Por: Rodrigo Fonseca - Especial para o Correio da Manhã

Balõezinhos para Hellboy, o diabo de bom coração

Hellboy assegura seu lugar nas bancas e livrarias para as compras de Natal | Foto: Divulgação

Editora Mythos renova a força do personagem no mercado de quadrinhos e amplia o culto a seu criador, Mike Mignola, com antologias e almanaque de tramas do herói

Logo que se digita https://www.lojamythos.com.br/ atrás de novidades de uma das maiores editoras de HQs do país, um reclame com Hellboy toma a tela: "Toda a linha do vermelho com 30% de desconto em outubro", diz o anúncio. Logo que o cursor avança pelo buscador do site da Mythos, depara-se com "Contos Bizarros" à venda. Ele é apenas um dos destaques de uma linhagem de narrativas nas raias do terror, que assumiu uma cria do Inferno, de coração puro, como super-herói. Seu sucesso, já transportado para o cinema, catapultou Mike Mignola, seu criador, para o Panteão mundial dos quadrinistas. Sua fama se amplia com a chegada ao país de uma nova linha de historietas de seu diabo quando menino.

Esse material, editado aqui com o título "As Aventuras do Jovem Hellboy", pode formar uma nova linhagem leitura e, de quebra, expandir o séquito de adoradoras de Mignola.

"Fiz uma contagem recente e acredito que já passamos dos 50 títulos de Hellboy no total, mas, se falarmos especificamente dos Omnibus — aquelas edições de luxo, compiladas em ordem cronológica —, estamos chegando à marca de 25 ou 26 volumes desse formato. É a forma ideal para o leitor acompanhar toda a jornada do Mignolaverso do começo ao fim", explica o livreiro Higor Lopes, zelador de um portal para a felicidade de todo e qualquer nerd chamado Mundo Mythos, uma loja recheada com o material da editora paulista.

Quem entra lá se perde entre revistas mensais do caubói Tex e do detetive do Além Dylan Dog e entre almanaques de origem inglesa do Juiz Dredd. O espaço de Hellboy naquele empório cresce mês a mês, assim como o entusiasmo de Higor, que é uma enciclopédia quadrinhófila viva, com boas promessas para o fim de ano. "Vamos trazer reimpressões muito pedidas. Hellboy Vol. 1 estava esgotado há dois anos, e os volumes 2 e 4 esgotaram este ano. Então, neste Natal, teremos a coleção principal completa novamente disponível, o que é perfeito para quem quer começar ou continuar a saga. Neste momento, estamos lançando os quatro primeiros volumes da série principal "Hellboy": o 1, 2, 3 e 4. Já estamos nos preparando para o mês que vem relançar "Histórias Curtas 1", que estava esgotado, e ainda temos "Histórias Curtas 2" em estoque. Essas histórias menores foram usadas pelo Mike Mignola para desenvolver o conceito do personagem. Além disso, também vamos lançar "B.P.R.D.: Praga dos Sapos" (a sigla quer dizer Bureau de Pesquisa e Defesa Paranormal), marcando o momento em que Hellboy deixa essa agência e a equipe precisa seguir sua trilha pessoal sozinho", explica Higor.

Definido por alguns como "mistura de expressionismo alemão com Jack Kirby" (em referência ao quadrinista de traços quadrangulares famoso por sua parceria com Stan Lee) e por outros como um "cubista pós-moderno", Mignola virou um dos artistas gráficos de maior prestígio na indústria de HQs - em âmbito global - sendo estudado também no ambiente acadêmico. Sua forma de contorcer a anatomia humana e a animal (ou mesmo a de monstros) quebra com as convenções helênicas do desenho, estabelecidas como marca de excelência nos quadrinhos por Alex Raymond ("Flash Gordon") e Hal Foster ("Príncipe Valente"). Seu jeito de desenhar estilizou-se e virou grife a partir do êxito de "Gotham 1889", graphic novel lançada em 1989, na qual o Batman enfrenta Jack o Estripador no século XIX.

Anteriormente a essa fase de bonança, o que lhe sobrava era a função de ilustrar capas na Marvel (na revistinha da Tropa Alfa) e na própria DC, onde cuidava do Vingador Fantasma. Foi nas páginas desse personagem, um ocultista, que Mignola se aproximou do universo no qual construiu sua fama: o horror.

A tentação de poder criar um mundo capaz de aproximar as narrativas heroicas de premissas demoníacas e fantasmagóricas levou o ilustrador e roteirista a lançar, em 1993, a figura de Hellboy, cria do Inferno dedicada a proteger os seres humanos da entropia, graças à empatia que nutre pelas diferenças (de raça, de credo, de gênero). Alegoria mais política do que essa, no turbilhão cultural da década de 1990, não poderia acontecer.

"O diferencial de Mignola é o afinco e o carinho que ele tem com o próprio universo", explica Higor. "Ele faz uma pesquisa profunda e constrói personagens com personalidades muito bem definidas. Você ama ou odeia suas criações, mas não consegue ignorá-las. Além disso, ele é mestre em trabalhar com cronologias e amarrar todas as pontas soltas. Tudo se conecta de forma orgânica", completa o livreiro.