Por: Ana Carolina Martins

Saiba por que hoje é feriado em Campinas

Catedral Metropolitana de Campinas: construção levou 76 anos de construção. | Foto: Firmino Piton/PMC

Quando dezembro avança e o calor anuncia o fim do ano, Campinas desperta para uma das datas mais simbólicas de sua história: o 8 de dezembro, feriado municipal que homenageia a Nossa Senhora da Imaculada Conceição, padroeira da cidade.

A celebração, oficializada pela Lei Municipal nº 173, de 28 de junho de 1949, é muito mais do que uma pausa no calendário, é a memória viva da fundação do município e da fé que acompanhou os seus primeiros habitantes.

Embora o aniversário de Campinas seja comemorado no dia 14 de julho, é no início de dezembro que a tradição religiosa ocupa o centro da cena. A escolha da padroeira remonta ao ano de 1774, quando a então pequena comunidade pleiteou o direito de ter a sua própria paróquia e autonomia espiritual.

Naquele período, a região ainda pertencia à Vila de Jundiaí, cuja matriz, Nossa Senhora do Desterro, obrigava os moradores a longos deslocamentos para assistir a missas, receber os sacramentos e realizar funerais. A reivindicação por uma paróquia local foi tão determinante que acabou se tornando o ato simbólico de fundação da cidade.

E foi assim que nasceu a Freguesia de Nossa Senhora da Conceição das Campinas de Mato Grosso, inaugurada com a primeira missa em uma capela improvisada, localizada onde hoje está o túmulo de Carlos Gomes, na Praça Bento Quirino. O termo “Mato Grosso” se refere à região que, naquela época, apresentava pequenos descampados (campinas) no meio de uma mata fechada (Mato Grosso), servindo como ponto de parada para os tropeiros.

Poucos anos depois, em 1781, Campinas ergueu sua primeira Igreja Matriz — hoje a Basílica Nossa Senhora do Carmo, no Largo do Carmo, local que por décadas foi o coração religioso do município.

Devoção religiosa

A devoção à Imaculada Conceição cresceu junto com o povoado. Em 1807, começaram as obras de um templo ainda mais grandioso: a futura Catedral Metropolitana de Campinas, concluída apenas em 1883, após impressionantes 76 anos de construção.

Erguida com a técnica de taipa de pilão, é, até hoje, considerada o maior edifício do mundo construído com esse método, unindo traços do barroco e do neoclássico em uma das arquiteturas mais expressivas do interior paulista. Todos os anos, no 8 de dezembro, é ali que a cidade se reúne para a tradicional Solenidade da Imaculada Conceição de Maria, celebrada pela manhã e seguida de programação especial.

A figura de Nossa Senhora da Imaculada Conceição, na tradição católica, representa a pureza da Virgem Maria — concebida sem pecado e escolhida para ser a mãe de Jesus Cristo. A devoção é tão significativa que o dia 8 de dezembro é celebrado como feriado também em outras cidades brasileiras, entre elas Belo Horizonte, Salvador, Belém, João Pessoa, Piracicaba, Recife, Manaus e São José do Rio Preto.

O início de tudo

Curiosamente, a própria história do aniversário da cidade já foi diferente. Até 1971, o município comemorava sua fundação em 13 de setembro, data da chegada de Barreto Leme à região, figura histórica fundamental no Estado de São Paulo e considerado o fundador de Campinas. Entretanto, a primeira missa oficial, em 14 de julho de 1774, quando a freguesia foi finalmente instituída, consolidou-se como marco definitivo, reorganizando o calendário histórico local.

O feriado de 8 de dezembro, portanto, não é apenas religioso, ele carrega o início da organização urbana, social e comunitária de Campinas. É um lembrete de que, antes de cafés, ferrovias, indústria, tecnologia e universidades, a cidade nasceu da vontade de um pequeno grupo de famílias de ter uma fé celebrada em seu próprio território.

Ritual que atravessa séculos

Hoje, quando os fiéis se reúnem diante do altar da Catedral, repetindo um ritual que atravessa mais de dois séculos, não participam apenas de uma missa, mas também de um elo vivo com as origens da hoje metrópole. A data, mantida no calendário por lei, guarda a memória de um tempo em que Campinas ainda ensaiava ser cidade, porém já sabia muito bem qual seria a sua padroeira. 

O prefeito de Campinas, Dário Saadi, é um entusiasta da data comemorativa religiosa. “Celebrar este feriado é honrar nossas raízes, lembrando que a padroeira representa um vínculo com a origem de Campinas, e manter esses dados no calendário municipal é preservar a memória e a identidade do nosso povo”, afirma.

O padre José Antônio Trasferetti, atual reitor do Santuário da Paróquia Santa Rita de Cássia e padre diocesano da Arquidiocese de Campinas, acredita que a festa da padroeira representa o reconhecimento da presença da história que coloca a espiritualidade no centro da vida social. Segundo Trasferetti, no início da formação das cidades, a religião representava um fator de agregação de pessoas e um fortalecimento da fé, visto que quase todos os municípios do Brasil nasceram sob a égide de um santo protetor.

”O santo padroeiro representava a proteção dos cidadãos contra os males presentes na sociedade de então. A influência do catolicismo era real. Os santos padroeiros tinham a tarefa de fortalecer o município, tendo em vista o pleno desenvolvimento dele”, reforça o padre.

Ele complementa explicando que os tempos mudaram, mas a devoção popular continua forte. “As pessoas creem no poder de intercessão dos Santos. É importante colocar em orações a vida e o trabalho de todos aqueles que cuidam da administração das cidades. Neste dia da padroeira devemos orar por todos aqueles que são responsáveis pelo bem estar da cidade”, recomenda o sacerdote. 

A escritora Ana Lúcia Vasconcelos, católica fervorosa, acredita que Campinas pode se considerar agraciada por ter Maria, a Imaculada Conceição, como padroeira. “Elá é aquela que foi dada pelo próprio Jesus na cruz à João como sua mãe. João simbolizava ali, naquele momento, toda a humanidade. Maria é, portanto, mãe da Igreja, mãe dos homens, que está sempre intercedendo pela nossa salvação.”

E enquanto o sino da Catedral ressoa pela Praça José Bonifácio, o 8 de dezembro segue lembrando que a história de Campinas começou com um gesto simples e comunitário: a construção de um lar espiritual — o primeiro de muitos passos que moldaram a cidade que conhecemos hoje.

Macaque in the trees
Igreja do Carmo, na Praça Bento Quirino | Foto: Firmino Piton/PMC

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Imagem de Nossa Senhora da Imaculada Conceição: devoção e fé | Foto: Fmardito, CC BY-SA 4.0