Por: Affonso Nunes

Mayra Andrade de volta àsorigens

Mayra Andrade segue os passos da saudosa Cesária Évora, que levou os sons de Cabo Verde ao mundo | Foto: Divulgação

Cantora cabo-verdiana traz ao Brasil turnê em que revisita seu repertório em formato voz e violão

Há quase vinte anos, uma adolescente de 15 anos dava seus primeiros passos na cena musical de Praia, capital de Cabo Verde, armada apenas com sua voz e um violão. Duas décadas depois, Mayra Andrade retorna a esse formato para celebrar um ciclo que atravessa cinco álbuns de estúdio, turnês internacionais e o reconhecimento como uma das vozes mais singulares da música cabo-verdiana contemporânea, seguindo os caminhos abertos pela lendária Cesária Évora (1941-2011). O projeto "reEncanto", que a cantora e compositora apresenta no Vivo Rio neste domingo (7) é um mergulho nas raízes de seu processo criativo.

Nascida em Havana em 1985, filha de diplomatas cabo-verdianos, Mayra cresceu no exterior mas foi na música tradicional de seu arquipélago natal que encontrou sua identidade artística. Desde o álbum de estreia "Navega", lançado em 2006, quando tinha apenas 21 anos, a cantora construiu uma discografia que dialoga com a tradição musical cabo-verdiana sem abrir mão de influências do jazz, do pop e de sonoridades contemporâneas. Passaram-se "Stória, Stória..." (2009), "Lovely Difficult" (2013) e "Manga" (2019), cada um deles expandindo as fronteiras de sua música com arranjos elaborados e colaborações com artistas de várias nacionalidades.

Foi durante a turnê de divulgação de "Manga", em 2022, que Mayra sentiu a necessidade de voltar ao ponto de partida. Acompanhada apenas pelo compatriota Djodje Almeida, ela começou a revisitar seu repertório no formato que sempre marcou o início de suas composições: a voz, o violão e pequenas percussões, onde as notas dedilhadas, arranhadas ou percutidas recebem as emoções e as palavras antes que qualquer arranjo ou produção de estúdio entre em cena. A ideia ganhou corpo e se transformou em "reEncanto", projeto que marca tanto o fim quanto o início de um ciclo pessoal e artístico para a cantora, que havia acabado de se tornar mãe.

"Com essa nova vida que nasceu, surgiu a necessidade de redescobrir minha própria voz, meu canto, nessas canções criadas há tantos anos. O projeto Reencanto criou um espaço onde pude revisitar meu repertório e compartilhar as histórias que inspiraram essas músicas", conta Mayra. A maternidade trouxe uma nova camada de significado para canções compostas ao longo de quase duas décadas, e o formato intimista permitiu que esse reencontro acontecesse sem intermediários, criando uma conversa direta com o público. No repertório, ela atravessa toda sua discografia, desde "Navega" até "Manga", revisitando faixas que ganharam novos significados ao longo dos anos.

Os primeiros quatro shows neste formato aconteceram em Portugal em 2022, seguidos por cerca de 15 apresentações pela Europa em 2023. A resposta da plateia surpreendeu a própria artista. "Algo muito particular acontecia entre o palco e o público. Era como uma viagem extremamente profunda e comovente. Foi então que percebi que havia algo maior ali, e que era preciso deixar um registro dessa troca", explica. Esse registro veio em forma de álbum ao vivo, gravado em novembro de 2023 na Union Chapel, uma capela neogótica em Londres, e lançado em outubro de 2024. O disco captura a dimensão de luz e sombra que marca as apresentações.

A parceria com Djodje Almeida, músico que Mayra conheceu durante sua participação em uma peça de dança contemporânea, revelou-se fundamental para a alquimia do projeto. "Djodje é um músico também cabo-verdiano, dotado de grande talento e humildade. Seu conhecimento versátil da música tradicional de Cabo Verde e de outros gêneros nos permitiu uma grande liberdade musical e uma verdadeira alquimia", destaca a cantora.

Em 2024, o projeto percorreu Cabo Verde, Estados Unidos, Brasil e Europa, somando mais de vinte apresentações. A turnê brasileira de 2025 passou por Brasília, São Paulo e Curitiba antes de chegar ao Rio, sempre com recepção calorosa de um público que acompanha a trajetória de Mayra desde seus primeiros discos. O Brasil, aliás, tornou-se território importante na carreira da artista, que encontra no país uma audiência receptiva às conexões entre a música cabo-verdiana e as experiências culturais brasileiras.

SERVIÇO

MAYRA ANDRADE - REENCANTO

Vivo Rio (Av. Infante Dom Henrique, 85, Parque do Flamengo)

7/12, às 21h

Ingressos a partir de R$ 160 e R$ 80 (meia)