A história do rock brasileiro é atravessada por figuras que definiram épocas. Nos anos 1980, nomes como Renato Russo, Cazuza e Rita Lee simbolizaram gerações, cada um a seu estilo. Já nos primeiros anos do século 21, surgia com força Alexandre Magno Abrão, que o país conheceria como Chorão — apelido de infância, nascido da sua sensibilidade à flor da pele. Se estivesse vivo, o líder do Charlie Brown Jr. completaria 55 anos neste mês de abril.
O Charlie Brown Jr. quebrou barreiras: foi uma das primeiras bandas de rock a liderar rankings nacionais de rádio e vender mais de 100 mil discos. A mistura sonora da banda, com elementos de rock, reggae, rap, punk e surf music, resultou em hinos como "Proibida pra Mim (Grazon)", "Ela Vai Voltar", "Dias de Luta, Dias de Glória", "Lugar ao Sol" e "Zoio de Lula". Esse repertório fez de Chorão mais que um frontman — um símbolo de uma juventude em busca de sentido e espaço.
Foi em 1997 que ele e a Charlie Brown Jr. estrearam com "Transpiração Contínua Prolongada", obra que inaugurou uma nova página no rock nacional e deu voz a uma juventude plural, conectada tanto ao skate quanto às inquietações das ruas, do litoral ao sertão.
Compositor compulsivo, Chorão escrevia como quem sangra. Expunha sem filtros suas dores e paixões. Suas letras, quase sempre diretas, tratavam de conflitos pessoais, tensões sociais, paixões tumultuadas e paisagens da vida urbana. A plateia se reconhecia na franqueza de cada verso, cantados com intensidade visceral.
Fosse ao falar de amores perdidos ou da vida noturna, de angústias periféricas ou sonhos de liberdade, Chorão evitava floreios. Preferia a verdade nua, dita com emoção e crueza. Essa entrega tocava diretamente em quem o ouvisse.
Pessoas próximas relatam que ele era de extremos — afetuoso ou explosivo, sem meias-palavras. Chorão não tentava agradar; mostrava-se inteiro, humano e imperfeito. E é justamente essa franqueza que ainda cativa tantos fãs. Sem medo de se expor, assumia seus erros, seus vícios e suas contradições. Suas entrevistas eram imprevisíveis, muitas vezes marcadas por declarações que revelavam o artista como ele era: um anti-herói, complexo, mas de uma autenticidade difícil de ignorar.
A música do Charlie Brown Jr. não era feita para as elites. Era feita para quem andava de skate, surfava, vivia nas quebradas e nas calçadas. Chorão se tornou porta-voz de uma juventude invisibilizada e ajudou a colocar sua cultura na vitrine da mídia.
Era comum vê-lo dividindo o palco com fãs, ajudando amigos, e, ao mesmo tempo, se envolvendo em conflitos públicos. Essa tensão entre generosidade e fúria só reforçava a impressão de que ele era real. Muitos o enxergavam como uma espécie de irmão mais velho, alguém que dizia o que precisava ser dito.
A estética street que Chorão e a banda carregavam virou tendência. Bonés, tênis, bermudas largas e camisetas fizeram escola. Fora da música, o vocalista investiu em marcas próprias, como DO.CE e La Plata. Após sua morte, foi homenageado por grifes populares, incluindo C&A, QIX e Hering.
A história de Chorão já foi contada em teses, livros, filmes e séries. Seus versos continuam ecoando em playlists, documentários, especiais de TV, podcasts e homenagens de artistas como Marcelo D2, Emicida, Filipe Ret e Criolo.
Chorão morreu em março de 2013, deixando à mostra os efeitos de uma vida marcada por fama, fragilidade emocional e dependência química. Mesmo assim, sua voz ainda é ouvida — entre guitarras distorcidas e batidas aceleradas — como símbolo de resistência e identidade para quem cresceu ao som de sua rebeldia.