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Musical 'Elza' celebra a eterna cantora em nova temporada carioca

O musical 'Elza' estreou em 2028 no Rio e já passou por 15 cidades, com uma audi^necia de mais de 100 mil espectadores | Foto: Andréa Nestrea/Divulgação

Do alto de mais de 100 mil espectadores e uma impressionante coleção de prêmios, o musical "Elza" desembarca novamente no Rio de Janeiro para uma temporada especial no Teatro Claro Mais. A montagem, que estreou em julho de 2018, representa um marco na dramaturgia musical nacional ao fugir do formato convencional das biografias cênicas. Com texto de Vinícius Calderoni e direção de Duda Maia, o espetáculo adota uma estrutura não cronológica na qual diferentes atrizes interpretam diferentes facetas da cantora simultaneamente.

Nesta nova temporada, sete atrizes sobem ao palco: Ágata Matos, Janamô, Josy.Anne, Júlia Sanchez, Julia Tizumba, Sara Hana e a estreante Naruna Costa, que se junta ao elenco como convidada especial. Costa, vencedora do Prêmio Shell 2024 de Melhor Diretora Musical, traz sua experiência como atriz, cantora e diretora para a montagem.

O processo criativo do musical nasceu de um encontro direto entre Calderoni e a própria Elza Soares, que orientou o tom da obra. "A Elza me disse: 'sou muito alegre, viva, debochada. Não vai me fazer um musical triste, tem que ter alegria'", relembra o dramaturgo. Essa diretriz fundamental moldou toda a abordagem do espetáculo, que opta por celebrar a resistência e a reinvenção da cantora através da alegria, mesmo diante das tragédias que marcaram sua vida.

Dona de uma das vozes mais impressionantes de nossa música, a vida da ratista foi um verdadeiro testamento de resiliência e superação diante de adversidades profundas. Nascida em extrema pobreza, sua infância foi marcada pela necessidade de um casamento forçado aos 12 anos e pela maternidade precoce aos 13. O luto a acompanhou por toda a vida, especialmente com a perda de diversos filhos: um pela fome na infância, outros dois em um acidente de carro nos anos 1990, e mais tarde, Gerson e João, também em acidentes ou por complicações de saúde.

Além das perdas familiares, Elza enfrentou violência doméstica em seu relacionamento com Garrincha e foi constantemente alvo de racismo e preconceito como mulher negra. No entanto, canalizou todas essas dores e empoderou-se. É uma legítimna sobrevicente do Planeta Fome.

 

Repertório do musical embaralha as diferentes épocas da carreira de Elza

As atrizes Ágata Matos, Janamô, Josy.Anne, Júlia Sanchez, Julia Tizumba, Sara Hana e Naruna Costa encarnam em cena diferentes facetas da cantora numa narrativa que foge da cronologia | Foto: Andréa Nestrea/Divulgação

Apesquisa dramatúrgica para o espetáculo foi extensa e rigorosa. Vinícius Calderoni mergulhou em incontáveis entrevistas da artista e incorporou referências de pensadoras negras como Angela Davis e Conceição Evaristo, cujos fragmentos textuais aparecem na peça. O autor destaca o caráter colaborativo do processo: "Hoje poderia dizer que elas são coautoras e colaboradoras do texto. São sete atrizes negras e múltiplas, como a Elza é. Diante da responsabilidade enorme, eu estabeleci limites de fala para mim em relação a alguns temas".

A direção musical de Larissa Luz trabalha em sintonia com os arranjos criados pelo saudoso maestro Letieres Leite, da Orquestra Rumpilezz, que reimaginou clássicos como "Lama", "O Meu Guri", "A Carne" e "Se Acaso Você Chegasse". O processo colaborativo gerou ainda duas composições inéditas: "Ogum", de Pedro Luís, e "Rap da Vila Vintém", de Larissa Luz.

O repertório musical embaralha diferentes épocas da carreira de Elza, mesclando sucessos históricos como "Malandro", "Lata D'Água" e "Cadeira Vazia" com trabalhos mais recentes como "A Mulher do Fim do Mundo" e "Maria da Vila Matilde". Essa escolha reflete a própria natureza atemporal da artista, que se reinventou constantemente ao longo de mais de seis décadas de carreira.

A encenação de Duda Maia, reconhecida por trabalhos como "Auê" e múltiplas premiações, privilegia a corporalidade e a escuta das intérpretes. "Foi um processo de ensaios muito vivo, em que partimos do princípio que a voz não é nossa, é das atrizes. Fizemos este trabalho para elas e a partir de propostas delas", explica a diretora.

O espetáculo foi desenvolvido durante o período do último renascimento artístico de Elza Soares, quando a artista, em idade já avançada, lançou os aclamados álbuns "A Mulher do Fim do Mundo" (2015) e "Deus é Mulher" (2018), consolidando-se como uma das principais vozes da mulher negra brasileira e conquistando reconhecimento internacional renovado.

A nova temporada carioca marca o primeiro retorno do musical à cidade após a morte de Elza, em janeiro de 2022. O reconhecimento crítico da montagem, que inclui prêmios Shell, APCA, Reverência e Cesgranrio, confirma sua relevância no recente panorama teatral brasileiro.

Calderoni e Duda Maia são dois nomes de destaques na cena teatral. Pela direção de "Auê" (2016), estrelado pela Cia. Barca dos Corações Partidos, ela conquistou os prêmios Shell, Cesgranrio e Botequim Cultural de Melhor Direção, além dos prêmios APTR e Cesgranrio de Melhor Espetáculo e o Bibi Ferreira de Melhor Musical Nacional. Enquanto isso, Calderoni já ganhou o Prêmio Shell de Melhor Autor por "Ãrrã" (2015), o APCA por "Os Arqueólogos" (2016) e coleciona outras indicações e troféus por espetáculos da companhia Empório de Teatro Sortido, que lidera ao lado de Rafael Gomes.

A sintonia entre os dois é determinada por uma característica fundamental: a escuta e a participação das intérpretes. "Foi um processo de ensaios muito vivo, em que partimos do princípio que a voz não é nossa, é das atrizes. Fizemos este trabalho para elas e a partir de propostas delas. Precisamos olhar para o grupo, para a troca", conta Duda.

SERVIÇO

ELZA

Teatro Claro Mais (Rua Siqueira Campos, 143 - 2º Piso - Copacabana)

Até 20/7, quintas e sextas (20h), sábados (16h e 20h) e domingos (18h)

Ingressos entre R$ 39,60 e R$ 19,80 (meia) e R$ 180 e R$ 90 (meia)