Quase metade das mulheres brasileiras segue sem se sentir respeitada no país. A 11ª Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher, realizada pelo DataSenado e pela Nexus em parceria com o Observatório da Mulher contra a Violência (OMV), mostra que 46% das entrevistadas afirmam não ser tratadas com respeito no dia a dia — sensação que se repete em casa, no trabalho e, principalmente, nas ruas, apontadas como o ambiente de maior desrespeito para 49% delas. O levantamento, que ouviu mais de 20 mil mulheres em todas as regiões, confirma que o machismo continua estrutural: 94% classificam o Brasil como um país machista.
A força dessa percepção aumentou desde o último levantamento. O percentual de mulheres que consideram o Brasil muito machista subiu de 62% para 70% em dois anos, o que equivale a mais de oito milhões de brasileiras acrescentando uma avaliação mais severa sobre desigualdade de gênero.
Desde 2017, o índice nunca ficou abaixo de 90%, e apenas 2% das entrevistadas dizem não ver machismo no país. A alta percepção acompanha a impressão de crescimento da violência doméstica: 79% acreditam que ela aumentou no último ano, retomando o maior patamar da série histórica.
Nas ruas, o cenário também preocupa. Embora tenha havido leve queda desde 2023, o ambiente público continua sendo o local em que a maioria das mulheres se sente menos respeitada. Dentro de casa, porém, houve piora: um aumento de quatro pontos percentuais fez com que milhões de brasileiras passassem a ver o ambiente familiar como o mais inseguro. No trabalho, a sensação de desrespeito segue praticamente estável.
Para a antropóloga Beatriz Accioly, do Instituto Natura, o avanço da percepção de desrespeito dentro de casa reflete os persistentes índices de violência doméstica. "O círculo íntimo, que deveria oferecer proteção, segue sendo um dos ambientes mais perigosos", afirma.
Dados no Nordeste
A pesquisa revela diferenças regionais importantes. No Nordeste, 50% das mulheres dizem que as mulheres não são tratadas com respeito, um dos índices mais altos do país — atrás apenas da região Sul, onde 53% responderam que o desrespeito ocorre "às vezes". Logo depois do Nordeste aparece o Sudeste (48%), seguido por Centro-Oeste (44%) e Norte (41%).
O dado reforça a persistência de desigualdades estruturais na região, historicamente marcada por maiores níveis de vulnerabilidade social e menor acesso a políticas de proteção. Apesar disso, especialistas ressaltam que a sensação de desrespeito é generalizada em todo o território nacional. Para Maria Teresa Prado, coordenadora do OMV, as diferenças regionais mostram nuances, mas não alteram o quadro mais amplo: "Em todas as regiões, há um volume expressivo de mulheres que transitam entre o respeito ocasional e o desrespeito constante, o que demonstra instabilidade na forma como a sociedade enxerga e trata as mulheres".
Escolaridade
amplia o contraste
O recorte por escolaridade mostra desigualdades ainda mais profundas. Entre mulheres não alfabetizadas, 62% afirmam não ser tratadas com respeito.
O índice cai para 41% entre aquelas com ensino superior completo. Mesmo assim, o sentimento de desrespeito permanece elevado: apenas 8% das brasileiras com diploma universitário dizem ser plenamente respeitadas.
As maiores variações aparecem entre mulheres com ensino médio e superior incompleto, em que mais da metade afirma ser respeitada apenas às vezes — evidenciando que a escolaridade reduz, mas não elimina, a exposição ao machismo e ao desrespeito.