O país descobriu tardiamente que envelhecer não deveria ser sinônimo de desaparecer. Durante décadas, idosos foram empurrados para a margem, tratados como peso ou como lembrança inconveniente de que o tempo passa para todos. Só em 2003, com a sanção do Estatuto da Pessoa Idosa, o Brasil decidiu transformar a velhice em direito. A lei nasceu de um projeto de 1997, do então deputado Paulo Paim (PT-RS), e garantiu algo simples, porém revolucionário: respeito.
Segundo a Agência Senado, o estatuto assegura prioridade na restituição do Imposto de Renda, rapidez em processos judiciais, direito a acompanhante nas internações e proteção contra aumentos abusivos em planos de saúde. Nos programas habitacionais, 3% das unidades ficam reservadas para pessoas idosas. A norma também determina que qualquer suspeita de violência seja comunicada à polícia. Era o mínimo para retirar da invisibilidade quem já tinha dado tanto ao país.
Mas foi preciso que a novela "Mulheres Apaixonadas", da Rede Globo, mostrasse o óbvio para que o Congresso acelerasse o processo. Naquele ano, cenas da personagem Dóris, interpretada por Regiane Alves, que maltratava os avós, provocaram indignação e empurraram o estatuto rumo à aprovação. Como se a ficção tivesse de chacoalhar a realidade para lembrar que dignidade não é favor.
Mais de vinte anos depois, o Enem escolhe o tema "Perspectivas acerca do envelhecimento na sociedade brasileira". O debate retorna porque, apesar da lei, ainda é comum tratar a velhice como problema. O país esquece que um futuro possível depende de reconhecer o valor de quem chegou antes.
Envelhecer não é falha. Falha é recusar-se a enxergar que todos, cedo ou tarde, ocuparão o mesmo lugar na fila. O Estatuto não é peça de arquivo e o tema do Enem é um alerta: o Brasil ainda precisa provar que sabe transformar direitos em prática. Cabe decidir se queremos descartar pessoas ou aprender com elas. A escolha está posta.