A tensão entre o Judiciário e lideranças conservadoras segue em alta, com manifestações sucessivas de parlamentares oposicionistas diante dos desdobramentos mais recentes. Nesta quinta-feira (21), foi a vez do senador Izalci Lucas (PL-DF), líder da oposição no Congresso, se pronunciar oficialmente. Em nota, o parlamentar denunciou o que classificou como uma “escalada de medidas que visam silenciar vozes legítimas da sociedade brasileira”, em reação às investigações que envolvem o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o pastor Silas Malafaia.
“O direito de manifestação pacífica, de reunião e de crítica a autoridades não é concessão do Estado: é garantia permanente da nossa Constituição”, afirmou Izalci. Para o senador, indiciamentos seletivos e conduções coercitivas desnecessárias enfraquecem a democracia e revelam a fragilidade do sistema político atual.
Na rede social X (antigo Twitter), o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) também criticou. “Vaza uns áudios do Lula e Moraes aí pra gente ver uma coisa, rapidão…”, afirmou Ferreira.
Indiciamento
As declarações foram feitas um dia após a Polícia Federal indiciar Jair e Eduardo Bolsonaro por tentativa de obstrução de justiça, por supostamente interferirem na Ação Penal nº 2668 — que apura uma possível tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022 e tramita no Supremo Tribunal Federal (STF). No despacho mais recente, o relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, determinou que a defesa do ex-presidente preste esclarecimentos, em 48 horas, sobre o descumprimento de medidas cautelares, a reiteração de condutas ilícitas e o risco de fuga.
O mesmo inquérito embasou a operação que teve como alvo o pastor Silas Malafaia, com busca pessoal e imposição de medidas cautelares — entre elas, a proibição de deixar o país e de manter contato com outros investigados. De acordo com o procurador-geral da República, Paulo Gonet, a investigação reúne diversos diálogos e publicações “sugestivos da atuação ilícita” de Malafaia, “que aparece como orientador e auxiliar das ações de coação e obstrução promovidas pelos investigados”.
Crise interna
A crise, no entanto, ultrapassa o campo institucional e se estende ao ambiente interno do próprio bolsonarismo. A partir da perícia no celular de Jair Bolsonaro — atualmente em prisão domiciliar por descumprimento de cautelares —, a PF encontrou evidências de atrito entre lideranças do campo conservador. Um dos áudios resgatados mostra o pastor Silas Malafaia chamando Eduardo Bolsonaro de “idiota” e ameaçando “arrebentá-lo” publicamente. O conteúdo revela uma divisão quanto à estratégia política adotada por aliados do ex-presidente, especialmente no cenário internacional.
“Dando discurso nacionalista que eu sei que você não é a favor disso. Dei-lhe um esporro, cara… mandei um áudio a ele de arrombar. E disse para ele: a próxima que tu fizer, eu faço um vídeo e te arrebento”, disse Malafaia a Bolsonaro, no áudio divulgado pela PF.
Em resposta ao vazamento, Eduardo gravou um vídeo tentando minimizar o episódio. Afirmou que os áudios fazem parte de uma suposta “fishing expedition” contra seu pai — termo jurídico, que pode ser traduzido para pescaria, usado para se referir a investigações genéricas em busca de qualquer elemento incriminador — e classificou a divulgação como “cortina de fumaça”.
“Pastor Silas, tamo junto. O senhor está sofrendo os últimos atos desse regime”, afirmou Eduardo, em um gesto público de reconciliação, sem comentar diretamente os ataques. Em outro momento, o deputado lamentou que alguns aliados “ainda acreditem que os EUA funcionem como o Brasil”, numa referência às sanções internacionais que têm envolvido autoridades brasileiras.
Sanções
Eduardo, que se licenciou do mandato em março e passou a viver nos Estados Unidos, tem atuado diretamente em favor da aplicação de penalidades a autoridades brasileiras, alegando violações de direitos humanos.
Desde sua mudança para o país, o presidente norte-americano Donald Trump (Republicano) anunciou uma tarifa de 50% sobre diversos produtos brasileiros, além da aplicação da Lei Magnitsky — criada para punir violações graves de direitos humanos e casos relevantes de corrupção — contra o ministro Alexandre de Moraes, sob a alegação de que o magistrado promoveu “prisões arbitrárias” e a “supressão da liberdade de expressão”. A inclusão na lista implica sanções como o cancelamento de vistos, proibição de entrada nos Estados Unidos e bloqueio de transações com empresas e instituições financeiras sediadas no país.
Segundo a Polícia Federal, Malafaia teria atuado de forma articulada com Jair Bolsonaro para obstruir investigações relacionadas à tentativa de golpe. Eduardo, por sua vez, é investigado por supostamente atuar nos Estados Unidos para pressionar autoridades americanas a adotar sanções contra ministros do Supremo e outras instituições brasileiras.
Movimentações
A operação que apreendeu o celular do ex-presidente revelou movimentações financeiras que, segundo a PF, somam mais de R$ 30 milhões entre março de 2023 e fevereiro de 2024, com destaque para transferências via Pix. O relatório aponta indícios de lavagem de dinheiro e também levanta suspeitas de que Eduardo Bolsonaro possa ter movimentado recursos por meio de contas de terceiros, incluindo a da própria esposa.