Em mais um capítulo da escalada de atritos entre o Legislativo e o Judiciário, a Polícia Federal (PF) deflagrou na sexta-feira (19), a Operação Galho Fraco, autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino, que teve como alvos os deputados federais Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), líder do Partido Liberal na Câmara, e Carlos Jordy (PL-RJ). A investigação apura suspeitas de desvio de recursos públicos por meio do uso irregular da cota parlamentar.
Segundo relatório parcial da PF, cujo sigilo foi levantado por Dino, foram identificadas movimentações financeiras consideradas suspeitas que somam mais de R$ 28,6 milhões em contas de assessores dos gabinetes dos parlamentares, funcionários do partido e pessoas próximas, sem justificativa plausível para a origem dos recursos.
Os agentes cumpriram sete mandados de busca e apreensão, com aval da Procuradoria-Geral da República (PGR), incluindo buscas pessoais, veiculares e em imóveis ligados aos investigados. Em um dos endereços de Sóstenes Cavalcante, a PF encontrou cerca de R$ 400 mil em dinheiro vivo.
Cota parlamentar
De acordo com as investigações, os deputados são suspeitos de utilizar locadoras de veículos de fachada para desviar recursos da cota parlamentar — verba destinada a custear despesas do mandato, como aluguel de veículos para atividades oficiais. A PF aponta indícios de que empresas contratadas não teriam capacidade operacional compatível com os serviços declarados, além de possíveis repasses de recursos a servidores comissionados.
O relatório também cita movimentações financeiras incompatíveis com a renda declarada de assessores ligados aos gabinetes dos parlamentares, além de transações fracionadas e pagamentos sem identificação clara de destinatários.
Investigados
Em entrevista, Sóstenes Cavalcante afirmou que o dinheiro apreendido em seu endereço tem origem lícita, proveniente da venda de um imóvel em Minas Gerais. Segundo o deputado, o valor já estaria declarado no Imposto de Renda e não foi depositado em banco devido à “correria de trabalho”.
“Eu vendi um imóvel e recebi, dinheiro lacrado, tudo normal. […] Com essa correria de trabalho, eu acabei não fazendo o depósito, mas eu faria. Foi simplesmente um lapso”, disse o parlamentar, acrescentando que o dinheiro estava guardado em seu flat em Brasília e que seus contadores cuidam de suas movimentações financeiras.
Já o deputado Carlos Jordy divulgou vídeo nas redes sociais classificando a operação como “covarde”. Ele afirmou que o mandado de busca foi cumprido na data do aniversário de sua filha e citou uma operação anterior, em janeiro de 2024, relacionada às investigações sobre os atos de 8 de Janeiro. Jordy alegou ter sido alvo, à época, de acusações baseadas em uma “foto forjada”.
Reação política
No mesmo dia da operação, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmou que o STF cumpre seu papel ao autorizar investigações, mas defendeu a necessidade de estabelecer limites.
“O Judiciário faz o seu papel, só temos que separar o que é correto do que é exagero. […] Se há suspeita, tem que investigar mesmo, mas quando há exagero isso é ruim para o país”, afirmou, em café da manhã com jornalistas.
Para o professor de Direito Penal do Ibmec Brasília, Tédney Moreira, o avanço da investigação para a fase de buscas indica que o STF reconheceu a existência de indícios relevantes. Segundo ele, caso os elementos sejam confirmados, o próximo passo pode ser a apresentação de ação penal pelo Ministério Público Federal.
Moreira ressalta que o STF tem competência para conduzir investigações envolvendo deputados federais por crimes cometidos no exercício do mandato e que a atuação judicial não depende de autorização da Câmara. Do ponto de vista político, o especialista avalia que o fato de os alvos ocuparem posições de liderança partidária tende a ampliar a repercussão do caso e pode estimular reações no Congresso, aprofundando a já delicada relação entre os poderes.