Após a detenção da deputada federal Luizianne Lins (PT-CE) e outros ativistas brasileiros no presídio de Ketziot, em Israel, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) segue atuando para assegurar o respeito aos direitos dos cidadãos brasileiros e, principalmente, sua liberação imediata. Os ativistas faziam parte de uma flotilha — um pequeno grupo de embarcações — que estava levando ajuda humanitária à Faixa de Gaza.
Ao Correio da Manhã, fontes do Itamaraty informaram que uma equipe da embaixada brasileira em Tel Aviv foi deslocada até o presídio. A visita, que durou mais de oito horas, constatou que todos os detidos se encontram em "bom estado de saúde". Os 13 brasileiros foram examinados separadamente: cinco mulheres e oito homens.
Durante a visita, as autoridades israelenses comunicaram que foi oferecida aos detidos a opção de assinar um documento que, supostamente, facilitaria o processo de retorno ao Brasil. Até o momento, cinco deles já manifestaram disposição para assinar. Aqueles que se recusarem, no entanto, serão submetidos a um processo judicial de deportação.
Tensão diplomática
Para a advogada especializada em direito internacional Hanna Gomes, o cenário é marcado por grande complexidade e tensão diplomática. Ela explica que a proposta de deportação feita por Israel cria um dilema legal e político tanto para os detidos quanto para o Brasil. “Isso porque, quem assinar o documento estaria, na prática, reconhecendo alguma ilegalidade em suas ações ou na sua permanência, facilitando um processo administrativo de deportação e um rápido retorno ao Brasil”, iniciou.
“E quem se recusar, como forma de protesto contra a ilegalidade da prisão em águas internacionais, será submetido a um processo judicial de deportação em Israel”, afirmou Gomes à reportagem. Ela esclarece que esse processo tende a ser mais demorado e pode envolver disputas sobre a legalidade da detenção e das acusações. Além disso, no caso específico da deputada, suas prerrogativas parlamentares “adicionam uma camada de complexidade política e diplomática ao caso”.
Repúdio
Na quinta-feira (2), deputados brasileiros se reuniram com o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, para discutir a situação da colega e dos demais detidos. Durante a votação da ampliação do Imposto de Renda (IR) na quarta-feira (1º), o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), já havia solicitado o apoio do Itamaraty.
Após as reuniões, o governo brasileiro condenou, "nos mais fortes termos", a "interceptação ilegal e a detenção arbitrária dos ativistas por Israel". A nota oficial ressaltou que a flotilha tinha caráter estritamente humanitário e que a ação das forças israelenses ao interceptá-la constitui uma grave violação do direito internacional, especialmente no que tange ao direito marítimo, conforme estabelecido pela Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), que assegura a liberdade de navegação. O Brasil também enfatizou as obrigações legais de Israel sob a Convenção de Viena sobre Relações Consulares (1963) e reafirmou sua posição de que Israel deve ser responsabilizado por qualquer ato ilegal ou violento cometido contra os ativistas.
“Operações de caráter estritamente humanitário devem ser autorizadas e facilitadas por todas as partes em conflito, não podendo ser arbitrariamente obstadas ou consideradas ilícitas. O Brasil conclama a comunidade internacional a exigir de Israel a cessação do bloqueio à Gaza, por constituir grave violação ao direito internacional humanitário”, diz o trecho.
Hanna Gomes também destacou o contexto de alta tensão nas relações diplomáticas entre Brasil e Israel. "Esse é um cenário de fricção, agravado por declarações anteriores sobre o conflito na Faixa de Gaza", afirmou. A advogada se refere à posição do Brasil durante a última Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), onde o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criticou duramente a situação em Gaza, chamando-a de "genocídio" e lamentando o uso da fome como arma de guerra. Além disso, durante o discurso do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu (Likud), na mesma Assembleia, que afirmou que a operação militar contra o Hamas seguiria até que Israel "concluísse o trabalho", dezenas de delegações, incluindo a do Brasil, se retiraram em protesto antes mesmo do início da fala.