A possível revogação do aumento das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) pode representar não apenas uma derrota fiscal para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas também evidenciar uma crescente desarticulação dentro do Executivo Federal. Em entrevista ao Correio da Manhã, o cientista político André Rosa avaliou que a gestão tem sido marcada por um jogo de “empurra” dos problemas, onde a falta de responsabilidade coletiva sobre as decisões escancara a fragilidade da imagem do atual comando do Palácio do Planalto.
Na quinta-feira passada (29), os presidentes da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), pressionaram a equipe econômica a apresentar uma alternativa às mudanças do IOF. Após uma reunião com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, junto a líderes partidários, ficou acordado que o governo teria um prazo de dez dias para entregar o novo planejamento. Durante o encontro, foi destacado que há uma insatisfação generalizada entre os deputados em relação à medida, e que o clima na Casa Baixa favorece a derrubada do decreto.
Até o momento, ao menos 20 propostas de suspensão foram protocoladas no Congresso Nacional. Para Motta, aumentar tributos sempre que o gasto público cresce não funciona. “É essencial pensar no futuro com medidas definitivas. O brasileiro está cansado de aumento de impostos", declarou.
Falta alinhamento
Embora a equipe econômica tenha afirmado que analisará de forma célere e cuidadosa as sugestões recebidas, já se prevê que eventuais modificações exigirão ajustes na execução orçamentária de 2025. O líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), defendeu que a manutenção do aumento do IOF este ano é essencial para evitar um contingenciamento de R$ 50 bilhões, o que afetaria serviços públicos e programas sociais nas áreas de saúde e educação. Para o cientista político André Rosa, no entanto, atribuir a culpa ao Legislativo não resolve o problema.
“Na verdade, trata-se de uma falta de articulação por parte do governo. O Congresso não é obrigado a aprovar tudo o que o Executivo propõe, e é por isso que existe o equilíbrio entre os poderes. O que vemos aqui é mais uma manobra falha, do ponto de vista da articulação política do governo com o Congresso Nacional”, avaliou.
O anúncio da medida, feito em 22 de maio, já evidenciou uma clara falta de alinhamento dentro do governo. Isso porque, poucas horas depois, houve a revogação de uma parte do decreto, em resposta à forte reação negativa do mercado financeiro. Na data, o Palácio do Planalto precisou realizar uma reunião de emergência sem a participação presencial de Haddad, que viajou para São Paulo após o decreto público. O trecho retirado tratava da elevação da alíquota sobre transferências de investimentos de fundos nacionais para o exterior.
Aumento de impostos
Na avaliação do sócio-fundador da Andaluz Investimentos, o economista Augusto Mergulhão, o governo está em um caminho arriscado ao buscar aumento de receita por meio de impostos, em vez de cortar gastos.
"Eu acho que há uma chance grande de derrubada do IOF pelo Congresso. Inclusive, é uma oportunidade para a oposição pressionar o governo a cortar na sua própria carne, que é onde deveria cortar. O governo não quer cortar gastos de forma alguma, só aumenta imposto. E mais impostos não vão trazer equilíbrio fiscal, até porque o brasileiro pode começar, inclusive, a buscar alternativas para não pagar esse imposto. E aí ocorre o efeito contrário: a queda de arrecadação", explicou à reportagem.
Mergulhão também criticou a tentativa do governo de usar o IOF como uma ferramenta arrecadatória, quando sua função principal é regulatória.
"Isso só pressiona mais a economia e aumenta a pressão sobre a política monetária do Banco Central, que já está com a taxa de juros elevada", destacou. O economista acrescentou que, ao antecipar o risco de cortes no Orçamento, o governo na verdade está apontando para o que precisa ser feito. "O equilíbrio fiscal tem que vir daí, não do aumento da receita", finalizou.