Por: Karoline Cavalcante

Parecer de Gonet evita novas tensões às vésperas do julgamento

Gonet: prudência para julgamento não virar show midiático | Foto: Victor Piemonte/STF

Ao se posicionar contra a proposta da Polícia Federal (PF) de intensificar a segurança na residência onde o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) cumpre prisão domiciliar, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, evita também a armadilha da espetacularização.

Na avaliação do advogado criminalista Guilherme Augusto Mota, em entrevista ao Correio da Manhã, colocar agentes 24 horas dentro da casa de Bolsonaro “alimentaria uma narrativa de perseguição política e transformaria a custódia domiciliar em palco midiático”.

Para Augusto Mota, levando em consideração a véspera do julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a Ação Penal nº 2668 — que trata da tentativa de golpe de Estado após a eleição de 2022 e possui grande repercussão —, “a contenção jurídica é, em si, um ato político de prudência”.

Resguardo da intimidade

“Gonet resgata um princípio essencial: o domicílio, mesmo em contexto de prisão, continua sendo espaço de resguardo da intimidade. Ao preservar essa linha, o parecer contribui para diferenciar segurança jurídica de encenação punitiva, lembrando que o processo penal não pode se converter em espetáculo”, iniciou o advogado. “O desafio é garantir a efetividade da norma processual penal sem que a Justiça se torne refém da dramaturgia política que todo esse enredo carrega", completou ele.

Na decisão da PGR, enviada ao STF na última sexta-feira (29), Gonet argumentou que não há elementos que justifiquem a presença constante de agentes dentro da residência e que a situação atual de Bolsonaro — monitorado por tornozeleira eletrônica — não exige medidas mais severas, como sugeriu a PF, ao apontar risco de fuga do ex-presidente.

Risco de fuga

Gonet reconheceu a existência de um "risco concreto de fuga", especialmente em virtude das movimentações do deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que tem atuado nos Estados Unidos para questionar a atuação do Judiciário brasileiro. Contudo, o procurador-geral defendeu que o monitoramento atual é suficiente e que, caso necessário, os reforços se restringiriam à área externa da residência.

“Não se aponta uma situação crítica de segurança no interior da casa”, afirmou o procurador-geral. Segundo ele, a preocupação da PF está concentrada nas áreas descobertas da propriedade, como o quintal e o entorno do imóvel, que fica em um condomínio fechado.

Como alternativa, Gonet propôs a instalação de câmeras externas com transmissão ao vivo, mas sem gravações, para garantir o acompanhamento em tempo real, sem invadir a privacidade do investigado. Ele também sugeriu que agentes da PF tenham acesso livre ao entorno da casa, caso haja qualquer indício de movimentação suspeita, mas sem a necessidade de manter agentes fisicamente presentes de forma constante.

O procurador ainda mencionou preocupações levantadas pela PF sobre uma possível tentativa de Bolsonaro de buscar asilo político na Argentina. A investigação citou até a elaboração de uma minuta de pedido ao presidente argentino, Javier Milei (Liberdade Avança). A proximidade do ex-presidente com líderes internacionais, como nas visitas à embaixada da Hungria, foi apontada como um fator que poderia facilitar uma eventual evasão. Agora, a decisão final sobre as medidas caberá ao ministro Alexandre de Moraes — relator da AP 2668 —, que ainda não se manifestou.

Julgamento

A Primeira Turma do STF passará a julgar o "núcleo crucial" da trama golpista nesta terça-feira (2). O grupo estratégico inclui militares, políticos e ex-ministros que, segundo a acusação, atuaram para inviabilizar o resultado das eleições de 2022 e manter Bolsonaro no poder de forma ilegítima.

Além do ex-presidente, também respondem à ação penal o deputado federal e ex-diretor da Abin Alexandre Ramagem (PL-RJ); o ex-comandante da Marinha almirante Almir Garnier Santos; o ex-ministro da Justiça Anderson Torres; o ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general da reserva Augusto Heleno; o ex-ministro da Defesa general da reserva Paulo Sérgio Nogueira; o ex-ministro da Casa Civil general da reserva Walter Braga Netto; e o ex-ajudante de ordens da Presidência, tenente-coronel Mauro Cid, que firmou um acordo de colaboração premiada.

Segurança

A Suprema Corte possui um plano estruturado para situações que envolvem grandes eventos ou julgamentos de amplo interesse público. Além das equipes de policiais judiciais do STF, será montada uma força-tarefa composta por policiais judiciais do Distrito Federal e de outras localidades. Essas equipes de segurança trabalharão 24 horas por dia, sete dias por semana.

“O Tribunal mantém articulação permanente com a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal para definição conjunta das ações necessárias. A partir desse planejamento e da atualização constante das análises de risco, o STF adapta os meios e estratégias de atuação para garantir a segurança institucional e do público envolvido. Os controles de acesso serão rigorosos, incluindo varreduras prévias e utilização de equipamentos eletrônicos de detecção de metais”, explicou o STF à reportagem.