Por Igor Gielow (Folhapress)
A Rússia tornou-se nesta quinta (3) o primeiro país do mundo a reconhecer a milícia fundamentalista Talibã como o governo legítimo do Afeganistão, quase quatro anos após os radicais retomarem o poder em Cabul.
Trata-se de um marco numa complexa relação entre os países, que passou pela invasão soviética do Afeganistão nos anos 1980 e a designação dos talibãs como terrorista pelo governo de Vladimir Putin em 2003, medida que durou até abril deste ano.
Por trás do movimento russo há a intenção de restabelecer influência nas fronteiras da Ásia Central e do sul do continente, onde fica o Afeganistão, remontando à atuação prevalente de Moscou durante os tempos de império (1613-1917) e da União Soviética (1922-1991).
Desde o fim da Guerra Fria, em 1991, a China ocupou tal espaço com sua crescente pujança econômica, tornando-se o principal parceiro econômico das nações da Ásia Central, antes parte do império soviético. Projetos de infraestrutura se multiplicam, afastando países importantes como o Cazaquistão da órbita de Moscou.
Isso ocorre mesmo com Pequim e Moscou em forte aliança, desenhada no escopo da Guerra Fria 2.0 contra os EUA, que segue firme mesmo com a aproximação de Donald Trump e Putin.
Um caso peculiar é o do Paquistão, país de cujos serviços de inteligência foi parido o Talibã no início dos anos 1990. Ali o Kremlin não tinha vez, mas a China tomou o lugar dos Estados Unidos após o fracasso da chamada Guerra ao Terror, os conflitos iniciados no Oriente Médio e no Sul da Ásia após o ataque terrorista do 11 de setembro de 2001 contra os EUA.
O Afeganistão, fortemente ligado a Islamabad, pagou o preço por ter abrigado Osama bin Laden e seus fanáticos da rede Al Qaeda. O saudita havia lutado contra os soviéticos contra a ocupação de 1979 a 1989 do país, e a partir do refúgio dado pelos antigos aliados lançou os ataques às Torres Gêmeas e ao Pentágono.
O Talibã voltou ao poder em 15 de agosto de 2021, 20 anos após ser chutado pelos EUA. Apesar das promessas de moderação, o grupo reinstalou uma versão 2.0 de seu Emirado Islâmico, onde a lei religiosa dita a vida pública.
Neste ano, após a retirada do rótulo de terrorista do grupo, Moscou buscou a normalização das relações e aceitou a presença de um novo embaixador afegão no país.