Por: Karoline Cavalcante

STF forma maioria para responsabilizar redes

Para Dino, algumas situações devem ser monitoradas | Foto: Ton Molina/STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) consolidou, nesta quarta-feira (11), uma maioria favorável à responsabilização das plataformas digitais por conteúdos ilícitos compartilhados por seus usuários. Com o voto do ministro Gilmar Mendes, o placar atingiu seis votos favoráveis no julgamento que avalia a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), norma que estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil. A sessão foi encerrada por volta das 18h e deve ser retomada nesta quinta-feira (12).

Para o decano, o artigo 19 da legislação já não atende às demandas atuais. "Embora o artigo 19 tenha sido de inegável importância, hoje o dispositivo se mostra ultrapassado [...] Vivemos sob o véu da irresponsabilidade, por conta da forma como o Marco Civil trata a responsabilidade das plataformas", afirmou Mendes.

O ministro sugeriu, então, quatro modelos distintos para responsabilizar as empresas pela publicação de conteúdos ilícitos. No regime residual, a necessidade de uma ordem judicial para a remoção de conteúdos — incluindo os jornalísticos — permanece. Já no regime geral, ele propôs que as redes sociais possam ser responsabilizadas a partir da notificação extrajudicial — são as realizadas fora do âmbito do Judiciário. No modelo de presunção, as plataformas seriam consideradas cientes da ilicitude de conteúdos relacionados a anúncios ou impulsionamentos, devendo tomar providências imediatas; caso contrário, seriam responsabilizadas. O último regime, o especial, prevê medidas mais rigorosas contra redes sociais que não removerem de imediato conteúdos relacionados a crimes graves.

“Evita tiranias”

Durante o dia, também votou o ministro Cristiano Zanin, que considerou o artigo 19 "ineficaz para proteger os valores constitucionais", apontando que a norma está em desacordo com o contexto atual.

“Vejo uma proteção insuficiente. Não está em discussão aqui a liberdade de expressão — ela encontra limites no próprio texto constitucional. Na minha perspectiva, o artigo 19 não é adequado para proteger os valores constitucionais, é incompatível com a atual realidade do modelo de negócios de muitos provedores e fomenta a disseminação de danos e desinformação”. A partir disso, propôs que as plataformas sejam responsabilizadas de maneira progressiva, conforme o tipo de conteúdo publicado.

Ainda nesta quarta-feira, o ministro Flávio Dino apresentou o seu entendimento. Ele sugeriu uma proposta conciliatória que sintetiza aspectos já manifestados por seus colegas. Para ele, a liberdade de expressão deve caminhar acompanhada de responsabilidade, conforme preceitua a Constituição. “A responsabilidade não impede a liberdade. Responsabilidade evita a barbárie, evita tiranias”, destacou.

Dino sugeriu uma ampliação da responsabilização das plataformas, defendendo que elas possam ser punidas caso não removam conteúdos após notificação extrajudicial. Porém, manteve exceções para casos que envolvam crimes contra a honra, como calúnia, difamação e injúria, em que a retirada só deveria ocorrer mediante decisão judicial. Ele também propôs a criação de um rol específico de conteúdos que obrigariam as plataformas a monitorar, especialmente quando houver disseminação massiva, como em casos relacionados à exploração de crianças, incitação ao suicídio, terrorismo e ataques ao Estado Democrático de Direito.

Demais votos

Até o momento, os ministros Dias Toffoli e Luiz Fux também votaram contra a necessidade de ordem judicial prévia para a remoção de conteúdos ofensivos, apoiando a possibilidade de exclusão via notificação extrajudicial. O presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, adotou posição intermediária, considerando que a exigência judicial deve prevalecer em situações envolvendo crimes contra a honra, para garantir a proteção à liberdade de expressão.

O único voto contrário às propostas que ampliam a responsabilização foi do ministro André Mendonça, que defendeu de forma contundente “liberdade de expressão” e a constitucionalidade da regra atual do Marco Civil. Para ele, a norma não concede imunidade irrestrita às plataformas, mas sim estabelece limites, direcionando a responsabilidade àqueles que efetivamente praticam os atos ilegais — ou seja, as próprias pessoas que publicam os conteúdos. Ainda restam os votos dos ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Nunes Marques e Cármen Lúcia.