Por: Karoline Cavalcante

Vazamento de conversa gera crise de confiança no governo

Vazamento de conversa de Janja irritou Lula | Foto: Ricardo Stuckert / PR

A escolha de um representante para compor o primeiro escalão do governo federal é feita com base na confiança do presidente da República de que as decisões tomadas pela gestão serão respeitadas e haverá a manutenção do sigilo de tudo que é falado nos ambientes privados. É o que explica o cientista político Rócio Barreto ao Correio da Manhã. A análise leva em consideração as recentes insatisfações demonstradas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com sua equipe ministerial, devido ao vazamento de conversas ocorridas em um jantar privado com o presidente da China, Xi Jinping.

Um interlocutor revelou ao portal G1 que a primeira-dama brasileira Rosângela da Silva, a Janja, teria protagonizado um constrangimento em reunião com o líder do país asiático. Na ocasião, teria pedido a palavra para falar sobre os problemas da rede social chinesa TikTok em meio ao avanço da extrema-direita no Brasil. Ao se deparar com a matéria, Lula saiu em defesa de sua esposa durante entrevista coletiva realizada na última terça-feira (13). Disse que o assunto foi levantado por ele, e ela complementou — e que tem liberdade para isso. Mas, para além disso, questionou veementemente a forma e como a informação chegou à imprensa, já que o encontro era reservado e somente havia alguns de seus ministros no local.

Bronca

Em novas atualizações sobre o caso, a Folha de S. Paulo divulgou nesta quinta-feira (15), que durante o voo de volta da China para o Brasil, Lula fez um forte desabafo aos ministros que o acompanharam na viagem. No avião, classificou o vazamento como “deslealdade” e criticou a quebra de confiança por parte de membros da própria comitiva. "É inadmissível que pessoas escolhidas a dedo por mim para ir ao jantar quebrem a minha confiança atacando a minha mulher", disse, segundo presentes.

Sem citar nomes, o chefe do Palácio do Planalto afirmou que não abriria uma investigação formal nem exigiria acesso a celulares. Dos cinco ministros que participaram do jantar, Carlos Fávaro (Agricultura e Pecuária), Alexandre Padilha (Saúde), Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) e Mauro Vieira (Relações Exteriores), negaram na hora envolvimento com o episódio. O ministro da Casa Civil, Rui Costa, no entanto, permaneceu em silêncio no momento e, embora tenha sido apontado nos bastidores como principal suspeito, negou.

Na avaliação de Rócio Barreto, é necessário que haja uma melhor investigação interna, a fim de descobrir quem foi o responsável pela divulgação das informações. Segundo ele, por menos importante que pareça ser, gerou “um estrago grande em um governo que já vem sendo questionado” e o causador deveria ser substituído do cargo. “O vazamento gera especulação e causa um prejuízo enorme e, quem sabe, irreparável”.

Fogo amigo

Para o coordenador de Análise Política da BMJ Consultores Associados, Lucas Fernandes, o fogo amigo contra Janja não é novidade. Ele aponta que no início do governo, ela estava empoderada e com uma atuação relevante, o que a tornava mais exposta a críticas. Com o tempo, porém, Lula foi diminuindo sua influência e visibilidade.

"Então, essa postura do presidente de ser mais vocal e de ir a público dizer que considerou essa atitude desleal por parte da sua comitiva vem desse fato: ele entende que Janja está fazendo a parte dela e que seria papel dos aliados, nesse momento, deixar de criticá-la, já que boa parte das críticas das quais ela é alvo acabam tendo que ser respondidas pelo presidente”, explicou.

Fernandes explica ainda que esse acontecimento acaba gerando munição para políticos do campo oposicionista, destacando que o próprio ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), réu no Supremo Tribunal Federal (STF), aproveitou a oportunidade para fazer uma crítica pública à atual primeira-dama. Esse entendimento é reforçado por Rócio, que afirma que a oposição tenta vender à população a narrativa de que “não há um acordo, não há confiança, nem mesmo dentro da equipe do presidente Lula”.