Por Gabriela Gallo
Faltando pouco menos de um mês para o prazo final da declaração do Imposto de Renda, o Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Tesouro Nacional (Sindifisco Nacional) segue em greve - que já ultrapassa os cinco meses. E pode ainda intensificar a paralisação. A razão: uma decisão recente do Comitê Gestor do Programa de Produtividade da Receita Federal do Brasil, vinculado ao Ministério da Fazenda, definida nesta quarta-feira (30), anunciou alterações no cálculo do bônus de eficiência para auditores fiscais.
Bônus
Até a última quarta-feira (30), o teto do bônus mensal de eficiência dos auditores fiscais era de R$ 7 mil. O valor foi definido em decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em março do ano passado. Porém, com a alteração anunciada na última semana, o teto do bônus mensal passa a ser de R$ 6,3 mil, uma perda de R$ 700 (10%) para a categoria.
Em um vídeo publicado nos canais de comunicação do Sindifisco Nacional, o presidente da entidade, Dão Real, criticou duramente a decisão, alegando que as alterações não alteram apenas as regras "mas também modificam a interpretação em relação ao cálculo do bônus de eficiência".
"[É] uma nova interpretação que prejudica os auditores fiscais ativos e aposentados", disse Dão Real. "Diante disto, não cabe outra resposta que não seja acirrar ainda mais a mobilização. Os auditores fiscais não aceitarão esse tipo de retaliação", completou.
"Quebra de confiança"
Além das reivindicações da greve, como reajuste salarial da categoria, o Sindifisco exige a revogação das novas regras. "A direção nacional considera que houve uma inaceitável quebra de confiança. Queremos continuar negociando, sim, mas não aceitamos esse tipo de ação justamente no momento em que estávamos construindo uma alternativa", reiterou o presidente do Sindifisco.
Entenda
Em 2023, a categoria recebeu um reajuste de 9%, referente ao bônus de eficiência para auditores fiscais, uma parcela adicional à remuneração que tem o objetivo de incentivar o desempenho e a produtividade dos servidores dessa categoria. O Sindifisco alega que o reajuste é insuficiente, considerando que a categoria enfrenta uma perda salarial acumulada de 28% desde 2016, em decorrência da inflação.
Em novembro de 2024, o sindicato apresentou uma proposta de reajuste para o salário base, que foi negado pelo Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), comandado por Esther Dweck, e levou os funcionários a entrarem em greve. Auditores fiscais aposentados também aderiram ao movimento, já que eles ganham o salário base porque algumas das bonificações são somente para funcionários ativos.
Assim, a categoria pede reajuste do salário e o ministério considera que o bônus é uma alteração. A mudança do cálculo do bônus de eficiência é um novo capítulo nesta negociação entre auditores fiscais e poder Executivo.
Imposto de Renda
O prazo final para a declaração do Imposto de Renda, tanto para pessoas físicas quanto jurídicas, termina em 30 de maio. Até lá, ainda não se sabe se a greve terminará. Ao Correio da Manhã, o consultor e executivo de Gestão de Riscos Rodrigo Provazzi destacou que, caso a greve não termine até o prazo, ela pode afetar "a eficiência e a previsibilidade do processo de Declaração de Imposto de Renda como um todo".
Dentre os impactos, ele destacou primeiro um atraso na análise de declarações. "Menos auditores disponíveis podem tornar a análise mais lenta, aumentando o risco de retenção na malha fina e atrasando a resolução de pendências fiscais", explicou Provazzi. Ele ainda citou que a greve implicará diretamente em dificuldades no atendimento. "A greve pode resultar em atendimento mais lento ou suspensão de serviços, dificultando a resolução de dúvidas e problemas dos contribuintes", disse.
No setor empresarial, ele ainda ponderou o impacto na gestão de fluxo de caixa. "Empresários que dependem da restituição para equilibrar o fluxo de caixa podem enfrentar dificuldades financeiras adicionais", completou.
Impactos
Dentre os principais impactos ligados à paralisação do setor, pode-se citar: atrasos na liberação de cargas, documentos retidos e processos aduaneiros - atividades e procedimentos envolvidos na movimentação de mercadorias através das fronteiras internacionais, como importação e exportação - que ficarão estagnados por um tempo. Questionado pela reportagem, o consultor e executivo de Gestão de Riscos reiterou que os impactos da greve dos auditores fiscais não se limitam às grandes empresas.
Pequenas e médias empresas também vêm enfrentando desafios significativos devido à paralisação, como atrasos na liberação de mercadorias. "Pequenas e médias empresas, que muitas vezes dependem de um fluxo constante de mercadorias para manter seus estoques, estão sofrendo com atrasos na liberação de produtos importados e exportados. Isso pode levar a desabastecimento e perda de vendas", ponderou Rodrigo Provazzi.
Ele ainda citou aumento de custos logísticos, deterioração de produtos perecíveis e a interrupção de cadeias produtivas. "Empresas que lidam com produtos perecíveis enfrentam o risco de perda de mercadorias devido aos atrasos na liberação, resultando em prejuízos financeiros diretos. A paralisação também pode interromper cadeias produtivas, especialmente para empresas que dependem de insumos importados para a fabricação de seus produtos. Em resumo, a greve dos auditores fiscais afeta empresas de todos os tamanhos, com impactos que vão além das grandes corporações e atingem diretamente a operação e a sustentabilidade financeira das pequenas e médias empresas", destacou o consultor.
O outro lado
Questionado pelo Correio da Manhã, o Ministério de Gestão e Inovação reiterou que "o acordo com as entidades foi fechado em fevereiro de 2024, em uma mesa específica e temporária de negociação que tratou da regulamentação do bônus, com reajuste na remuneração para os servidores já em 2024 (ao contrário da maioria das categorias que não recebeu reajuste em 2024) e contemplando aumentos progressivos até 2026".
A pasta reiterou que o caso se trata do "Termo de Acordo nº 02/2024", que foi assinado pela Secretaria de Relações de Trabalho do Ministério da Gestão, pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda, pelo Sindifisco Nacional e pelo Sindireceita (Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários da Receita Federal do Brasil).
"Na negociação, acatou-se a proposta da categoria pela regulamentação do bônus. O reajuste do teto do bônus resultou em um aumento nos ganhos mensais dos Auditores Fiscais, compatível com as atribuições e a complexidade da carreira, e respeitando o limite orçamentário para os reajustes. Com o reajuste, a remuneração pode alcançar R$ 41,26 mil reais, em fevereiro de 2026, para servidores no 'topo' da carreira (vencimento mais bônus)", destacou o MGI.