Por: Affonso Nunes

Dois bicudos podem se beijar sim, e de novo

Alfredo Del-Penho e Pedro Paulo Malta nos bastidores da gravação do álbum no estúdio da Biscoito Fino | Foto: Isabela Espíndola/Divulgação

Alfredo Del-Penho e Pedro Paulo Malta retomam casamento musical em álbum que dá sequência ao celebrado 'Dois Bicudos', lançado há 21 anos

 

Vinte e um anos após "Dois Bicudos", Alfredo Del-Penho e Pedro Paulo Malta retomam a parceria que em 2004 rendeu um dos discos de samba mais celebrados da época — indicado ao Prêmio da Música Brasileira e eleito entre os dez melhores do ano pelo jornal O Globo. "Bicudos Dois", que chega às plataformas digitais nesta quinta-feira (11) pelo selo Biscoito Fino, atualiza a tradição das duplas vocais no samba brasileiro. O Correio da Manhã ouviu esta delícia de álbum de repertório sofisticado (e por vezes) desconhecido do grande público antes de seu lançamento oficial.

A estrada trajetória que conduziu os dois artistas a esse reencontro começou nas rodas de samba cariocas do início dos anos 2000. Pedro Paulo Malta, jornalista formado pela PUC-Rio e neto da pianista e cantora Gylce Porto — que integrou o elenco da Rádio Nacional entre 1937 e 1938 —, iniciou sua carreira como cantor em 1996, frequentando as rodas do Bip Bip em Copacabana e, posteriormente, do Bar Semente na Lapa. Alfredo Del-Penho, nascido em Cambuci (RJ) e radicado em Niterói, teve seu primeiro contato com o choro em 1998 e começou como integrante do Grupo Unha de Gato. Ambos se destacaram como pesquisadores da música popular brasileira, atuando em projetos de restauração de acervos históricos e colaborando com artistas consagrados.

O primeiro encontro artístico da dupla aconteceu a convite do produtor Maurício Carrilho para o álbum "Dois Bicudos", lançado em 2004 pelo selo Quelé, parceria da Acari Records com a Biscoito Fino. O disco, que reuniu canções inéditas de compositores como Nelson Cavaquinho, Cartola e Geraldo Pereira, consolidou a linguagem do dueto vocal no samba moderno e projetou nacionalmente os dois intérpretes. Desde então, ambos seguiram carreiras solo expressivas: Del-Penho lançou álbuns como "Samba Sujo" — que lhe rendeu o prêmio de Melhor Cantor de Samba no Prêmio da Música Brasileira de 2016 — e atuou em musicais como "Ópera do Malandro" e "Noel Rosa: Coisa Nossa". Malta integrou espetáculos como "Sassaricando" e "É com esse que eu vou", além de atuar como pesquisador e consultor para o Novo Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro.

Com direção musical e arranjos de Paulo Aragão, "Bicudos Dois" une os ótimos timbres de Dal-Penho e Malta numa releitura divertida do universo das grandes duplas do rádio das décadas de 1930 e 1940 — Francisco Alves e Mário Reis, Joel e Gaúcho, Ciro Monteiro e Dilermando Pinheiro — e presta tributo a compositores como Noel Rosa, Wilson Baptista, Lamartine Babo e Ismael Silva, Dorival Caymmi e Chico Buarque. O repertório combina canções inéditas com pérolas esquecidas como "O Que Eu Vier Eu Traço" (Alvaiade/Zé Maria), "Seja Breve (Noel Rosa), a "Marcha do Canto do Rio" (Lamartine Babo) e a atualíssima "Falso Patriota" (Geraldo Pereira), equilibrando humor, lirismo e crônicas do cotidiano em interpretações que nos aproximam do passado através de uma escuta renovada e necessária.