Por: Karoline Cavalcante

Entre o PL e o PT, Motta tenta se firmar em meio a crise no Congresso

Hugo Motta na retomada do plenário: punição para os excessos de parlamentares | Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados

Eleito com apoio do Partido dos Trabalhadores ao Partido Liberal — o que exigiu compromissos com agendas opostas —, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), tenta se equilibrar entre o rigor institucional e a necessidade de manter a base política que o elegeu, mas esse equilíbrio é frágil. É o que avalia o cientista político Elias Tavares, em entrevista ao Correio da Manhã. “Agora, fica claro que parte disso é impossível de entregar sem romper com algum lado”, explicou.

Na sexta-feira (9), Motta convocou uma reunião virtual com a Mesa Diretora da Casa para discutir a conduta de deputados federais durante os protestos ocorridos nos dias 5 e 6 de agosto. A intenção demonstrada foi a de querer punir aqueles que cometeram excessos durante os dois dias em que o plenário foi tomado pela oposição. Em nota, a assessoria da Presidência da Câmara informou que “a fim de permitir a devida apuração do ocorrido, decidiu-se pelo imediato encaminhamento de todas as denúncias à Corregedoria Parlamentar para análise”.

Os protestos, liderados por parlamentares da oposição, tomaram o Congresso Nacional em reação à decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). As manifestações incluíram obstrução de sessões e atos simbólicos, como o do senador Magno Malta (PL-ES), que se acorrentou à mesa do plenário.

Oposição

Como resposta, Hugo Motta encaminhou à Corregedoria pedidos de afastamento, por até seis meses, de 14 deputados da oposição envolvidos nos atos. São eles: Marcos Pollon (PL-MS), Zé Trovão (PL-SC), Júlia Zanatta (PL-SC), Marcel van Hattem (Novo-RS), Paulo Bilynskyj (PL-SP), Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), Nikolas Ferreira (PL-MG), Tenente-Coronel Zucco (PL-RS), Allan Garcês (PL-TO), Caroline de Toni (PL-SC), Marco Feliciano (PL-SP), Bia Kicis (PL-DF), Domingos Sávio (PL-MG) e Carlos Jordy (PL-RJ).

As representações foram apresentadas por PT, PSB e Psol, que alegam que os parlamentares “extrapolaram todos os limites constitucionais e regimentais do direito de obstrução parlamentar”. Segundo as siglas, “as ações deixaram de ser legítima oposição para se tornarem atos de força e coação institucional”.

Em resposta, parlamentares da direita acusaram o governo de tentar criminalizar a oposição. “É inadmissível que, por agir em defesa da liberdade e contra abusos, a oposição seja criminalizada. A simples remessa de uma denúncia à Corregedoria não é sanção alguma. Pelo contrário: é mais um motivo para a direita se manter unida e intensificar a luta contra as arbitrariedades de um Estado que já não é mais democrático”, disse nota do grupo.

Jara

Além dos citados, a deputada Camila Jara (PT-MS), da base governista, também foi alvo de denúncia, acusada de agredir o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) durante os tumultos. O líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante, apresentou representação contra Jara, alegando que ela teria “agredido covardemente” Ferreira pelas costas, provocando sua queda. “Violência não é argumento. Imunidade parlamentar não é salvo-conduto para agressão. Estamos vigilantes. E vamos até o fim”, declarou o líder em publicação na rede social X (antigo Twitter).

A assessoria da deputada nega a agressão e afirma que ela apenas reagiu ao empurra-empurra generalizado. “Ela agiu como qualquer mulher reagiria ao ser pressionada por um homem contra a multidão. Não houve soco ou qualquer outro ato de violência deliberada”.

As representações seguem agora para análise do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara, responsável por decidir sobre eventuais punições.

Eduardo Bolsonaro

O presidente da Câmara também comentou, em entrevista ao portal Metrópoles, a situação do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que está licenciado do mandato desde março e atualmente reside nos Estados Unidos, onde tem atuado em defesa de sanções contra autoridades brasileiras, sob o argumento de denunciar violações de direitos humanos, e em apoio ao pai, Jair Bolsonaro — réu no STF por suposta tentativa de golpe após as eleições de 2022.

Motta afirmou que não há previsão regimental para o exercício do mandato à distância. A licença do deputado já expirou, e ele vem acumulando faltas enquanto busca uma alternativa para não retornar ao Brasil — onde teme ser preso. Duas propostas surgiram entre aliados: uma sugere permitir a prorrogação da licença por uma única vez para tratar de assuntos particulares; a outra visa permitir o exercício remoto do mandato.

Por ora, o chefe da Casa Baixa afirma que respeita Eduardo, “apesar de não concordar com alguns movimentos que ele tem feito”, mas que não pretende alterar o regimento para beneficiá-lo. Segundo ele, o filho do ex-representante do Executivo fez uma "escolha política" ao deixar o país. "Não há previsibilidade para o exercício do mandato à distância pelo nosso regimento. Isso seria uma excepcionalidade, o que não se justifica para o momento”, disse.

“Teste de liderança”

Para Tavares, Motta reconhece a insatisfação de parte dos deputados, mas evita um confronto direto com o Judiciário. Já a defesa de punição aos envolvidos no motim mostra que ele quer preservar a autoridade da Casa, mesmo que isso signifique enfrentar aliados. “O problema não é só administrar a Câmara; é administrar as expectativas que você mesmo criou para ser eleito. Esse é o teste real da liderança dele daqui para frente”, finalizou o cientista político à reportagem.