Por: Da Redação

ENTREVISTA/Desembargador Antero Arantes Martins, do TRT-2Precedentes vinculantes, segurança jurídica e celeridade

Desembargador Antero Martins: "Aprovação da SUR foi um marco histórico" | Foto: Correio da Manhã

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) publicou um total de 206 precedentes, entre julgados e afetados, em recursos repetitivos até junho de 2025, visando garantir a segurança jurídica e a previsibilidade das decisões judiciais em todo o país, evitando que casos semelhantes sejam julgados de forma diferente.

Além da segurança jurídica e da previsibilidade das decisões, que garante um tratamento mais equitativo para situações semelhantes, os precedentes judiciais trazem maior celeridade para a Justiça Especializada.

O sistema de precedentes vinculantes, entretanto, traz desafios, envolvendo questões relacionadas à mudança cultural, bem como a necessidade de desenvolvimento de ferramentas tecnológicas para a identificação das chamadas demandas repetitivas.

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2) aprovou em novembro de 2024, em sessão extraordinária do Tribunal Pleno e do Órgão Especial, a criação da Seção Especializada em Uniformização da Jurisprudência Regional (SUR) - Subseções I (SUR-I) e II (SUR-II). A medida tem como objetivo padronizar entendimentos jurídicos e tornar os julgamentos mais ágeis e eficientes.

Para o desembargador Antero Arantes Martins, vice-presidente administrativo do TRT-2, relator da proposta, a aprovação da SUR foi um marco histórico. "Nós julgamos melhor quando julgamos menos. A ideia é oferecer um tratamento igualitário aos jurisdicionados, garantindo a mesma solução jurídica para casos semelhantes. Assim, tornamos viável a atuação da Justiça do Trabalho", afirmou.

O Correio da Manhã recebeu o desembargador para uma conversa sobre precedentes vinculantes e outros temas do Judiciário.

Correio da Manhã - desembargador Antero, qual a importância de fomentar a cultura de precedentes?

Desembargador Antero Arantes Martins - É de vital importância fomentar a cultura dos precedentes entre magistrados e advogados. O sistema está fundamentado em dois pilares importantes:

1º) Tratar igualmente os iguais, vale dizer, conflitos idênticos devem ter a mesma solução jurídica;

2º) Segurança jurídica. Sabendo previamente o posicionamento dos Tribunais, as pessoas e empresas moldarão suas condutas sociais e seus negócios com previsibilidade de resultado em caso de conflito.

Para o Poder Judiciário, que faz parte do Estado e, portanto, o tema é de interesse público, também traz inúmeras vantagens, no sentido de reduzir a litigiosidade e a recorribilidade.

Segundo o Relatório-Geral da Justiça do Trabalho de 2024, chegaram 3.599.940 processos novos.

Agora eu queria pedir ajuda de vocês para fazer essa conta. Imaginem só:

No ano de 2024, verificou-se, por cálculo médio, que para cada juiz do Trabalho havia 1.129 processos a serem solucionados, para cada desembargador do Trabalho havia 3.493 e para cada ministro do TST, 40.131.

Esses números são insustentáveis. Com a vinculatividade do precedente, espera-se, advogados não proporão ações e/ou interporão recursos que estão fadados ao insucesso.

CM - O Tribunal Superior do Trabalho publicou até junho de 2025 um total de 206 precedentes, entre julgados e afetados em recursos repetitivos. Como o Tribunal está procedendo para a adaptação aos novos entendimentos?

Desembargador Antero Arantes Martins - O número, de fato, é elevado e assusta tanto magistrados e servidores quanto advogados. Felizmente nossa Escola judicial, a eJud-2, é extremamente competente e tem feito vários cursos e webnários voltados para o primeiro e segundo graus. A solução é a capacitação constante, além do desenvolvimento de IAs específicas, o que também vem sendo realizado pela Justiça do Trabalho, como, por exemplo, o projeto "Galileu".

CM - Apesar de jovem, o senhor tem mais de 30 anos de magistratura e também experiência na advocacia. O entendimento e adaptação aos precedentes também é fundamental ao exercício da advocacia?

Desembargador Antero Arantes Martins - De fato, fui advogado por 4 anos e sou magistrado há mais de 32 anos. Entretanto, sou também professor, usualmente em turmas de pós-graduação e cursos de extensão voltados a advogados. Portanto, esse é meu público.

Tenho dito aos meus alunos que sem o conhecimento do sistema de precedentes em poucos anos não poderão mais advogar. Logo, é uma questão de sobrevivência. Quanto mais rápido aprender, melhor.

O sistema de precedentes muda a lógica do processo e, até mesmo, a lógica da hermenêutica.

CM - Como vice-presidente administrativo do maior Tribunal Regional do Trabalho do país, como o senhor tem impulsionado a atuação do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) como meio de efetiva pacificação social?

Desembargador Antero Arantes Martins - Muito interessante esta pergunta. Tenho trabalhado com a eJud-2 na qualificação de magistrados e servidores com foco na mediação e na conciliação e divulgado nos locais próprios (Ordem dos Advogados do Brasil e Escola Superior da Advocacia) a necessidade de que façam cursos voltados à orientação de advogados sobre essa diferente modalidade de solução de conflitos.

Os números estatísticos já aumentaram este ano, que foi o primeiro de nosso mandato.

Também tivemos um grupo de trabalho específico que, recentemente, apresentou relatório final de formas para melhorar ainda mais a nossa capacidade de atuação.

CM - Quais as perspectivas em relação a SUR?

Desembargador Antero Arantes Martins - A Seção Especializada de Uniformização da Jurisprudência Regional (SUR), nasceu de uma proposta da atual administração com a finalidade de implementar, no âmbito do TRT-2, a cultura dos precedentes.

Entretanto, fomos "atropelados" pela ação do TST (Tribunal Superior do Trabalho) neste ano de 2025 julgando e afetando centenas de temas, o que impede que o Tribunal Regional o faça. Ainda assim, espero que a partir de agora comecemos a suscitar nossos próprios incidentes.

CM - Que mensagem o senhor deixaria aos operadores do Direito quanto à cultura de precedentes?

Desembargador Antero Arantes Martins - As pessoas, em geral, não gostam de sair de suas zonas de conforto. Aquelas ligadas ao Direito ainda mais, pois tendem a ser mais tradicionais. Eu costumo comparar a situação atual com a chegada do Processo Judicial Eletrônico (PJ-e). As pessoas criticavam, não queriam usar. Entretanto, sua implantação era irreversível. "Adapte-se ou não sobreviva". Aqui é a mesma coisa. O sistema de precedentes será implantado de forma irreversível. Será uma nova maneira de julgar e também de advogar. Portanto, procure bons cursos, boas fontes de informação, estude bastante o sistema brasileiro, que é muito diverso do sistema de "common law", embora nele inspirado. Prepare-se para o novo, porque ele já está chegando.