O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmou, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, que rompeu com o líder do PT na Casa, Lindbergh Farias (RJ). A declaração de Motta ocorre uma semana depois de o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), dizer algo semelhante com relação ao líder do governo na Casa, Jaques Wagner (PT-BA).
"Não tenho mais interesse em ter nenhum tipo de relação com o deputado Lindbergh Farias", declarou. O tensionamento entre os dois políticos pode acentuar os desgastes na relação do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com a Câmara, num momento em que há atritos também do Palácio do Planalto com o Senado. De acordo com dois líderes da Casa próximos a Motta, a relação entre os dois, agora, será meramente institucional.
Desgaste
Nos últimos meses, o grupo de Motta se queixava da atuação de Lindbergh, acusando o parlamentar de se exaltar nas discussões e buscar desgastar a imagem da Câmara junto à opinião pública. A cúpula da Casa também critica o comportamento do deputado nas reuniões semanais com líderes e Motta, afirmando que ele atua como se fosse líder do governo, quando deveria responder só pela bancada do PT.
O petista é um dos deputados mais atuantes na defesa do governo e de suas pautas na Casa e tem usado publicações nas redes sociais e falas na tribuna para fazer essa disputa política.
“Reação imatura”
Em resposta, Lindbergh afirmou que considerou a declaração como uma "reação imatura" de Motta. Ele disse ainda que "política não é um clube de amigos" e que suas posições políticas sempre foram conhecidas.
"Considero imatura a reação do presidente Hugo Motta. Política não é um clube de amigos. Minhas posições políticas sempre foram postas às claras e são extremamente previsíveis. Imprevisível é o que tem acontecido ultimamente [na Câmara], o que foi a votação do IOF, a escolha do Derrite como relator de um projeto de lei do Executivo e a PEC da Blindagem", afirmou Lindbergh.
A discussão do projeto de lei antifacção, aprovado na Câmara na semana passada, acentuou o desgaste na relação de Motta com Lindbergh, dizem aliados do parlamentar. Integrantes da cúpula da Câmara se queixam, sob reserva, da atuação do governo e de seus ministros na tramitação da matéria, acusando-os de incentivar ataques à Câmara e do que consideram "narrativas" acerca do conteúdo do texto.
Motta escolheu como relator do projeto enviado pelo Executivo – e apontado como principal resposta de Lula à crise na segurança pública após megaoperação no Rio – o deputado Guilherme Derrite (PP-SP), secretário de Segurança do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), considerado o potencial adversário do petista em 2026.
A decisão do presidente da Câmara gerou contrariedade entre integrantes do Planalto e tensionou o debate da matéria. O relator fez uma série de mudanças ao texto que foram criticadas pelo governo federal. Diante disso, o Executivo orientou votação contra a proposta, mas acabou sendo derrotado. O texto, agora, está em análise pelo Senado.
O próprio Motta falou publicamente do descontentamento em entrevistas e publicações nas redes nos últimos dias.
Clima ruim
Um cardeal do Centrão diz que, hoje, o clima entre os parlamentares e o Planalto é muito ruim, citando também o que classifica como acordos não cumpridos do Executivo – na redistribuição de cargos, na baixa execução orçamentária e em relação às matérias em discussão na Casa.
Esse parlamentar prevê maior tensionamento nos próximos dias. Aliados de Motta negam, no entanto, que haja um rompimento com a ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, responsável pela relação entre Executivo e Legislativo, mas afirmam que a relação do parlamentar com a ministra também foi abalada.
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), é apontado por líderes do Centrão como um nome que atua para distensionar a relação da cúpula da Casa com o Planalto.
Messias
Os problemas entre Motta e Lindbergh acontecem em um momento em que também não está boa a relação de Davi Alcolumbre com o governo. Alcolumbre defendia que o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) fosse indicado para o Supremo Tribunal Federal (STF) na vaga aberta com a aposentadoria de Luís Roberto Barroso. Mas Lula preferiu indicar o advogado-geral da União, Jorge Messsias.
Alcolumbre não gostou de Jaques Wagner ter minimizado a sua reação e a reação do Senado à escolha. E, como Motta agora com relação a Lindbergh, afirmou também ter rompido com o líder do governo.
Nesta segunda-feira (24), Alcolumbre respondeu nesta segunda-feira com uma nota à tentativa de aproximação de Jorge Messias. Alcolumbre divulgou um texto no qual diz que a indicação será analisada "no momento oportuno", sem nem citar Messias pelo nome.
Mais cedo, o indicado de Lula havia divulgado um texto no qual elogiava o presidente do Senado. Messias tenta se aproximar de Alcolumbre, que queria que o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) fosse indicado para a vaga no STF. Indicados para o Supremo só assumem o cargo se forem aprovados pela Casa por ao menos 41 dos 81 senadores.
Em sua nota, Alcolumbre diz que tomou conhecimento "com respeito institucional" da manifestação "do indicado ao Supremo Tribunal Federal".
"O Senado Federal cumprirá, com absoluta normalidade, a prerrogativa que lhe confere a Constituição: conduzir a sabatina, analisar e deliberar sobre a indicação feita pelo presidente da República", declarou Alcolumbre.
Victoria Azevedo e Caio Spechoto (Folhapress)