Por: Paulo Roberto Andel | Especial para o Correio da Manhã

Mauro Santa Cecília, um poeta abençoado

Mauro Santa Cecília, além de letrista gravado por garndes nomes da MPB, era poeta e romancista | Foto: Reprodução Facebook

Santa Cecília é a padroeira da música e dos músicos. É também um sobrenome belíssimo. A ligação direta faz todo sentido: Mauro Santa Cecília já estava destinado desde o começo a se encontrar com a música, e quando isso aconteceu ela se tornou popular a milhões de brasileiros. Todo mundo já ouviu um grande sucesso da música brasileira que nasceu de um poema de Mauro: "Por Você" com seus versos "eu dançaria tango no teto/ Eu limparia os trilhos do metrô/ Eu iria a pé do Rio a Salvador/ Eu aceitaria/ A vida como ela é/ Viajaria a prazo pro inferno/ Eu tomaria banho gelado no inverno" - um clássico gravado pelo Barão Vermelho.

E outros grandes artistas brasileiros gravaram o poeta, morto no último fim de semana, após lutar por incessantes sete anos contra dois cânceres, numa lista plural que vai de Ney Matogrosso a Humberto Effe, passando por Sandy & Junior, Biquíni Cavadão, Rodrigo Santos, Hyldon, Wilson Sideral e outros peso-pesados do pop rock nacional. E, claro, emplacou "Amor pra Recomeçar" com Roberto Frejat, seu colega de escola, numa canção que fez tanto sucesso e é tão cantada nos shows quanto outras que Frejat dividiu com outro mestre da poesia: Cazuza.

Agregador, Mauro sempre foi homem de parcerias, inclusive em livros. "Baião de 2" ele escreveu a quatro mãos com Leoni, outra fera do pop rock brasileiro. Fez um sem-número de colaborações tanto na vertente poética quanto na letra de música, que ele fazia questão de valorizar as importâncias mas delineando as diferenças: nem todo poema dá uma excelente letra e vice-verso.

Pluralidade na vida: advogado que ignorou a profissão, mestre em Letras que foi reprovado em Português num concurso (para todos pensarmos…), Mauro já era um poeta brilhante mas sua vida artística demorou a emplacar, mesmo já sendo publicado e vencido o Prêmio Literário Stanislaw Ponte Preta, da Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro.

Entre 1994 e 1997 foi redator e analista político do Consulado do Japão, submetido ao horário rígido típico dos costumes nipônicos. No primeiro dia útil de 1998, tomou coragem e fez o que pouquíssimos fazem: pediu demissão para viver de escrever. Meses depois, o Brasil inteiro cantava "Por Você" e Mauro acertou em cheio.

Além das canções inesquecíveis, múltiplas parcerias e inúmeras regravações, Mauro deixou seu talento em vários livros além do já citado "Baião de 2" com Leoni, entre romances e poesia: "Errância", "A Sombra do Faquir", "Decolagem ", "A Todo o Transe" e o último, o elogiado "Bofete", lançado em 2024. Neste mesmo ano, participou como coautor da coletânea "Minha Copa Para Sempre" ao lado de Silvio Lancelotti, Kleber Machado, Milton Leite, Milton Neves e outros, sobre as histórias pessoais de cada um sobre a Copa do Mundo.

Botafoguense apaixonado, assim escreveu em seu perfil quando o Alvinegro conquistou a Libertadores no fim do ano passado: "Um dia histórico, um jogo épico. Depois do início inacreditável (...) Rolaram lágrimas de felicidade. Ontem foi escrita a página mais apoteótica do glorioso clube da estrela solitária. Que venham outras de tamanha importância. Fogão, eu te amo! Saudações alvinegras."