A turnê "Pai e Filho", que estreou em 10 outubro e segue para os Estados Unidos no início de 2026, nasceu de uma aproximação inesperada durante a pandemia. A família inteira foi para o Pantanal, morar na fazenda de Almir na Serra de Maracaju (MS). Logo viria o convite para que pai e filho participassem do remake de "Pantanal", a ser filmado por ali. Foi o começo de uma aproximação maior que, surpreendentemente, nunca havia se traduzido em trabalho conjunto.
No remake de 2022, Gabriel assumiu o papel que foi de seu pai na versão original, dando vida ao misterioso violeiro Xeréu Trindade, enquanto Almir interpretou o chalaneiro Eugênio. Os dois artistas tiveram cenas juntas na novela, incluindo um famoso duelo de violas que exigiu um mês inteiro de ensaios diários. Para Gabriel, "Pantanal" foi "o projeto com que mais sonhei, o que mais quis nessa vida". Ele conta que quando soube do remake, começou a fazer orações diárias sonhando em fazer o teste para o papel. "'Pantanal' foi um divisor de águas na minha carreira, assim como foi na dele, mais de 30 anos. E foi uma situação muito feliz, porque nos aproximou ainda mais", celebra.
Nascido em Campo Grande (MS), Almir Sater consolidou-se ao longo de mais de 40 anos de carreira como um dos maiores ícones da música regional brasileira. Violeiro virtuoso, cantor de voz inconfundível e ator reconhecido nacionalmente, sempre levou ao público os valores da simplicidade, da vida em comunhão profunda com a natureza e da sabedoria ancestral pantaneira com canções que evocam rios caudalosos, estradas de terra batida, boiadas sob o sol escaldante e causos contados ao pé da fogueira, elementos de uma cultura que ele ajudou a tirar do lugar comum do folclore para colocá-la no centro da MPB. Com mais de 20 discos lançados, Almir recebeu o Grammy Latino de Melhor Álbum de Música de Raízes em Língua Portuguesa por "Ar", de 2016, gravado em parceria com Renato Teixeira.
Mas foi "Pantanal", em 1990, que ampliou definitivamente sua fama. Ao interpretar o peão violeiro Trindade na produção original da extinta TV Manchete, Almir viu sua viola caipira e seu rosto se tornarem quase símbolos daquilo que o interior brasileiro tem de mais típico, acolhedor e amado.
Logo após a novela, Almir comporia com Renato Teixeira "Tocando em frente", canção eleita recentemente por júri especializado como a 72ª maior música brasileira dos últimos cem anos. "O mérito é todo do Renato, porque o que faz sucesso é a letra. Acho que a música embrulha, embala, mas a letra é que fixa". Ele lembra que bastou cantar duas estrofes ao telefone para Maria Bethânia decidir gravá-la. "A Betânia gravou ela maravilhosamente bem, definiu a música, mas não fez com ela o sucesso que a música e que a Bethânia mereciam. Assim, todo mundo que gravava ia reforçando a música, e hoje em dia ela se firmou", acredita.
Gabriel Sater, aos 43 anos, representa a geração que reconecta essa tradição ao presente. Cantor, compositor versátil, instrumentista virtuoso, produtor musical e ator premiado, Gabriel não apenas herdou o sobrenome ilustre, mas também o talento musical e o carisma do pai. Sua inspiração vem da convivência desde a infância com uma família absolutamente musical. Em 2023, completou 23 anos de carreira, com seis CDs lançados, e recebeu uma indicação ao Grammy Latino na categoria Melhor Álbum de Raiz em Língua Portuguesa. Ele não substitui a raiz plantada pelo pai, ele a amplia, traduzindo para um público mais jovem aquilo que, há décadas, Almir vem preservando com dedicação obstinada. "Cresci como aquele filho fã mesmo, nos shows dele eu me arrepiava com aqueles solos de viola", confessa Gabriel, que define o pai como "essa referência lendária em casa, que realmente mudou minha humilde vida".
Questionado sobre seu papel na preservação das raízes musicais brasileiras, Almir é direto: "Olha, eu faço isso tudo por amor, por gosto, eu gosto disso. É igual a quando me perguntam: 'por que que você mora no mato?' Porque eu gosto. Por que eu toco viola? Porque da primeira vez que eu escutei uma viola, com aquele som meio de sitar, meio mântrico, eu adorei. Não quero defender nenhuma bandeira, nada disso. É só prazer. Acho que, na música, o prazer vem na frente", sintetiza o violeiro de 68 anos que segue tocando por paixão genuína, não por missão imposta.
SERVIÇO
ALMIR e GABRIEL SATER
Qualistage (Avenida Ayrton Senna, 3000 - Barra da Tijuca)
28/11, às 21h30
Ingressos a partir de R$ 90