O Supremo Tribunal Federal derrubou dois recursos protocolados pela Defensoria Pública e Ministério Público de São Paulo (MPSP) que questionava a decisão da Suprema Corte sobre a descriminalização do porte de cannabis para uso pessoal. O julgamento, que ocorreu em plenário virtual, terminou às 23h59 desta sexta-feira (14). Na prática, os magistrados mantêm na íntegra da decisão da Suprema Corte que descriminalizou o porte de maconha para uso pessoal e fixou a quantia de 40 gramas (ou seis plantas fêmeas) para diferenciar usuários de traficantes.
Em seu voto, o relator da medida, ministro Gilmar Mendes, reiterou que o caso se refere exclusivamente a maconha e que “nenhuma manifestação estendeu tal entendimento para os entorpecentes citados pelo embargante”, como haxixe e skunk. Além disso, o ministro-relator destacou que cabe ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) definir e realizar “mutirões carcerários, a indicar que a decisão impacta caso pretéritos”. A justificativa foi uma resposta ao MPSP, o qual solicitou que o Supremo deixasse mais claro se a descriminalização do porte de 40g se aplicaria ou não aos casos anteriores ao julgamento, até 2006, quando foi publicada a Lei de Drogas (Lei 11.343/2006).
Proibição
Vale destacar que a decisão do Supremo não legaliza o porte e a posse de cannabis ou outros tipos de drogas ilícitas. Dessa forma, segue como proibido fumar a erva em local público e pessoas que forem identificadas com cannabis nesse limite terão de cumprir advertências sobre os efeitos das drogas e comparecimento obrigatório presencial em curso educativo.
Antes a Lei de Drogas não deixava clara a diferença entre traficante e usuários. Dessa forma, a sentença cabia ao entendimento do juiz do caso – e elas acabavam sendo diferentes, a defender do juiz.
Questionada pelo Correio da Manhã, a advogada criminalista Hanna Gomes explicou que, com essa decisão, a medida “passa a valer automaticamente com a publicação da decisão do STF”. Porém, ainda é necessário aguardar a publicação do acórdão – documento com a decisão final do tribunal.
Além disso, o STF pode modular os efeitos da decisão, definindo um prazo para que ela entre em vigor. Após a publicação do acórdão, espera-se que o Congresso Nacional aprove uma lei regulamentando a questão, definindo, por exemplo, como será feita a fiscalização do limite de 40 gramas e como serão punidos os casos de porte acima dessa quantidade”, completou a advogada.
Congresso
No entanto, as chances de o Congresso Nacional aprovar uma nova lei definindo os novos critérios a partir do entendimento do STF são baixas, já que o poder Legislativo tende a uma linha diferente do Judiciário em relação ao porte de maconha.
Circula na Câmara dos Deputados a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2023, de autoria do ex-presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que criminaliza o porte ou a posse de qualquer quantidade de droga. A PEC já foi aprovada no Senado e na Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) da Câmara. Agora, falta a PEC ser votada e aprovada em uma comissão especial – que ainda precisa ser instalada – e votada no plenário da Câmara.
Para a reportagem, Hanna Gomes considerou a PEC 45/2023 como um “retrocesso em relação à atual legislação, que já prevê penas para o tráfico de drogas, mas não para o porte para uso pessoal”.
Portanto, caso a PEC seja aprovada, o porte de qualquer quantidade de droga passaria a ser crime, com penas de prisão que podem variar de seis meses a dois anos. “Essa medida pode gerar um aumento da população carcerária e prejudicar a reinserção social dos usuários de drogas”, afirmou.
A eventual aprovação da PEC deve gerar um conflito entre os poderes, já que ela é o oposto do que o STF definiu. Nesse caso, em que uma medida bate de frente com a outra, Hanna Gomes avaliou que “ é provável que o STF seja novamente acionado para decidir qual entendimento deve prevalecer”.
“A aprovação da PEC 45/2023 pode gerar um novo conflito entre Judiciário e Legislativo, especialmente se o STF for novamente acionado para se manifestar sobre a questão. Esse tipo de conflito pode gerar um desgaste entre os poderes e prejudicar a imagem do país perante a comunidade internacional”, completou Gomes.