Por: Isabel Dourado

Mulheres são maioria na Medicina

Mulheres se tornam maioria entre os médicos do país | Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

O Ministério da Saúde apresentou a 7ª edição da Demografia Médica no Brasil (DMB). A pesquisa é conduzida há 15 anos pelo Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) e reúne dados sobre a formação, atuação e distribuição de médicos no país. O estudo contou com a participação de 22 pesquisadores e com a colaboração do Ministério da Saúde, da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), da Associação Médica Brasileira (AMB), do Ministério da Educação (MEC) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).

Mário Scheffer, coordenador do estudo e docente do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, afirma que a demografia é crucial para a elaboração e execução de políticas públicas. “O objetivo da Demografia Médica é fornecer uma base empírica compartilhada para o debate sobre os diversos desafios enfrentados pela medicina e pelo sistema de saúde. Queremos produzir e divulgar evidências que possam apoiar a formulação e execução de políticas públicas voltadas ao fortalecimento do SUS.”

Desigualdade no acesso

Pela primeira vez, a publicação apresentou dados sobre a produção de cirurgias no Brasil. O levantamento mostrou que pacientes com plano de saúde realizam, proporcionalmente, mais cirurgias do que aqueles atendidos exclusivamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Foram analisados os três procedimentos mais realizados no país: remoção do apêndice, retirada da vesícula biliar e correções de hérnias da parede abdominal. Na apendicectomia, cirurgia de urgência mais comum no Brasil, a taxa entre beneficiários de planos de saúde foi de 100 por 100 mil habitantes - 34,4% superior à verificada no SUS (74,45 por 100 mil). Considerando o volume, o sistema público respondeu por 70% do total de procedimentos em 2023.

Para a colecistectomia, o setor privado apresentou uma taxa 58,7% maior que a do SUS: 312,38 contra 196,81 cirurgias por 100 mil habitantes. Ainda assim, o SUS foi responsável por 66% das intervenções. A maior disparidade foi registrada nas cirurgias de hérnias da parede abdominal: 401,41 procedimentos por 100 mil habitantes na rede privada - número 86,6% superior ao do SUS (215,07 por 100 mil). O estudo também mostra que 70% dos cirurgiões atuam nos dois setores — público e privado. Outros 20% trabalham exclusivamente no setor privado, e 10% atuam apenas no SUS.

Equipes

Enquanto isso, 8% das cirurgias são canceladas por falta de equipe, principalmente de anestesistas. Os dados reforçam a necessidade de ampliar o acesso às cirurgias pelo SUS e apontam uma forte concentração de especialistas na rede privada de saúde, muitas vezes em instituições que não prestam atendimento ao SUS.

O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, disse que o governo está redesenhando parcerias com o setor privado para ampliar a oferta de serviços e reduzir as filas. “Os resultados da demografia médica são fundamentais para orientar estratégias de avanço na área da saúde e a ideia é aproveitar a capacidade instalada — muitas vezes ociosa — dos hospitais e ambulatórios privados. Uma das coisas que está clara para nós é que, em razão da forma como se distribui a estrutura de atendimento e a concentração dos profissionais, não é possível avançar na oferta do atendimento especializado sem buscar parcerias com o setor privado.”

Residência Médica preocupa

Eloisa Bonfá, diretora da Faculdade de Medicina da USP, afirma que a pesquisa oferece um retrato poderoso e necessário da Medicina brasileira. A diretora chama atenção para a crescente disparidade entre o número de formandos e as vagas de residência médica.

“Nós temos uma preocupação muito grande. A abertura indiscriminada de escolas médicas e de programas de residência sem avaliação robusta de qualidade compromete a formação de especialistas. É necessário que haja uma avaliação adequada desses programas, nós temos uma preocupação muito grande porque as residências médicas não estão sendo avaliadas de maneira apropriada, e por isso a qualidade da formação médica fica comprometida.”

Em 2023, 266 mil estudantes estavam matriculados na graduação e apenas 43 mil estavam matriculados na residência médica. Outro dado preocupante do estudo é o aumento de médicos generalistas sem residência médica ou título de especialização.

Mulheres

Pela primeira vez, as mulheres se tornarão maioria entre os médicos no Brasil. Já em 2025, irão representar 50,9% do total de profissionais. Esse aumento é expressivo em comparação com 2010, quando elas correspondiam a 41% da população médica. As projeções indicam que, até 2035, as mulheres serão 56% do total de médicos no país.

No ensino de Medicina, a presença feminina também tem crescido. Em 2010, as mulheres representavam 53,7% dos matriculados nos cursos de graduação, número que subiu para 61,8% em 2023. Entretanto, elas predominam em apenas 20 das 55 especialidades médicas - a Dermatologia lidera o ranking, com 80,6% das mulheres.

Formação

Em dezembro de 2024, o Brasil contava com 353.287 médicos especialistas, o que representa 59,1% do total de médicos registrados. Os demais 244.141 (40,9%) eram generalistas, graduados em Medicina, mas sem título de especialista. Entre as 55 especialidades regulamentadas no Brasil, sete delas concentram 50,6% do total de especialistas: Clínica Médica, Pediatria, Cirurgia Geral, Ginecologia e Obstetrícia, Anestesiologia, Cardiologia e Ortopedia e Traumatologia.

O estudo revela que 63,7% dos títulos em especialidades foram obtidos por meio da Residência Médica, enquanto 36,3% foram concedidos por exames de titulação pelas sociedades médicas vinculadas à Associação Médica Brasileira (AMB).

Entre os médicos especialistas, a maioria (79,1%) possui um título, enquanto 20,9% acumulam dois ou mais títulos em diferentes especialidades. Apesar do crescimento, a distribuição dos especialistas no território nacional é desigual. “Seguimos enfrentando uma distribuição extremamente desigual dos médicos no território nacional. Ainda temos municípios sem um médico de família, mesmo a Constituição garantindo que a saúde é um bem de todos”, afirmou Eloísa Bonfá.

O percentual de especialistas em relação ao total de médicos varia de 72,2% no Distrito Federal e 67,9% no Rio Grande do Sul a 46,5% em Rondônia e 45,1% no Piauí. A região Sudeste concentra 55,4% de todos os médicos especialistas, seguida pelas regiões Sul (16,7%), Nordeste (14,5%), Centro-Oeste (7,5%) e Norte (5,9%).