Memórias, livro de formação, autobiografia. Todas as classificações oferecidas abraçam, porém, são insuficientes para rotular "O Tempo da Infância" (Todavia, R$ 68,50), o único livro que a antilhana Françoise Ega publicou em vida. Destacada militante dos direitos de imigrantes das ex-colônias francesas, ela morreu em 1976, em Marselha, onde foi empregada doméstica antes de se dedicar às causas sociais.
Na década de 1960, folheando uma revista Paris Match, descobriu a existência de Carolina Maria de Jesus, para quem passou a escrever cartas jamais enviadas, descrevendo seu cotidiano e imaginando as semelhanças entre ambas, marcadas pelas dificuldades da sobrevivência com subempregos. O material epistolar foi reunido, depois de sua morte, em "Cartas a uma Negra" (Todavia, R$ 50,90).
As recordações da infância paupérrima na Martinica trazem o olhar entusiasmado de quem cresceu, no início do século XX, em um lugarejo de subsistência básica, onde plantas ornamentais crescem na terra, sem ter as raízes "aprisionadas" em vasos - o que a menina Françoise vê pela primeira vez ao visitar parentes na capital da ilha. Em Morne-Rouge, ao lado de irmãos e da mãe, costureira, ela é incentivada a estudar e a aprender francês, deixando de lado o idioma local, enquanto toma noção de sua ascendência africana e que a população nativa foi quase toda dizimada pelos franceses invasores. O sincretismo religioso norteia o grupo: todos vão a missas, casam-se sob as bênçãos do padre católico, mas recorrem a médiuns, dos quais acatam recomendações - incluindo a de abandonar a localidade antes da erupção de um vulcão. O fim da infância vem quando a mãe decide pela emigrar para a França, em busca da prosperidade metropolitana.
NA ESTANTE
A INSUBMISSA
As recordações da uruguaia Cristina Peri Rossi sobre sua infância e adolescência, também prescinde de
categorização literária. Poeta, romancista e ensaísta, ganhou o Prêmio Cervantes, o maior da literatura em
espanhol, em 2021. Radicada na Espanha desde 1972, nunca voltou a morar no Uruguai. A ditadura militar proibiu a circulação de toda sua produção literária no país, entre 1973 e 1985. No livro, a irreverência se desenvolve desde bem pequena. A descoberta pessoal da homossexualidade é apresentada sem culpas. Ed. Bazar do Tempo (R$ 78).
CEM ANOS DE SOLIDÃO
O romance que consagrou o realismo fantástico do colombiano Gabriel García Márquez, ganha nova e belíssima edição, com ilustrações da chilena Luisa Rivera. Foi a partir da saga da família Buendia, que funda Macondo, cidade tomada por anos de chuva, publicada em 1967, que se inicia o boom da literatura latino-americana, da qual Garcia Márquez, Prêmio Nobel de Literatura de 1982, se tornaria o principal
representante. O misticismo se mescla à realidade para narrar amores, a curiosidade científica
e a evolução política no vilarejo isolado. Ed. Record (R$ 170,90).
DIÁRIOS DE GAZA - A MEMÓRIA É UMA CASA INDESTRUTÍVEL
Reúne textos escritos nos três primeiros meses de ataques a Gaza. Médicos, escritores, jornalistas, cineastas, professores, estudantes, artistas relatam suas próprias experiências ou de outros que veem famílias dizimadas neste inconcebível cerco a uma população lentamente exterminada pelo Estado de Israel. O mundo ainda reluta em combater diretamente a tortura a que essas pessoas são submetidas, pois Israel conta com o presidente dos EUA, Donald Trump, como aliado. Ed. Tabla (R$ 64,90).