Por: Karoline Cavalcante

Vetos de Lula a Licenciamento agradam ambientalistas

Vetos parciais para atender ambientalistas sem afrontar o Congresso | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Diante dos vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Projeto de Lei nº 2.159/2021, que institui a nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental, o gesto do Palácio do Planalto foi celebrado publicamente por ambientalistas, mas, nos bastidores, não gerou satisfação plena. O ato de não barrar o projeto em sua integralidade decepcionou parte do movimento ambiental. Ainda assim, críticas mais contundentes vêm sendo estrategicamente contidas — primeiro, por uma percepção de que a decisão do governo Lula representa, dentro do espectro político possível, o máximo que o Brasil pode alcançar em matéria ambiental. Depois, para preservar a imagem de força e autoridade da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

A movimentação do governo, embora sinalize alguma disposição de diálogo com a área ambiental, também evidencia os limites práticos impostos pela correlação de forças no Congresso Nacional e pela necessidade de avançar com obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e outras agendas de infraestrutura. Agora, o foco se volta ao Legislativo, que decidirá se mantém ou derruba os vetos presidenciais, enquanto o governo tenta costurar um novo texto por meio de medida provisória e projeto de lei com urgência constitucional.

Após análise técnica e jurídica, o Planalto barrou, na última sexta-feira (8), 63 dos 400 dispositivos do texto original aprovado pelo Congresso em 17 de julho. As alterações foram justificadas pelo governo como uma tentativa de preservar o equilíbrio entre agilidade nos processos, segurança jurídica e proteção ambiental. Para isso, o chefe do Executivo também editou uma medida provisória, que garante aplicação imediata da Licença Ambiental Especial (LAE), e anunciou o envio de um novo projeto de lei com urgência constitucional, prometendo ajustar pontos considerados críticos.

LAC

O veto à aplicação da Licença por Adesão e Compromisso (LAC) a empreendimentos de médio impacto, assim como à dispensa do Cadastro Ambiental Rural (CAR) para fins de licenciamento, teve como objetivo sinalizar compromisso ambiental. No entanto, foi evitado o veto total, que traria desgaste com a base aliada no Congresso e poderia travar iniciativas de infraestrutura prioritárias.

A LAC, por exemplo, segue válida apenas para empreendimentos de baixo impacto, como previa o modelo anterior. Mesmo assim, integrantes da base governista apontam que o Planalto não irá se empenhar para manter esse veto, já que há interesse direto em destravar obras estratégicas. A medida, portanto, teria mais valor simbólico do que prático. Outro ponto significativo foi a tentativa de permitir que estados e o Distrito Federal estabelecessem critérios próprios para o licenciamento ambiental. A avaliação interna é de que isso poderia abrir caminho para uma “guerra de flexibilizações” entre entes federativos, enfraquecendo os parâmetros nacionais.

Outros pontos

Nos bastidores, a Medida Provisória que institui a LAC também é vista como um aceno direto ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). A leitura é de que a MP atende interesses relacionados à exploração de petróleo na bacia da Foz do Amazonas. “Eu sinceramente acho que, com a MP, eles atenderam os maiores interesses do Davi Alcolumbre com a pesquisa de petróleo e eventual exploração na bacia da Foz do Amazonas. Além disso, é óbvio, que a entrega dos cargos nas agências reguladoras para a negociação dele também fortalece essa relação. Então creio que ele satisfeito, ajuda segurar uma sessão de vetos até o governo ter armas para negociar a manutenção de alguns”, afirmou uma fonte ligada à articulação política.

A decisão do governo também buscou preservar compromissos ambientais assumidos pelo país. Foram vetados dispositivos que enfraqueciam a proteção da Mata Atlântica, bioma que tem apenas 24% de sua vegetação original, e trechos que limitavam a consulta a povos indígenas apenas aos territórios já homologados. Lula também barrou a tentativa de tornar não vinculante o parecer técnico de órgãos gestores de Unidades de Conservação, além de manter a responsabilidade de bancos e instituições financeiras por danos causados por projetos que financiem — exigindo a apresentação do licenciamento ambiental como pré-requisito para liberação de crédito.

Apesar disso, o governo preservou aspectos considerados positivos da proposta aprovada pelo Legislativo, como a elevação de regras regulatórias ao nível legal e a definição de prazos máximos para análise de pedidos de licença — pontos vistos como avanços em termos de previsibilidade e segurança jurídica.

A ministra Marina Silva defendeu as medidas adotadas, reforçando que o processo de licenciamento continua sendo uma ferramenta essencial para que o Brasil cumpra suas metas climáticas. “O processo de licenciamento continua sendo uma ferramenta essencial para atingir nossas metas ambientais”, afirmou. Ela também destacou que os vetos estão alinhados aos compromissos assumidos pelo Brasil no Acordo de Paris, como a meta de desmatamento zero e a redução de emissões de gases de efeito estufa entre 59% e 67%.

Manutenção dos vetos

Para o cientista político e diretor-adjunto do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), Marcos Woortmann, a resposta do governo é de grande relevância, mas ainda depende de como se dará a recomposição do texto. “A sociedade civil acompanhará atentamente o processo, analisando tecnicamente cada ponto e atuando no Congresso Nacional para defender a manutenção dos vetos”, afirmou à reportagem. A expectativa é que a tramitação do novo projeto de lei, junto com a MP, seja usada pelo Executivo como moeda de negociação para evitar derrotas na votação dos vetos.

Em nota, a especialista de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil, Gabriela Nepomuceno, afirmou que a luta por um marco legal robusto para o licenciamento ambiental não se encerra com os vetos. “Convocamos o Congresso Nacional, nessa nova chance, a honrar sua responsabilidade, priorizar a proteção de vidas e ecossistemas no apoio aos vetos presidenciais e conduzir um debate qualificado centrado no interesse público sobre a Medida Provisória e o Projeto de Lei, acima de pressões setoriais”, declarou.