"Qualquer discussão em torno da adoção de um ajuste fiscal sério deve 'atacar' a questão central do crescimento das transferências sociais e dos benefícios previdenciários, que responderam por 3,7% do aumento dos gastos primários, nos últimos 16 anos". A avaliação 'cirúrgica' é do economista, diretor-presidente da MCM Consultores e colunista de economia do Estadão, Claudio Adilson Gonçalez, ao comentar que as contas públicas 'tombaram' de um superávit primário de 2,3% do PIB, em 2008, para um déficit de 0,4% do PIB, no ano passado.
Não bastasse a subtração 'escandalosa' de vulneráveis idosos - perpetrada por servidores federais do INSS, até agora, não 'alcançados' pela Justiça - uma nova reforma da Previdência, além da revisão de programas de transferência de renda devem ser, segundo Gonçalez, relegados a segundo plano, por serem 'sensíveis' politicamente, ante à proximidade do pleito em 2026. Na perspectiva, certo é que o 'buraco' do déficit previdenciário deve se aprofundar, a reboque do envelhecimento inexorável da população.
Ao considerar que "não se está falando sério sobre cortes de gastos", o economista entende que "a tão decantada reforma administrativa, necessária à maior eficiência dos serviços públicos, tem pouco poder de redução de gastos, entre R$ 1 bilhão a R$ 3 bilhões por ano. Observe-se que a despesa com pessoal, como proporção do PIB, vem caindo ao longo do tempo".
Desfazendo o 'mito' de que as desvinculações dos gastos em saúde e educação das receitas e do piso da previdência ao salário mínimo seriam 'balas de prata' para resolver o buraco das contas públicas, o economista exibe números sobre a trajetória fiscal:
"No período de 2008 a 2024 tivemos as seguintes evoluções das despesas primárias, como proporção do PIB: pessoal (ativos e inativos) caiu de 4,3% para 3,1%; transferências sociais (Bolsa Família, abono salarial, seguro-desemprego e o BPC) subiram de 1,1% para 3,3%; Previdência Social subiu de 6,4% para 7,9%; já demais despesas obrigatórias subiram pouco, de 2,5% para 2,8%; e, finalmente, as despesas discricionárias, nas quais se concentram todos os investimentos públicos, caíram de 2,4% para 1,6%".