Em meio às expectativas da reunião entre o presidente dos Estados Unidos da América (EUA), Donald Trump (Republicano), e o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva (PT), cresce a tensão em países vizinhos do Brasil na América do Sul. Nesta quinta-feira (23), o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, acusou os Estados Unidos de cometerem “execuções extrajudiciais” nos bombardeios a embarcações no Caribe e no Pacífico.
Desde o dia 2 de setembro, os EUA vêm atacando embarcações nos mares do Caribe e do Pacífico sob a justificativa de que as embarcações transportavam drogas e fortaleciam o narcotráfico. Parte desses ataques ocorre em região colombiana, mas a maioria dos ataques ocorreu próximo da Venezuela. Segundo o governo dos EUA, foram realizados nove ataques, que deixaram 37 mortos.
Ainda nesta quinta-feira, em conversa com jornalistas na Casa Branca, Donald Trump informou que o governo dos EUA “muito em breve” realizará “operações terrestres” em cartéis latino-americanos.
O assunto ainda será discutido com o Congresso estadunidense. Apesar de não ter citado diretamente a Venezuela, Trump já acusou anteriormente o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, de liderar um cartel de organização narcoterrorista – além de chamar Petro de traficante e de falhar no combate ao narcotráfico colombiano. Ambos os presidentes responderam criticando Trump.
Brasil
Devido à proximidade do Brasil com a Colômbia e a Venezuela, a situação soma tensão ao encontro que Trump e Lula terão neste domingo (26). O Brasil preocupa-se com a possibilidade conflitos armados em países que estão na sua fronteira.
Para o Correio da Manhã, o mestre em Relações Internacionais pelas Universidades de Groningen (Países Baixos) e Estrasburgo (França) Uriã Fancelli avalia que os riscos imediatos de invasões militares ou ataques a áreas brasileiras são baixos. “A doutrina brasileira rejeita historicamente qualquer operação estrangeira em seu território ou águas, e a prioridade de Trump é o Caribe e a rota para os Estados Unidos, não o Atlântico Sul”, explicou Fancelli.
“Mesmo que no futuro os Estados Unidos decidam ampliar operações para pontos fora da Venezuela, ou haja algum incidente isolado perto do litoral brasileiro, isso dependeria de uma mudança de cenário político. Hoje, com uma reaproximação diplomática entre Brasília e Washington e não uma deterioração como a vista com a Colômbia, a probabilidade de mísseis ou bombardeios americanos no Brasil é improvável”, completou o analista de Relações Internacionais.
Por outro lado, a advogada especialista em direito internacional Hanna Gomes avalia que “a escalada das tensões entre Donald Trump e países sul-americanos representa um risco geopolítico para o Brasil”. Para a reportagem, ela explicou que eventuais problemas seriam indiretos.
“O Brasil, como maior potência da América do Sul e vizinho direto da Venezuela e da Colômbia, está inevitavelmente no centro da crise, no sentido de ter o papel de mediador, promovendo o diálogo e a não intervenção. Isso, ao mesmo tempo em que lida com a pressão da própria agenda com os EUA. O risco imediato para o Brasil é o rompimento das tratativas que foram abertas sobre o tarifaço e as restrições às autoridades brasileiras”, afirmou Gomes ao Correio da Manhã.
Proximidade
A advogada ainda citou que, devido à proximidade geográfica do Brasil com os países, especialmente a Venezuela, “qualquer escalada militar ou aumento das sanções” internas poderiam intensificar “o fluxo de refugiados venezuelanos para o Brasil, especialmente por Roraima”, o que pode levar a uma sobrecarga em serviços públicos, saúde e segurança na região Norte. “O aumento da instabilidade e a atuação de grupos armados não estatais (ligados ao narcotráfico e mineração ilegal) nessas regiões de fronteira podem ter um efeito de transbordo da criminalidade, intensificando o contrabando, o crime organizado e a invasão de terras indígenas no Brasil”, completou Hanna.
A reportagem ainda conversou com o cientista político Márcio Coimbra o qual avaliou que a rota de menor risco e maior benefício para o Brasil “é um alinhamento estratégico claro com os EUA”. Dentre as medidas para esse alinhamento, Coimbra cita “aprofundar a troca de inteligência e operações conjuntas na tríplice fronteira com a Colômbia e a Venezuela para combater o crime organizado”. Ele ainda considera “acelerar as negociações para um acordo comercial que ancore o Brasil na órbita econômica norte-americana, diversificando a sua economia e reduzindo a dependência de mercados voláteis”.
Porém, ele ponderou que, caos o Brasil se “alinhe publicamente e de forma incondicional às políticas dos EUA, poderá enfrentar resistência de outros países sul-americanos com governos de esquerda (como Bolívia e Chile) e aprofundar fracturas em blocos regionais como o Celac e o Mercosul”.