Afirmar que não existe luta de classe iguala-se a dizer que Deus não existe. Eu profano a palavra de Karl Marx, devendo ser queimado em praça pública pelo proletariado.
Quando lemos O Manifesto do Partido Comunista, logo no início escreve-se que "(…), em constante oposição, têm vivido numa guerra ininterrupta, ora aberta, ora disfarçada (…)". Marx não detalha essa luta "disfarçada"; porém, se é disfarçada, o significado óbvio de disfarçar é a luta de classe estar "ocultada".
Ninguém vê a luta, mas ela está lá, onde? se é luta, é corpo a corpo? mas como pode luta assim ser disfarçada? Nas páginas de "O 18 brumário de Luís Bonaparte", Marx registra a luta aberta do proletariado revolucionário nas ruas contra o aparato militar da capital francesa. Muitos morreram. Os revolucionários perderam no "combate-contra". Perderam no confronto direto. Na luta de classe aberta, o proletariado sofreu a mortal derrota contra.
Nas ruas da Paris de 1848, não houve disfarce em algum lugar? a luta de classe só foi aberta? houve proletariado revolucionário disfarçado? houve burguês lutando com disfarce? mas onde estava a luta de classe disfarçada em "O 18 brumário"? houve disfarce?
Quando dizemos "luta de classe disfarçada [ou não aberta]", dizemos que a luta é diferente do que ela é, ou seja, a luta é a não luta. Então, se a luta de classe se disfarça de não luta de classe, é porque se oculta na própria aparência que nega o confronto, o conflito, em outros termos, o que aparenta ser a não luta de classe já é a luta de classe. Assim, se a luta de classe existe como não luta, ela não existe, existindo. Trata-se, portanto, de paradoxo.
Em "O 18 brumário", Marx escreve muitos paradoxos, sendo um deles o poder de Luís Bonaparte, o bufão. Seu poder motiva o riso por estar com máscara e fantasia? Claro que não, Luís Bonaparte se disfarça com a imagem do próprio rosto e, por causa desse disfarce em estado natural, ele engana, possibilitando uma luta de classe sem oposição em virtude de ser disfarçada.
Se o rosto de Luís Bonaparte é político e o do proletário revolucionário é não político, é porque este só deseja afirmar o "combate-contra", que se torna inútil ou infecundo numa guerra em que a luta de classe é disfarçada, repito, em que a luta de classe não existe. A verdade do revolucionário nunca seduziu, mas a farsa do bufão ainda seduz, visto que a mentira, sendo rosto, é uma riqueza, supõe posses, verdades, formas de substituição.