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Ao vivo, com alma e nunca sozinho

Em seus trabalhos solo, Nasi envereda pelas sonoridades do soul e do blues, delimitando uma fronteira bem definida em relação ao seu trabalho junto ao Ira! | Foto: Ana Karina Zaratin/Divulgação e Divulgação

Por Affonso Nunes

Após três singles lançados ao longo do ano passado, Nasi apresenta ao público o álbum "Solo Ma Non Troppo", registro ao vivo do show que marcou a estreia do disco "Rock Soul Blues". Gravado em abril de 2024 no Teatro Raul Cortêz, em São Paulo, o novo trabalho já está disponível em todas as plataformas digitais, com distribuição da Ditto Music.

O título — em italiano, "sozinho, mas não tanto" — reflete a proposta do projeto: um álbum solo no nome, mas coletivo na execução, com participações especiais e homenagens sonoras a artistas que moldaram a trajetória de Nasi. O repertório reúne as oito faixas de "Rock Soul Blues", disco lançado em 2024, formado por composições próprias e versões de músicas de ídolos pessoais do cantor, como Zé Rodrix, Tim Maia, Erasmo Carlos, Jerry Lee Lewis e Martinho da Vila.

Além de sua presença no Ira!, banda que o consagrou como um dos nomes centrais do rock nacional, Nasi tem mantido uma produção solo constante e autoral bastante diversificada. "Solo Ma Non Troppo" é seu nono álbum solo e evidencia a continuidade de uma carreira paralela que nunca se acomodou. Ao lado de músicos experientes, o cantor constrói paisagens sonoras emolduradas numa mescla de soul, blues e rock com referências brasileiras e estadunidenses, estabelecendo uma fronteira distinta em relação ao seu trabalho com a banda.

O disco traz também outras faixas de sua carreira solo, como "Perigoso", "Poeira nos Olhos", "O Rei da Cocada Preta" e "Feedback", esta última relançada como um dos singles que antecederam a chegada do novo álbum. Composta em parceria com Johnny Boy, a música tem pegada de hard soul com arranjos que remetem ao fim dos anos 1960 — uma sonoridade que tem guiado boa parte das escolhas estéticas do artista nesta fase recente.

O show contou com a presença de três convidados que imprimiram ainda mais identidade à apresentação: Nanda Moura, cantora e guitarrista reconhecida no circuito do blues nacional; Denilson Martins, saxofonista paulistano com sólida trajetória no jazz e na música instrumental; e Jeff Berg, guitarrista, produtor e engenheiro musical de Nasi — também colaborador recorrente do Ira!.

A performance registrada ao vivo aposta menos na fidelidade técnica e mais na vibração crua de palco. Em "Feitiço na Rua 23", uma das faixas mais emblemáticas do novo repertório, a famoso timbre rouco de Nasi surge endiabrada seguida por uma guitarra sinuosa e uma linha de baixo pulsante sem perder o compasso. Já em "Aqui Não É o Meu Lugar", a melodia acelera ao ritmo do Hammond e de guitarras distorcidas. "É importante saber a hora / Deixar pra trás as cinzas do passado", canta Nasi.

A celebração do cantor com seu público termina com uma execução soul-blueseira para "Dias de Luta", um dos hinos do Ira!, gravado originalmente no álbum "Vivendo e Não Aprendendo" (1986). "Se hoje canto essa canção / O que cantarei depois", reforça o coro da plateia.

Com uma trajetória que começou nos anos 1980, ao lado de Edgard Scandurra, Nasi tornou-se uma figura icônica do rock brasileiro não apenas por sua voz rouca e presença de palco, mas por manter, ao longo dos anos, um repertório que sempre dialogou com a política, a poesia urbana e as sonoridades afro-americanas.