O ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), concluiu nesta quinta-feira (5) seu voto no julgamento sobre a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), norma que define princípios, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil. O julgamento está centrado na discussão sobre a responsabilidade civil das plataformas digitais por conteúdos ilícitos postados por seus usuários. Em sua manifestação, Mendonça abriu a divergência, considerando o trecho constitucional e reforçou a importância da liberdade de expressão como valor central na legislação.
Para ele, a norma não concede imunidade irrestrita às plataformas, mas sim estabelece limites, direcionando a responsabilidade àqueles que efetivamente praticam os atos ilegais — ou seja, as próprias pessoas que publicam os conteúdos. Embora tenha reconhecido a possibilidade de responsabilizar as plataformas em situações excepcionais, Mendonça defendeu que a situação só seria viável mediante uma decisão judicial, conforme já determina o artigo 19.
“Excetuados os casos expressamente autorizados em lei, as plataformas digitais não podem ser responsabilizadas pela ausência de remoção de conteúdo veiculado por terceiro, ainda que posteriormente qualificado como ofensivo pelo Poder Judiciário, aí incluídos os ilícitos relacionados à manifestação de opinião ou do pensamento”, afirmou Mendonça.
O ministro destacou que a regulação dos conteúdos ilegais deve ser competência do Congresso Nacional, e não da Suprema Corte. Na sua avaliação, a suspensão ou bloqueio automático de perfis, seja de forma definitiva ou temporária, configura uma "censura prévia", que só seria justificável em casos excepcionais, como quando as contas forem comprovadamente falsas ou voltadas à prática de atividades criminosas.
Julgamento
O julgamento foi interrompido em dezembro de 2024, após os ministros Dias Toffoli, Luiz Fux e o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, se posicionarem contra a exigência de ordem judicial para a retirada de conteúdos ofensivos. Na sessão de quarta-feira (4), o ministro André Mendonça, que havia solicitado vista para maior análise, entregou o início do voto divergente. A leitura foi finalizada na quinta-feira e a sessão suspensa em seguida, sem previsão para a retomada.
Essa análise faz parte do julgamento de dois recursos extraordinários. O primeiro, relatado por Dias Toffoli (RE 1037396), trata da constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que exige uma ordem judicial prévia e específica para que provedores de internet, websites e gestores de redes sociais sejam responsabilizados por danos causados por atos ilícitos de terceiros. Em seu parecer, Toffoli argumentou que a norma concede imunidade excessiva às plataformas, permitindo a propagação de conteúdos prejudiciais.
O segundo recurso, relatado por Luiz Fux (RE 1057258), envolve a Google e questiona se a empresa tem o dever de fiscalizar o conteúdo hospedado em sites e removê-lo quando considerado ofensivo, sem a necessidade de intervenção judicial. Fux destacou a necessidade de responsabilizar as plataformas quando há evidência inequívoca de atos ilícitos, defendendo a remoção imediata de conteúdos como discursos de ódio ou apologia ao crime.
Barroso, por sua vez, adotou uma postura mais equilibrada. O magistrado reconheceu que, embora o artigo 19 seja parcialmente inconstitucional, a exigência de uma ordem judicial para a remoção de conteúdo deve ser mantida para crimes contra a honra, mas sugeriu que a notificação extrajudicial fosse suficiente para outros tipos de crime. Defendeu que as plataformas devem prevenir conteúdos prejudiciais, como pornografia infantil, e ser responsabilizadas por falhas sistêmicas. Também afirmou que, em casos de anúncios pagos, o conhecimento de conteúdos ilícitos seria presumido, e as empresas deveriam agir rapidamente.