Há mais de oito meses, em 29 de maio de 2024, parecer entregue ao Iphan pela empresa Solé Associados dizia que havia risco de colapso de partes do Convento de São Francisco em Salvador (BA), o que colocava vidas humanas em risco.
Assinado pela engenheira civil Rosana Muñoz, o documento lista uma série de problemas estrurais na construção que, segundo ela, deveriam ser "remediados com urgência" para que desabamentos fossem evitados.
O convento é anexo à Igreja de São Francisco, em que, na última quarta-feira, houve desabamento de parte do forro do teto. O acidente matou uma jovem e feriu cinco pessoas.
Sediada em Porto Alegre, a Solé foi vencedora, em outubro de 2023, de licitação feita pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional para produzir projetos executivos que permitissem a reforma do complexo religioso.
Outros documentos anexados pela Solé ao processo, disponíveis na página do Iphan, revelam problemas graves nos telhados e 95 pontos com presença de cupins dentro da igreja (em altares, imagens e forro do teto). Uma análise das instalações elétricas detectou problemas graves na fiação e falta de para-raios — um total de 48 situações classificadas como de "risco crítico", quando há ameaça à saúde, vida, meio ambiente ou patrimônio.
O SEI — Sistema Eletrônico de Informações — do Iphan registra que o processo para a realização de obras no complexo de São Francisco começou em agosto de 2021, quando foi foram iniciados os procedimentos para obras no claustro do convento. Os procedimentos para a concorrência só seriam abertos dois anos depois — a escolha da empresa, a Solé, ocorreria em outubro de 2023; o contrato, no valor de R$ 1,218 milhão foi assinado em dezembro, quando houve empenho — reserva — da verba liberada.
Em 31 de maio de 2024, a empresa apresentou quatro mapas de danos, relativos ao subsolo, térreo, primeiro pavimento e cobertura do complexo religioso.
No subsolo foram encontradas rachaduras que indicavam problemas na fundação dos prédios. O laudo recomendava escoramento de áreas e sua interdição até a realização de reformas. Os técnicos verificaram problemas nas lajes, onde havia "processo avançado de corrosão" em suas armaduras.
No pavimento térreo foram detectados, entre outros, apodrecimento no barroteamento — estrutura de sustentação feita em madeira — do piso superior. A presença de infiltração foi verificada em vários pontos. No primeiro andar havia problemas parecidos, como vazamentos e fissuras.
No telhado, os problemas se repetiam em vários pontos: drenagem e calhas insuficientes, telhas desalinhadas, beiras degradados e presença de vegetação de pequeno e de médio porte.
Foi preciso remover o pináculo — estrutura pontiaguda que fica mais alta de uma construção — que havia em uma das torres, já que havia o risco de que caísse.
O relatório que trata do convento é o que trata das situações mais graves. A engenheira ressalta a existência de escoramentos de alvenaria construídos em 2010 para evitar desabamentos.
Relata também danos em colunas originais de sustentação, problemas em diversos barrotes, rachaduras, degradação de vigas. Ela recomenda nove ações emergenciais para que não haja colapso de partes das estruturas.
A análise feita na igreja constatou erros em restaurações anteriores, com uso de tinta ocre em substituição ao revestimento original de ouro em pó, a presença de pregos oxidados e de cupim em praticamente todos os altares, inclusive no principal.
Ontem, o presidente do Iphan, Leandro Grass, confirmou que o órgão recebeu, na segunda-feira, pedido do responsável pelo complexo para que fosse feita uma vistoria no local. Grass, porém, afirmou que o pedido não se caracterizava como urgente, já que o religioso utilizou o serviço de protocolo, quando poderia ter telefonado para o Iphan da Bahia.