Por: Martha Imenes

De 7,5 milhões de alertas ao Coaf, somente 0,25% viraram relatório

O poder da Faria Lima - principal centro financeiro do país - é real, e reflete na economia | Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Na esteira da megaoperação contra lavagem de dinheiro do crime por meio da economia real, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad determinou que a Receita Federal cobre maior fiscalização das fintechs, neste caso, sobre empresas digitais que fazem movimentação financeira, que agora são equiparadas a instituições financeiras e bancos. No entanto, um outro problema chamou a atenção de especialistas: a falta de assertividade entre os comunicados enviados aos órgãos de controle e a efetiva atuação.

Segundo dados oficiais, o país registrou 7,5 milhões de comunicações ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) em 2024. No entanto, menos de 0,25% das comunicações resultaram em Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs) no último ano. Esses relatórios subsidiam investigações e processos administrativos.

De acordo com Alexander Fürst, diretor-executivo da LPA Soluções Tecnológicas, os números refletem a crescente exigência regulatória e a digitalização financeira, mas também expõem um gargalo: a dificuldade das equipes de compliance em diferenciar o ruído do risco real.

"O desafio não é apenas captar sinais, mas priorizar o que importa e decidir no tempo certo. Alertas são a matéria-prima; a decisão é o que protege a empresa", afirma Fürst, da LPA.

Legislação tributária

Já o advogado tributarista Luís Garcia, sócio do Tax Group e do MLD Advogados Associados, chama atenção para o papel da legislação tributária.

"A legislação tributária, quando aplicada de forma estratégica, é capaz de atingir o coração de organizações que atuam em múltiplas frentes da economia", pontua Garcia.

Para garantir a recuperação do crédito tributário, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional bloqueou mais de R$ 1 bilhão dos investigados.

 

Tempo de resposta precisa ser melhorado

Entre o alerta e a resposta dos órgãos de controle existe uma distância que acaba, por assim dizer, favorecendo ações criminosas.

"Os números mostram que o problema não é a falta de alertas, mas a assertividade desses alertas e o tempo de resposta. Em um ambiente em que crimes financeiros e esquemas de corrupção se sofisticam rapidamente, agir com inteligência e agilidade deixou de ser diferencial: tornou-se questão de sobrevivência para bancos, fintechs e empresas reguladas", afirma Alexander Fürst, da LPA.

O que diz a lei

A Lei 9.613/1998 e a Circular 3.978/2020 do Banco Central obrigam instituições financeiras, fintechs e operadoras de pagamento a monitorar operações atípicas, analisar e comunicar suspeitas ao Coaf. O prazo é de até 45 dias para a análise interna e um dia útil para o envio da comunicação.

Na prática, segundo Alexander Fürst, os analistas enfrentam sistemas engessados, excesso de falsos positivos e sobrecarga de trabalho, fatores que tornam a resposta mais lenta do que a dinâmica dos crimes financeiros.

 

Receita não vai reeditar norma suspensa em janeiro

A Receita Federal nega que vá reeditar a instrução normativa revogada em janeiro por conta de uma onda de fake news - que noticiava uma eventual cobrança de impostos sobre o Pix.

A revogação, na prática, prejudicou a fiscalização das fintechs e, segundo a Receita Federal, ajudou o crime organizado.

"Fintechs têm sido utilizadas para lavagem de dinheiro nas principais operações contra o crime organizado, porque há um vácuo regulamentar, já que elas não têm as mesmas obrigações de transparência e de fornecimento de informações a que se submetem todas as instituições financeiras do Brasil há mais de 20 anos", disse em comunicado.

O órgão afirmou que a norma terá uma redação diferente, "bastante direta e didática, com apenas quatro artigos":

"Não queremos dar margem para uma nova onda de mentiras", afirmou o Fisco.

A Receita voltará a exigir que as fintechs apresentem a declaração e-Financeira, documento com movimentações de alto valor.

Detalhes

Segundo a Receita, os quatro artigos serão os seguintes:

* O primeiro artigo deixará claro o intuito de combater a prática de crime;

* O segundo artigo afirmará, de maneira clara e direta, que as instituições de pagamento e de arranjos de pagamento (fintechs) sujeitam-se exatamente às mesmas obrigações das instituições financeiras tradicionais (apresentação da declaração e-Financeira);

* Os artigos terceiro e quarto são instrumentais, apenas referindo-se à regulamentação e à vigência a partir da publicação.