Por: Affonso Nunes

'O Agente Secreto' domina bilheterias nacionais e reacende debate sobre viabilidade do cinema brasileiro

Wagner Moura lidera o elenco de 'O Agente Secreto, com exibição confirmada para 90 países antes de tentar a sorte no Oscar 2026 | Foto: Victor Jucá/CinemaScopio

Filme de Kleber Mendonça Filho com Wagner Moura atinge 340 mil espectadores e registra melhor abertura nacional do ano, enquanto segue trajetória internacional rumo ao Oscar

A chegada de "O Agente Secreto" aos cinemas brasileiros na primeira semana de novembro materializou algo que o setor cinematográfico nacional persegue há anos: a comprovação de que produções autorais e com brasilidade podem conquistar o grande público sem abrir mão de complexidade narrativa ou ambições estéticas. A chave do sucesso geralmente parte de uma história bem contada e, se tiver nosso tempero, tanto melhor.

O longa de Kleber Mendonça Filho protagonizado por Wagner Moura alcançou cerca de 340 mil espectadores entre as sessões antecipadas e o lançamento oficial na última quinta-feira (6), estabelecendo-se como a maior abertura de um filme brasileiro em 2025 e liderando o fim de semana nos cinemas do país, segundo dados da Comscore.

O resultado é um feito inédito na filmografia do cineasta pernambucano. Kleber Mendonça Filho consolidou-se internacionalmente com obras como "O Som ao Redor" e "Aquarius", que arrancavam aplausos em festivais internacionais, ams sem jamais chegar perto desses números. A performance de "O Agente Secreto" nas bilheterias brasileiras é a melhor abertura em público de toda a carreira do diretor, superando inclusive "Bacurau", seu projeto anterior em parceria com Juliano Dornelles, que em 2019 atraiu o público após vencer o Prêmio do Júri em Cannes.

Após anos de oscilações na participação de mercado do cinema brasileiro, intensificadas pelas transformações nos hábitos de consumo durante a pandemia e pelo esvaziamento das políticas públicas de fomento, "O Agente Secreto" foi apenas o segundo longa brasileiro a estrear na liderança das bilheterias em 2025, conforme levantamento do Filme B.  Com mais de 700 cinemas e 1,4 mil salas em todo o Brasil, a produção registrou o maior alcance de um lançamento brasileiro no ano. 

Paralelamente à performance doméstica, "O Agente Secreto" mantém trajetória consistente no circuito internacional. Após estrear em Cannes, onde Kleber Mendonça Filho conquistou o prêmio de Melhor Diretor e Wagner Moura o de Melhor Ator, o filme passou por mais de 50 festivais, acumulando quase 20 premiações. Recentemente, Moura recebeu novo reconhecimento como melhor ator no Newport Beach Film Festival, nos Estados Unidos, reforçando a recepção positiva de sua atuação. O longa estreou nos cinemas da Alemanha e Portugal, e agora se prepara para o mercado norte-americano, com lançamento em Nova York no dia 26 de novembro, Los Angeles em 5 de dezembro, e posterior expansão nacional. Na França, a estreia está prevista para 17 de dezembro.

A MK2, responsável pela comercialização internacional, confirma lançamento em mais de 90 países, incluindo mercados cinematográficos expressivos como China, México e Coreia do Sul, além de territórios diversos como Grécia, Índia, Nova Zelândia e Finlândia. Essa amplitude distributiva internacional representa não apenas a valorização comercial do projeto, mas também a inserção do cinema brasileiro em circuitos globais de exibição, movimento essencial para a sustentabilidade econômica de produções nacionais de alto orçamento.

O filme representa o Brasil na disputa por uma vaga na categoria de Melhor Filme Internacional do Oscar, competindo ainda pelos prêmios de Melhor Roteiro Original e Melhor Ator no Gotham Awards, uma das principais premiações do cinema independente. 


Cotado ao Oscar, Wagner Moura pediu dicas a Fernanda Torres e Walter Salles

O nome de Wagner Moura tem sido frequentemente especulado para uma indicação ao Oscar de Melhor Ator por seu desempenho em 'O Agente Secreto', já em cartaz nos cinemas | Foto: CinemaScopio

Protagonista do filme "O Agente Secreto", Wagner Moura afirma que já está se preparando para a campanha do filme ao Oscar, premiação na qual ele pode ser indicado ao prêmio de melhor ator.

"É um filme sobre um homem que resolve se manter fiel a seus valores quando tudo que está em volta dele diz o contrário", afirmou o artista, em entrevista ao Fantástico, da TV Globo. "Conversei com Waltinho [Walter Salles], com aquela sabedoria dele que me orienta muito. Falei também com Nanda [Fernanda Torres]. Estou com gás para a campanha."

Dirigido por Kleber Mendonça Filho, "O Agente Secreto" é um thriller que se passa em dois tempos, mas a ação principal acontece em 1977, durante a ditadura militar. No tempo atual, duas pesquisadoras ouvem fitas cassetes com conversas gravadas dos personagens daquela época e tentam desvendar o destino de Marcelo, personagem de Wagner Moura que chega a Recife dirigindo um Fusca amarelo no meio de um carnaval.

Em Recife, Marcelo se junta a um grupo de refugiados após ser ameaçado de morte por um empresário ligado ao governo. Com outra identidade, ele busca respostas do seu passado e luta para sobreviver. A produção foi a escolhida do país para tentar vaga no Oscar 2026.

Em maio, Mendonça Filho saiu vencedor do Festival de Cannes, com o troféu de melhor direção pelo filme, e Moura foi laureado no mesmo evento com a premiação de melhor ator, consagrações que atraíram ainda mais atenção internacional para o longa.

Durante a entrevista com a jornalista Maju Coutinho, Moura relembrou o capitão Nascimento, protagonista do filme "Tropa de Elite", um de seus principais papéis no cinema.

"Convivi com muitos homens do Bope. Eles eram íntegros e acreditavam que faziam algo importante para o país." O personagem é relembrado pouco tempo após uma operação da polícia ter deixado 121 pessoas mortas nos complexos do Alemão e da Penha, no Rio de Janeiro. Para alguns espectadores, o filme naturaliza a violência policial.

"As pessoas podem interpretar o personagem da forma que quiserem", afirma o ator. "Mas não podemos normalizar haver 121 corpos de pessoas mortas no chão, isso é uma loucura, uma maluquice."
Ele falou ainda sobre "Last Night At The Lobster", primeiro filme que dirige nos Estados Unidos. Além de assinar a direção, ele também atua no longa. "É um filme típico de Natal americano. Essa magia não vem do céu, mas sim das pessoas."