez Prado e Yma Sumac, com figurinos típicos e máscaras customizadas e regionais (peruanas, argentinas e brasileiras). O espetáculo busca fortalecer, em nós brasileiros, o senso de pertencimento latino-americano", detalha o diretor.

Essa abordagem reflete uma característica marcante da Aquela Cia., conhecida por seus processos de criação coletiva e pela elaboração de dramaturgias que atravessam conceitos de memória coletiva e imaginário social. Ao longo de duas décadas, a companhia desenvolveu um repertório que vai desde releituras de ídolos pop, como o álbum "Outside" de David Bowie, até adaptações de autores clássicos como Franz Kafka.

O título "Veias Abertas 60 30 15" revela uma dimensão conceitual que dialoga com a contemporaneidade digital. Os números se referem à duração progressivamente decrescente das cenas - de 60 para 30, 15.

SERVIÇO

VEIAS ABERTAS 60 30 15

Sesc Copacabana - Mezanino (Rua Domingos Ferreira, 160 - Copacabana)

De 17/7 a 10/8, de quinta a domingo (20h30) | Ingressos: R$ 30, T$ 15 (meia) e R$ 10 (associado do Sesc)