Por: Da Redação

STF condena "kids pretos" por tentativa de golpe

Pela primeira vez, Moraes e demais ministros absolveram um dos réus | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou, por unanimidade, nesta terça-feira (18) nove réus do chamado núcleo operacional da trama golpista, que envolve militares acusados de atuar na tentativa de golpe de Estado no fim de 2022, no governo Jair Bolsonaro (PL).
Todos os ministros do colegiado se manifestaram nesse sentido: Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Cármen Lúcia e o presidente da Primeira Turma, Flávio Dino.

Eles defenderam, porém, que dois deles respondam apenas por crimes mais leves, de incitação à animosidade contra as Forças Armadas e associação criminosa. Além disso, manifestaram-se pela absolvição do general da reserva Estevam Theophilo por falta de provas.

É a primeira vez que Moraes, relator do processo, se posiciona pela absolvição de um réu da trama golpista, assim como Zanin e Cármen.

Braço operacional

A Primeira Turma do STF retomou nesta sessão o julgamento dos militares acusados de atuar como o braço operacional da tentativa de golpe. Esse núcleo é composto por nove militares e um policial federal. A maior parte dos denunciados pela PGR (Procuradoria-Geral da República) é composta por oficiais do Exército com formação em forças especiais, os chamados "kids pretos".

Primeiro a votar, Moraes se manifestou para condenar por cinco crimes Bernardo Romão Correa Neto (coronel da reserva), Fabrício Moreira de Bastos (coronel), Hélio Ferreira Lima (tenente-coronel), Rafael Martins de Oliveira (tenente-coronel), Rodrigo Bezerra de Azevedo (tenente-coronel), Sérgio Ricardo Cavaliere (tenente-coronel da reserva) e Wladimir Matos Soares (policial federal).

Eles são acusados de organização criminosa armada, tentativa de abolição do Estado democrático de Direito, golpe de Estado, deterioração do patrimônio público e dano ao patrimônio tombado. Já os que, para Moraes, podem responder por penas mais leves são Márcio Nunes de Resende Júnior (coronel da reserva) e Ronald Ferreira de Araújo Júnior (tenente-coronel).

Rodrigo Bezerra e Wladimir Soares acompanharam parte da sessão do plenário da corte. O tenente-coronel, no entanto, foi embora pouco depois do voto de Zanin pela condenação dele.

A PGR já havia entendido que Ronald não participou de reuniões golpistas, mas somente espalhou informações falsas sobre fraudes no processo eleitoral para incitar as Forças Armadas à ruptura democrática.

Theophilo

No caso de Theophilo, Moraes entendeu que, "em que pesem fortes indícios da participação do réu [na trama golpista]", não é possível condená-lo a partir das provas produzidas em juízo.

A principal delas é uma reunião que Theophilo teve com Bolsonaro em 2022, na qual ambos afirmam que não houve apresentação da minuta do golpe ou discussão nesse sentido. Ela seria, segundo eles, apenas para o então presidente "desopilar" suas insatisfações com o processo eleitoral.

Theophilo, que à época estava no Alto Comando do Exército, foi acusado de dar aval aos planos golpistas na reunião com Bolsonaro, o que ele nega.

Cooptação

Ao ler o seu voto, Moraes afirmou que os militares tentaram cooptar o Alto Comando do Exército para aderir ao plano de manter Bolsonaro no poder após a derrota para Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições de 2022.

Segundo o ministro, isso ocorreu na reunião dos militares com formação em Operações Especiais, os "kids pretos", no fim de novembro de 2022. Na ocasião, eles aproveitaram que o Alto Comando do Exército estava reunido em Brasília para juntar os assistentes dos generais em uma confraternização.

"De início havia a ideia da cooptação das três armas, mas o comandante da Marinha já demonstrava que havia aderido a essa possibilidade, então se centrou na cooptação do Alto Comando do Exército, e principalmente do comandante-geral do Exército, o general Freire Gomes", disse Moraes, na leitura do seu voto.

O ex-chefe da Marinha, almirante Almir Garnier, foi condenado a 24 anos de prisão no julgamento do núcleo central da tentativa de golpe.

"A ideia era pegar aqueles que tinham muita proximidade [com o Alto Comando]", disse o ministro sobre a reunião. "Vários núcleos repetiram em sustentações orais e memoriais que 'os subordinados nas Forças Armadas não exercem influência em relação aos seus comandantes'. Não é verdade", completou.

"Eles não exercem poder em relação aos seus comandantes, mas aquele que está trabalhando diariamente e aquele que exerce a função de chefe de gabinete ou de segundo no comando dá as suas opiniões. Aqui, claramente, eles queriam pressionar os seus generais, os seus comandantes, para que eles pressionassem o comandante do Exército, general Freire Gomes", acrescentou.

Copa 2022

Moraes também votou pela condenação de uma parte dos militares pela participação no grupo clandestino chamado "Copa 2022". Segundo a PGR, os dois militares, sob codinomes, estavam a postos para neutralizar o ministro do Supremo, mas acabaram abortando a operação, sem o aval do Comando do Exército.

Depois de Moraes, votou Zanin, que seguiu integralmente o entendimento de Moraes. Na sequência, Cármen rebateu um dos argumentos das defesas de que integrantes das Forças Armadas de hierarquia inferior não possam tentar influenciar superiores.

"Não há que se falar que pessoas de hierarquia inferior não possam atuar para pressionar superiores. Não há possibilidade de ser aceitável de que, por se cuidarem de documentos e mensagens de coronéis e tenentes coronéis, que não se influenciaria alguém. A influência vem de quem tem influência, não determinado cargo", disse.

José Marques e Ana Pompeu (Folhapress)