Parece mas não é , considerando o mundo real. O Brasil deveria estar apresentando um plano franco e claro, sem pedir desculpas a ninguém por explorar seu próprio petróleo, se esse plano vier a ser seguro e gerar meios financeiros para proteger a Amazônia e promover o povo do norte do Brasil. Isso é o mínimo que se espera de uma grande nação. A exploração da Margem Equatorial, ao largo do Amapá, Pará e Maranhão, com efeitos no Ceará e Rio Grande do Norte é necessária e benéfica para o país, para a Amazônia e para o futuro.
Ainda que o mundo caminhe para uma transição energética, esse processo levará seu tempo. O petróleo continuará indispensável por décadas. Não há contradição entre preparar o amanhã e garantir o presente.
O Brasil domina a exploração offshore há quase meio século. As bacias de Campos e Santos produzem petróleo de frente para a Mata Atlântica, paraísos como Búzios, Angra dos Reis, Cabo Frio e os parques de São Paulo, sem registro de acidentes relevantes. Mesmo com riscos inerentes, eles foram controlados com excelência técnica. Hoje o país é líder mundial em tecnologia offshore, um símbolo de maturidade industrial e ambiental. Mas , essa face não temos o hábito de mostrar. Celebrar a superação não é esporte nacional.
Não há aventura nessa proposta. Há experiência e responsabilidade. O ex-presidente da Petrobras Jean Paul Prates e a atual presidente Magda Chambriard lembram que o Brasil operará com padrões de segurança iguais ou superiores aos do pré-sal. O país sabe fazer e pode fazer. Não pode faltar atitude e altivez.
Enquanto hesitamos, a Guiana cresceu 38% em 2023, impulsionada pela ExxonMobil, Hess e CNOOC. O Suriname segue o mesmo caminho com a TotalEnergies e a APA Corporation. O mesmo petróleo, na mesma bacia geológica, é explorado sem pressões ambientais. Nenhum desses países ou empresas manifesta sentir vergonha. Já o Brasil, dono da matriz energética mais limpa entre as grandes economias, reage com insegurança.
Essa hesitação tem custo alto. Custa empregos, renda, credibilidade e, sobretudo, o futuro das novas gerações. O país paralisa, na área de licenciamento ambiental, diante de um teatro ideológico que substitui a verdade pela retórica. Por essas coisas a geração Z, no mundo inteiro, começa a se rebelar, cansada das versões extremistas, da cultura "woke" e da agressividade de direita. Quer resultados, não discursos. Quer propósito, não slogans. E se o Brasil continuar hesitando, deixaremos um legado de vergonha histórica: o de uma geração que não teve coragem de apostar no futuro.
Explorar a Margem Equatorial é um ato de responsabilidade. É gerar recursos para financiar educação, ciência, inovação, infraestrutura e, sim, a preservação da Amazônia. Como ensinava Ignacy Sachs, o verdadeiro progresso é o desenvolvimento negociado, o que concilia economia, ecologia e sociedade. A exploração responsável do petróleo pode financiar o plano que a Amazônia de segurança do qual a Amazônia precisa e que o mundo cobra ; mas para o qual não temos nem plano nem dinheiro. Só conversa.
Esse plano deve ser explícito. A Amazônia abriga mais de 30 milhões de brasileiros, muitos entre os mais pobres do país. Manter a floresta em pé custa caro. É preciso um programa completo de investimentos, com pesquisa em biologia e medicina tropical, biotecnologia, mineração responsável de terras raras e desenvolvimento urbano e turístico sustentável. O combustível para iniciar essa reconversão é o petróleo, enquanto ele durar. É o que fazem, do seu jeito, tanto os Emirados Árabes como a Arábia Saudita.
A demanda mundial por petróleo cairá, mas até lá o Brasil pode ter feito sua reconversão industrial e ambiental, fortalecendo o turismo de parques naturais, o urbanismo das cidades e o conforto da vida regional. Tudo isso é possível se tratarmos o tema com objetividade, como agora começa a ocorrer.
Essa é uma das raras vezes em que o diálogo volta a acontecer de maneira madura dentro da nossa democracia, com argumentos à mesa e sem preconceitos. Começa a haver coerência e racionalidade no debate. Depois de cinco anos de impasses, o radicalismo cansou. As pessoas querem números, contas e planos, não bravatas.
O que não faz sentido é ficarmos hesitando diante de uma exploração que pode ser comprovadamente segura enquanto aceitamos doações de países como a Noruega, que financia sua riqueza com o petróleo de extraído no Ártico. Essas doações, insuficientes, são possíveis justamente porque eles exploram, e exploram muito. Ao Brasil cabe resolver. Como, senão da forma proposta ? Até para o narcotráfico estamos perdendo a região que virou grande passagem de drogas.
Essa é a diferença entre autonomia e hesitação, entre responsabilidade e submissão à opinião de terceiros que raramente aplicam os mesmos critérios que nos cobram. Até aqui vemos um Presidente do Senado, Davi Alcolumbre com sobriedade defendendo o progresso e o bom senso ao lado dos governadores e líderes da região norte ; e a Ministra Marina Silva, aberta ao diálogo. O Brasil do diálogo e da técnica estaria nascendo ? Assim sendo os brasileiros agradecem.
*Vinícius Lummertz, cientista político, foi ministro do Turismo, secretário de Turismo de São Paulo, presidente da Embratur e é Senior Fellow do Milken Institute (EUA).