Por Luciano Trindade e Cristina Camargo (Folhapress)
As famílias dos dez garotos que morreram em um incêndio no CT do Flamengo, conhecido como Ninho do Urubu, em 2019 protestaram nesta quarta (22) após decisão da Justiça do Rio de Janeiro de absolver todos os sete réus do caso.
Em comunicado, a Associação dos Familiares de Vítimas do Incêndio do Ninho do Urubu, que reúne mães, pais irmãos e os demais familiares das vítimas, afirmou que a absolvição representa "uma grave afronta à memória das vítimas e ao sentimento de toda a sociedade".
"A absolvição dos acusados, sob o argumento de que não se conseguiu individualizar condutas técnicas ou provar nexo causal penalmente relevante, renova em nós o sentimento de impunidade e fragiliza o mecanismo de proteção à vida e à segurança dos menores em entidades esportivas", acrescenta o texto.
De acordo com o despacho do juiz Tiago Fernandes de Barros, da 36ª Vara Criminal do Rio de Janeiro, a absolvição é baseada na "ausência de demonstração de culpa penalmente relevante e na impossibilidade de estabelecer um nexo causal seguro entre as condutas individuais e a ignição".
O Ministério Público do Rio de Janeiro vai recorrer à 2ª instância do Tribunal de Justiça do estado. Em maio, o MP-RJ havia pedido a condenação de todos os acusados pelo crime. "O nefasto episódio, que ficou conhecido como a maior tragédia da história do Flamengo, poderia e deveria ter sido evitado", diz trecho de nota divulgada pelo órgão.
Procurado pela reportagem, o Flamengo afirmou que não vai se manifestar sobre a decisão da Justiça.
Foram absolvidos Márcio Garotti, diretor financeiro do Flamengo, Marcelo Maio de Sá, diretor adjunto de patrimônio, Claudia Pereira Rodrigues, responsável pela assinatura dos contratos, Danilo Duarte, engenheiro, Weslley Gimenes, engenheiro, Fábio Hilário da Silva, engenheiro, e Edson Colman, sócio da empresa responsável pela manutenção dos aparelhos de ar condicionado
O Ministério Público havia pedido a condenação dos sete réus após ouvir 40 testemunhas na longa instrução criminal, que durou quatro anos desde que o caso foi denunciado à Justiça, em janeiro de 2021.
Onze pessoas chegaram a ser denunciadas à Justiça, mas as denúncias contra dois dos acusados foram rejeitadas porque eles não estavam vinculados ao fato; outro foi absolvido sumariamente pelo entendimento de que suas ações não contribuíram para o crime e um quarto, o ex-presidente do Flamengo Eduardo Bandeira de Mello, hoje com 72 anos, atingiu a idade prevista no Código Penal que daria o direito à redução de sua pena, o que resultou na prescrição do caso.
Para o Ministério Público, a tragédia poderia ter sido evitada. O processo criminal apontou que o CT funcionava sem alvará devido à ausência de certificado de aprovação emitido pelo Corpo de Bombeiros. O local, segundo a promotoria, já havia sido interditado e autuado várias vezes.
Irregularidades elétricas e falta de manutenção preventiva nos aparelhos de ar-condicionado são algumas das falhas apontadas pela investigação. O incêndio, segundo o órgão, começou devido a curto-circuito no interior de um dos aparelhos de ar-condicionado.
Além disso, os contêineres que funcionavam como alojamentos tinham uma janela gradeada por quarto, portas de correr que emperraram durante o incêndio e uma única porta de saída descentralizada e distante do quarto 1, onde os dez jovens morreram. Tudo isso dificultou a fuga dos adolescentes.
Não havia um sistema de combate a incêndios e existiam no interior das chapas de aço material sem tratamento antichamas. Esse material, de alta inflamabilidade, causou o desenvolvimento rápido do incêndio, conforme mostrou a perícia técnica.