Por: Karoline Cavalcante

Refém de sanções dos EUA, Moraes afirma que não haverá recuo

Moraes disse que julgamento segue devido processo legal | Foto: Fellipe Sampaio/STF

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes afirmou que não há qualquer possibilidade de recuo nas decisões envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados, no contexto do julgamento sobre a suposta tentativa de golpe de Estado. Em entrevista ao jornal norte-americano The Washington Post, publicada nesta segunda-feira (18), o magistrado classificou o processo como “legal e necessário”, diante do que chamou de uma “doença autoritária” que ameaça a democracia brasileira.

Segundo ele, "não existe a menor possibilidade de recuar nem um milímetro sequer" em relação à investigação. A primeira fase do julgamento, que envolve o núcleo central da suposta trama golpista, está marcada para começar no dia 2 de setembro, na Primeira Turma do STF.

Lei Magnitsky

A declaração ganhou ainda mais repercussão por abordar diretamente as sanções impostas a Moraes pelo governo do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (Republicano). O ministro foi incluído na lista da Lei Magnitsky — instrumento legal americano que prevê punições a estrangeiros acusados de violações de direitos humanos ou envolvimento em corrupção significativa —, o que resultou em restrições de viagem, bloqueio de bens e proibição de transações com empresas e cidadãos norte-americanos.

A Casa Branca justificou as sanções alegando perseguição política contra Bolsonaro — argumento que Moraes rebateu, classificando-o como resultado de “narrativas falsas” disseminadas por apoiadores do ex-presidente, incluindo o seu filho, o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que mantém interlocução com figuras do governo Trump.

"Essas falsas narrativas acabaram envenenando a relação [entre Brasil e EUA], falsas narrativas baseadas em desinformação espalhada por essas pessoas nas redes sociais. Então, o que precisamos fazer, e o que o Brasil tem feito, é esclarecer as coisas", afirmou o ministro.

“Xerife da democracia”

Na reportagem, The Washington Post traça um perfil detalhado do magistrado, chamando-o de “xerife da democracia” — expressão usada para descrever seu protagonismo em decisões judiciais de alto impacto. A publicação destaca que Moraes se consolidou como figura central na resistência institucional contra ataques à ordem democrática, ainda que suas ações sejam, por vezes, consideradas excessivas por críticos.

Com base em relatos de pessoas próximas, o jornal descreve Moraes como alguém inflexível, combativo e pouco propenso a concessões — traços que, segundo aliados, foram essenciais para conter o avanço de projetos autoritários no país. A reportagem também chama atenção para o poder concentrado nas mãos do ministro, que conduz diversos inquéritos ligados ao bolsonarismo, entre eles os que investigam tentativas de desacreditar o sistema eleitoral, disseminação de fake news e incitação ao golpe. Moraes também presidiu o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tendo papel decisivo na condução das eleições de 2022.

Durante a fala, o ministro traçou paralelos entre a atual conjuntura e períodos autoritários da história brasileira, e reconheceu que a cultura política dos Estados Unidos — onde nunca houve um golpe de Estado consumado — tem dificuldade em compreender a fragilidade institucional de países como o Brasil.

Diante das críticas de que concentra poder excessivo dentro do STF, Moraes ressaltou que todas as decisões tomadas no âmbito da Corte estão sujeitas à revisão dos demais ministros. Segundo ele, mais de 700 de suas decisões já foram avaliadas por outros membros do Supremo, sem que nenhuma tenha sido revertida.

Para encerrar, Moraes admitiu que as sanções e as críticas não são agradáveis, mas reafirmou seu compromisso com o papel institucional que exerce. “Não é prazeroso passar por isso. Mas é necessário. Enquanto houver necessidade, a investigação continuará”, concluiu.