Por: Jorge Vasconcellos

MPT pede que governador do RS vete desvio de finalidade de doações feitas a vítimas de enchentes

O drama das vítimas das enchentes de 2024 levou entidades públicas e privadas a fazerem doações em socorro à população gaúcha | Foto: Bruno Peres/Agência Brasil

O Ministério Público do Trabalho (MPT) pediu ao governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSD), que não autorize a transferência de recursos doados em socorro às vítimas do desastre climático de 2024 para o reaparelhamento do Ministério Público do estado.

O pedido está em ofício encaminhado ao governador na quarta-feira (10) pelo procurador Geral do Trabalho, Gláucio Araújo de Oliveira, e o procurador Chefe da Procuradoria Regional do Trabalho da 4ª Região (PRT4), Antônio Bernardo Santos Pereira.

Eles requerem a Eduardo Leite o veto de dispositivo do Projeto de Lei estadual 363/2024, que permite a transferências de verbas do Fundo para Reconstituição de Bens Lesados (FRBL) para o Fundo de Reaparelhamento do Ministério Público (FRMP), com efeitos retroativos a janeiro de 2024.

O objetivo do MPT é que os valores destinados pelo órgão e doados pela população ao FRBL em função da solidariedade gerada pelas enchentes de 2024 sejam 100% aplicados em proveito da população gaúcha.
Desde a aprovação do PL, a administração do MPT-RS reuniu-se com representantes do MP, do Executivo e do Legislativo estaduais para manifestar suas objeções e as consequências jurídicas da sanção do texto atual.

Em dezembro, foram realizadas reuniões com a secretária extraordinária de Relações Institucionais do governo do Estado, Paula Mascarenhas; com o deputado Pepe Vargas; com o procurador-geral do Estado, Eduardo Cunha da Costa; com o líder do governo na Assembleia, deputado Frederico Antunes; e com o secretário-chefe da Casa Civil, Artur Lemos, em que estiveram também o procurador-geral de Justiça, Alexandre Saltz, o secretário-geral do MP-RS, João Ricardo Tavares, e o presidente do FRBL, João Cláudio Pizzato Sidou.

Pela redação encaminhada à sanção do governador, 20% de todas as verbas destinadas ao FRBL recolhidas desde janeiro de 2024 seriam revertidas para o orçamento do MPRS.

Com a base de cálculo abarcando o ano passado inteiro, a consequência seria transferir para o orçamento do MP-RS recursos encaminhados de todo o Brasil para uso na recuperação dos estragos do desastre climático – incluindo as doações da sociedade civil em campanhas de arrecadação pelo Pix do FRBL, que alcançou a cifra de milhões de reais.

O procurador-chefe, Antônio Bernardo Pereira, e o vice-procurador-chefe, Anderson Reichow, reforçaram durante as reuniões que a transferência dessas destinações de um fundo para o outro desrespeitaria a legislação de regência da matéria e o acordo de cooperação técnica assinado entre o MPT e o MPRS em maio do ano passado para viabilizar as destinações.

O procurador-geral do Trabalho, no ofício, destaca a importância da aplicação dos recursos junto à comunidade afetada, o que se mostra conforme com recente decisão do STF sobre a matéria, na seara da ADPF 944.

“O esforço que historicamente se fez no MPT com relação ao proveito social das destinações das indenizações tem por alvo, justamente, a garantia de que as localidades afetadas sejam diretamente compensadas por meio da nossa atuação institucional, garantindo-se a proximidade do manejo desses recursos”, afirma Gláucio Araújo de Oliveira.

O ofício lembra também que a mudança de regras acaba servindo como desestímulo à solidariedade em ocasiões futuras, sendo fundamental o respeito às regras vigentes ao tempo das destinações.

“A emenda, na verdade, introduz um risco real de percepção pública negativa: doações emergenciais passariam a ser vistas como suscetíveis de reinterpretação legislativa posterior, um precedente que compromete a credibilidade do Estado e, sobretudo, desestimula futuras manifestações de solidariedade, inclusive em contextos emergenciais”.