Após o Congresso Nacional deixar a Medida Provisória (MP) nº 1303/2025 “caducar”, a equipe econômica do governo federal precisa se reorganizar para tentar compensar o rombo de R$ 35 bilhões que a derrubada da MP ocasiona. A medida foi protocolada pelo governo como uma alternativa à derrubada do aumento da taxa do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e criava novas regras para a tributação de aplicações financeiras e ativos virtuais no Brasil, salvo exceções de letras de crédito vinculadas ao agronegócio e apostas Bets. A equipe econômica do governo prevê um prejuízo de R$ 35 bilhões para 2026, o que impede o cumprimento da meta fiscal.
Após a derrota do governo no Congresso, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse em entrevista coletiva à imprensa nesta quinta-feira (9) que a pasta apresentará alternativas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para garantir o equilíbrio das contas públicas. “Vamos atuar na medida das nossas competências constitucionais para fazer valer a orientação que o presidente Lula deu desde o primeiro dia de mandato, ele não vai abrir mão do fiscal e não vai abrir mão do social”, disse Haddad.
O ministro ainda reiterou que as alternativas, que não foram citadas, serão avaliadas “com muito cuidado” e que ele ainda conversará com o relator do Orçamento de 2026, deputado federal Isnaldo Bulhões Jr. (MDB-AL).
Compensação
Ao Correio da Manhã, o advogado e sócio do escritório Meirelles Costa Advogados Morvan Meirelles Costa Junior citou que, dentre as alternativas que podem ser adotadas pelo governo para compensar a perda arrecadatória, “o governo pode focar na análise e possível redução de isenções e benefícios fiscais concedidos a diferentes setores da economia”.
“A própria MP 1.303/2025 já sinalizava essa direção ao propor a tributação de títulos antes isentos (LCI, LCA etc.). É interessante notar que, nesse particular, há projeto de lei complementar já em trâmite na Câmara (PLP 182/2025), que trata justamente da redução linear de incentivos fiscais federais, inclusive em relação ao lucro presumido. Ou seja, o governo pode ser incentivado a focar nesse projeto. Entretanto, a provável longevidade dessa tramitação, bem como o curto espaço de tempo, podem ser inviabilizadores dessa estratégia legislativa”, afirmou Junior.
Ele ainda citou que outra alternativa a longo prazo é “o investimento em contenção de gastos”, com a implementação de medidas de corte de despesas.
A reportagem ainda conversou com o sócio da área tributária do escritório Silveira Advogados Caio Ruotolo, que ainda citou como alternativa a judicialização da desoneração da folha de pagamento.
“O ministro Cristiano Zanin, do STF [Supremo Tribunal Federal], pautou para julgamento a partir de 17/10 a ADI [Ação Direta de Inconstitucionalidade] 7633 da AGU [Advocacia-Geral da União] que questiona a prorrogação da desoneração da folha aprovada pelo Congresso. Se o STF considerar essa prorrogação inconstitucional, o governo pode recuperar cerca de R$ 20,23 bilhões em renúncia fiscal”, detalhou Ruotolo.
“A meta fiscal para 2026 exige deficit zero, o que já era desafiador mesmo com a MP que caducou. A recuperação de até R$ 20 bilhões via STF ajudaria, mas ainda deixaria um rombo de R$ 15 bilhões. Ou seja: Não são suficientes sozinhas, mas podem compor um pacote maior de medidas”, ponderou o advogado sócio da área tributária.
Emendas
Dentre as alternativas para compensar a falta da MP, o poder Executivo cogita cortar parte das emendas parlamentares. De acordo com o líder do governo no Congresso Nacional, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), pode ser realizada uma contingência de R$ 7 bilhões a R$ 10 bilhões de emendas parlamentares.
Questionada pela reportagem, a cientista política e especialista em Legislativo da BMJ Consultores Associados Letícia Mendes avalia a medida como “arriscada”, considerando o atual tensionamento entre o governo e o Congresso. “Caso o governo tome essa decisão de realmente cortar essas emendas sob a justificativa de que não tem orçamento, é um caminho bem arriscado, tendo em vista que ainda há projetos prioritários para o governo avançar até o final do ano. E com isso, caso não tenha esse apoio robusto de parlamentares, ou ao menos um apoio direcionado”, avaliou Mendes.
“A gente sabe que 2026 já começou e a interação de apoios e de interações para o próximo ano estão super robustas. E por conta disso, inclusive, um dos motivos para a medida provisora não ter prosperado foi esse jogo político em relação aos apoios do próximo ano”, completou a cientista política.