Três décadas depois de iniciar sua trajetória musical, o gaitista Rodrigo Eberienos lança o ótimo "New Old Stock", álbum que mostra a força e vitalidade do blues. Referência em sua intrumento, Eberienos entrega releituras com pegada fusion de clássicos do gênero que cativa o ouvinte desde a primeira faixa, uma expolosiva versão de Rollin' and Tumblin', um standard de autor desconhecido e gravado originalmente em 1929 por Hambone Willie Newbern.
A trajetória de Eberienos justifica seu ecletismo. O músico acumula participações em trilhas sonoras televisivas e colaborações com artistas de diferentes gerações e estilos como Sandy & Júnior, Zezé di Camargo e Luciano, Blues Etílicos, Nasi, Jerry Adriani e Nanda Moura. Sua versatilidade permitiu que transitasse com naturalidade entre blues, soul, rock e MPB, estabelecendo-se como um instrumentista capaz de dialogar com diferentes linguagens musicais.
"Eu sempre trabalhei com gravações pra TV, CDs, jingles e aprendi a tocar pros outros", conta Eberienos, creditando parte de sua evolução técnica e artística à qualidade de suas influências. "Minhas referências sempre foram muito boas e aprendi ouvindo os melhores", acrescenta o músico, que dividiu palcos com gaitistas estrangeiros renomados como António Serrano, Brendan Power, Mark Ford, além do mestre Maurício Einhorn, decano brasileiro do instrumento.
Essa base sólida de referências transparece agora em "New Old Stock", onde essa experiência acumulada converge para um projeto autoral maduro, ainda que estejamos diante de álbum de versões. São ao todo dez faixas que equilibram tradição e inovação no universo do blues. O Além da citada "Rollin and Tumblin", Eberienos repagina clássicos como "Same Old Blues" (J.J. Cole), "Look Over Yonder's Wall" (James "Beale Street" Clarke), "John the Revelator" (Blind Willie Johnson) e uma tocante releitura de "What a Wonderful World" (Bob Thiele e George David Weiss), eternizada por Louis Armstrong - temas que atravessaram décadas e até hoje mobilizam plateias. Convém destacar a "Rumba for My Little Boy", única composição autoral do álbum, dedicada ao filho do músico. Trata-se de uma explosão de latinidade que flerta com o zydeko e ainda faz citações a dois temas emblemáticos da nossa canção popular: "Aquarela do Brasil" (Ary Barroso) e "Brasileirinho" (Waldir Azevedo).
A diversidade do repertório reflete a preocupação de Eberienos em ampliar o alcance de sua música. "Fiz esse disco não apenas para gaitistas e sim para todos ouvirem e curtirem. É bem eclético", explica. "Recebi diversos comentários nos quais todos curtem o disco, mas cada um tem uma música de preferência. Todas diferentes".
A produção ficou a cargo de Marco Lacerda, com co-produção do próprio Eberienos, numa parceria que buscou capturar a essência do blues clássico sem abrir mão de elementos sonoros contemporâneos. O resultado agrada puristas do gênero e ouvintes menos familiarizados com o repertório tradicional do blues.
O trabalho conta com uma constelação de participações especiais Nanda Moura, Igor Prado, Álamo Leal, Brugger, Sonja, Mauricio Sahady, Hank Shreve, Marco Lacerda e Bob Arau emprestam suas vozes e instrumentos ao projeto, criando paisagens sonoras diversificadas, porém coesas. A banda base não fica atrás ao reunir craques da cena blues brasileira como o guitarrista Otavio Rocha, os baixistas Cesar Lago e Raphael Castro, os bateristas Beto Werther e Edu Coimbra e os tecladistas Zezo Olímpio e Pedro Augusto.
Os arranjos de "New Old Stock" propõem um mergulho emocional nas raízes do blues, trazendo sua essência para os dias de hoje. Recomendo sua audição no mais alto volume possível, a fim de perceber suas distintas camadas sonoras. Ao longo das faixas, Eberienos mostra generosidade ao dividir seu brilho com os integrantes da banda base e os convidados.
Numa mescla de reverência e ousadia, "New Old Stock" celebra a história e o futuro do blues.