A Polícia Federal (PF) prendeu na manhã desta quinta-feira o ex-presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Alessandro Stefanutto. A prisão ocorre em nova fase da Operação sem Desconto, feita em conjunto com a Controladoria-Geral da União (CGU).
Quando surgiram as primeiras informações a respeito da existência de fraude na Previdência envolvendo descontos ilegais de aposentados por instituições ligadas a sindicatos, Stefanutto foi exonerado. Como consequência da situação, também acabou deixando o cargo o ex-ministro da Previdência Carlos Lupi, substituído por Wolney Queiroz.
De acordo com informações a partir da operação da manhã de quinta, a Polícia Federal apontou que Stefanutto recebia do esquema de descontos ilegais de aposentadorias R$ 250 mil mensais, quando comandava o órgão.
Facilitador
Segundo a decisão sigilosa do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), André Mendonça, relator na Corte do caso e que determinou a prisão, há indícios de que Stefanutto exerceu papel de facilitador institucional do grupo criminoso dentro do INSS, primeiro como procurador-chefe, depois, como presidente do órgão.
"Ele utilizou sua influência na alta administração pública para garantir a continuidade da fraude em massa, que gerou R$ 708 milhões em receita ilícita, confirmando sua posição como uma das principais engrenagens da organização criminosa", disse a PF.
Segundo as investigações, o pagamento de valores indevidos aos altos gestores do INSS era necessário porque, sem o apoio deles, seria impossível continuar com uma fraude de tamanha magnitude, que envolvia mais de 600 mil vítimas e gerava milhares de reclamações judiciais e administrativas. “Em síntese, sua conduta viabilizou juridicamente o esquema fraudulento, conferindo aparência de legalidade a operações ilícitas, mediante o uso da posição pública de destaque que ocupava no INSS", diz a decisão.
Desses repasses, segundo a polícia, quase a totalidade dos valores foram pagos entre junho de 2023 e setembro de 2024 (à exceção de um pagamento de R$ 250 mil realizado em outubro de 2022).
As investigações da PF também apontaram que Stefanutto avaliava e aprovava a manutenção dos convênios entre o INSS e a Confederação Nacional dos Agricultores Familiares (Conafer), mesmo após alertas técnicos sobre inconsistências nas listas de filiados e indícios de falsificação de autorizações de desconto.
Além disso, autorizava o processamento de cadastros de filiação encaminhados pela Conafer sem observância dos critérios legais e sem checagem da manifestação de vontade dos beneficiários.
Ainda de acordo com as investigações, Stefanutto recebia pagamentos mensais provenientes de empresas vinculadas ao operador financeiro Cícero Marcelino de Souza Santos, disfarçados como honorários de consultoria ou assessoria técnica e utilizava influência institucional para manter a execução dos atos criminosos.
Stefanutto foi preso nesta quinta-feira (13), na nova fase da Operação Sem Desconto, que apura um esquema nacional de descontos associativos não autorizados em aposentadorias e pensões, em conjunto com a CGU (Controladoria-Geral da União).
Procurada, a defesa de Stefanutto afirmou que não teve acesso ao teor da decisão que decretou a prisão dele e que trata-se de uma detenção "completamente ilegal, uma vez que Stefanutto não tem causado nenhum tipo de embaraço à apuração, colaborando desde o início com o trabalho de investigação".
A defesa também disse que irá buscar as informações que fundamentaram a decisão para tomar as providências necessárias e que segue confiante, diante dos fatos, de que comprovará a inocência dele ao final dos procedimentos relacionados ao caso.
Um integrante da comissão pediu sua prisão em flagrante por desacato, mas o presidente, senador Carlos Viana (Podemos-MG), barrou a manobra, alegando que "Não cabe prisão em flagrante por desacato".
Ahmed
Stefenatutto, porém, não foi o único alvo da operação desta quinta-feira. Houve buscas e apreensões envolvendo Ahmed Mohamad Oliveira, que foi presidente do INSS e ministro do Trabalho e da Previdência no governo Jair Bolsonaro. Por motivos de conversão religiosa, Ahmed Mohamad Oliveira é o novo nome de José Carlos Oliveira. Também foi alvo da operação o deputado federal Euclydes Pettersen (Republicanos-MG).
Mensagens interceptadas pela Polícia Federal mostram "fortes indícios" de que o esquema criminoso de descontos em aposentadorias, envolvendo José Carlos Oliveira, ex-presidente do INSS, estava "em pleno funcionamento" no período em que ele era ministro do Trabalho e Previdência de Jair Bolsonaro.
De acordo com o documento obtido pelo jornal Folha de S. Paulo, Oliveira foi estratégico para o esquema, "haja vista que sua atuação foi decisiva para o funcionamento e blindagem da fraude da Conafer".
Segundo a decisão sigilosa do ministro André Mendonça, Oliveira ocupou os mais altos cargos da administração pública em matéria previdenciária no Brasil, "o que permitiu à organização criminosa manter e expandir o esquema de descontos indevidos em benefícios de aposentados e pensionistas".
A defesa de Oliveira foi procurada, mas não respondeu até a publicação desta reportagem.
Dentre as principais condutas ilícitas atribuídas a Oliveira pela polícia está o recebimento de propinas de empresas de fachada operadas pelo empresário Cícero Marcelino de Souza Santos, apontado como o operador financeiro do grupo.
Os pagamentos, segundo a PF, eram feitos por meio de pessoas interpostas e registradas em planilhas de prestação de contas apreendidas pelo órgão.
A investigação também aponta haver mensagens de WhatsApp de agradecimento de Oliveira a Cícero após receber valores indevidos. Uma planilha de fevereiro de 2023 registrou o pagamento de R$ 100 mil a "São Paulo Yasser", e a polícia recordou que Oliveira alterou seu nome, e tinha como apelido "Yasser" e "São Paulo", "reforçando o vínculo entre ele e os repasses".
Ainda quando era diretor de benefícios do INSS, em julho de 2021, Oliveira autorizou o desbloqueio e repasse de R$ 15,3 milhões à Conafer, mesmo sem a comprovação das filiações exigidas pelo ACT (Acordo de Cooperação Técnica), segundo a PF.
De acordo com a polícia, essa liberação foi feita em desacordo com o regulamento interno e sem exigir documentos comprobatórios, o que possibilitou que a confederação retomasse e ampliasse a fraude de descontos em massa em 30 listas fraudulentas, que incluíram descontos em mais de 650 mil benefícios previdenciários.
Oliveira foi alvo de buscas e uma decisão para que use tornozeleira eletrônica, em decisão do STF desta quinta-feira (13).
Com informações de Constança Rezende (Folhapress)