Página 82: "(…) a grande massa de um povo sempre só se deixa empolgar pelo poder da palavra", e na 90. "(…) não dispersar a atenção de um povo, e sim em concentrá-la contra um único adversário". Empolgar, o mesmo de entusiasmar, que significa "estado de exaltação do espírito" contra o oponente. O autor dessas palavras não crê apenas na força bruta. Escreve na 128: "O emprego exclusivo da violência, sem o estímulo de um ideal preestabelecido, não pode jamais conduzir à destruição de uma ideia ou evitar a sua propagação (…)". A violência bruta e o ideal preestabelecido, portanto, representam a ambiguidade do líder político, pois "toda tentativa de combater pelas armas um princípio universal têm de ser mal sucedida, enquanto a luta não tomar rigorosamente forma de ofensiva por novas ideias", página 129. Quem escreveu essas páginas chegou ao poder absoluto em razão de seu rosto-palavra, que representa o paradoxo, que dizer, ele, ao mesmo tempo, "é-e-não-é".
A palavra "violência" origina-se da raiz "vis", que significa "força", e esse líder fez uso da força bruta do corpo [com armas] e da força leve do espírito [com discursos], duas forças contrárias. Chegar ao poder passou, então, pelo caminho do meio, pelo caminho da ambiguidade, marca muito intensa da política de extrema direita.
Autor de único livro, ele deixa evidente que a força bruta por si mesma não é a saída para dominar, devendo ser dividida com a força do espírito, isto é, o discurso, o mesmo discurso que inventa o inimigo, e, contra o inimigo, o líder político projeta a imagem de ideais patrióticos. Quando lemos Introdução às linguagens totalitárias, aprendemos com Jean-Pierre Faye que essas linguagens, que não expressam a força bruta, são práticas entre verdadeiro-e-não-verdadeiro, como lemos na página 42. Nesse agenciamento-livro, o Estado Total tem data de nascimento e autor: 1931 e Carl Schmitt, jurista, filósofo e político alemão conhecido por sua teoria da soberania, em que o poder político não é apenas quem aplica as leis, mas quem pode suspendê-las em nome da ordem. Ora, suspender a lei é suspender a própria ordem em nome da ordem. Jogo. Assim, entre ordem-e-desordem, o nome desse paradoxo é estado de exceção.
A extrema direita necessita da força bruta e ela a motiva com seu discurso que cria o inimigo para afirmar seu moralismo patriótico. Até chegar ao poder, o líder político atravessa o entre opostos, e ele sabia disso, o autor de páginas acima: Hitler.