Em celebração aos 90 anos de Plínio Marcos, a companhia teatral Churros de Polvo estreia nesta quarta-feira (12), na Casa de Cultura Laura Alvim, "Xadrez III", espetáculo que revisita a obra do dramaturgo morto em 1999 ao unir dois de seus textos mais impactantes: "Barrela" (1958) e "A Mancha Roxa" (1988). Sob a direção de Henrique Manoel Pinho, a montagem mergulha na brutalidade do sistema carcerário brasileiro, contrapondo realidades masculinas e femininas para evidenciar as diferentes nuances de violência e abandono nesses contextos. A obra de Plínio surge cada vez mais atual no Brasil de hoje.
Inspirado em fatos reais, "Barrela" foi o primeiro texto teatral de Plínio Marcos e retrata a cruel jornada de um jovem recém-encarcerado, que, em uma única noite, enfrenta a opressão e a barbárie dentro da prisão. Já "A Mancha Roxa" desloca o público para uma cela feminina, onde detentas de diferentes origens lidam com suas tragédias pessoais, uma enfermidade devastadora e a luta pela sobrevivência. Embora "Xadrez III" não tenha sido concebido especificamente como um espetáculo sobre questões de gênero, a montagem destaca a solidão e o desamparo das mulheres encarceradas, bem como a dinâmica de poder e violência entre os homens.
A ideia de montar esse espetáculo surgiu há dois anos, quando a peça foi apresentada por um grupo de alunos da Casa das Artes de Laranjeiras (CAL). O impacto da encenação levou os atores a transformá-la em um projeto profissional, consolidando-a como a primeira produção oficial da Cia Churros de Polvo. Além da homenagem ao legado de Plínio Marcos, a montagem reafirma a atualidade de seu olhar crítico e provocador sobre a sociedade brasileira.
Formada por nove atores com trajetórias diversas, a Churros de Polvo tem a criação coletiva como princípio essencial. O grupo é composto por Ana Clara Winter, André Andrade, Aldrin Cordeiro, Bruno Jugend, Estefânia Torres, Fernanda Sarriá, Marcela Garcia, Nathan Soares e Raphael Montenegro. Além de "Xadrez III", a companhia organiza um evento especial na CAL para aprofundar a discussão sobre a obra de Plínio Marcos, com apresentações para alunos e rodas de conversa. Para o futuro, a Cia pretende expandir sua pesquisa teatral, explorando textos autorais sem abrir mão de narrativas provocativas e socialmente relevantes.
"Plínio Marcos nos inspira porque sua obra é atemporal e reflete ideais que também enxergamos como missão de grupo. Ele fazia teatro na raça, sem concessões, e isso nos motiva a seguir criando, independentemente das dificuldades", afirmam os integrantes da companhia.
Plínio Marcos foi um dos mais importantes dramaturgos brasileiros, conhecido por sua escrita crua e direta, que escancarava as mazelas sociais do país. Autodidata, começou sua trajetória artística como ator e palhaço de circo antes de se dedicar à dramaturgia. Seu primeiro grande sucesso, "Barrela", foi censurado na época por seu conteúdo considerado agressivo, mas essa interdição apenas reforçou a imagem de Plínio como um autor combativo e marginal.
Ao longo de sua carreira, escreveu textos que retrataram com brutalidade e lirismo a realidade dos excluídos, como "Navalha na Carne", "Abajur Lilás" e "Homens de Papel". Com forte influência do teatro realista, sua obra traz personagens do submundo - prostitutas, presidiários, cafetões e marginais - cujas falas carregam um realismo visceral, desafiando padrões morais e políticos.
Perseguido pela censura durante a ditadura militar, Plínio manteve-se à margem do teatro comercial, vendendo seus textos de mão em mão para garantir sua sobrevivência. Sua resistência fez dele um símbolo do teatro independente e contestador. Até hoje, sua obra reverbera nos palcos, inspirando artistas que enxergam no teatro um espaço de denúncia e transformação social.
SERVIÇO
XADREZ III
Casa de Cultura Laura Alvim - Sala Rogério Cardoso (Av. Vieira Souto, 176 - Ipanema)
De 12 a 27/2, às quartas e quintas (19h)
Ingressos: R$ 50 e R$ 25 (meia)