Por: Rodrigo Fonseca - Especial para o Correio da Manhã

O brilho bem desenhado de Michel Gondry

Michel Gondry: 'Concebi esses projetos para me comunicar com a minha filha e incorporei elementos que são parte do imaginário dela' | Foto: Partizan Films

Ganhador do Oscar pela história de amor entre Jim Carrey e Kate Winslet, o realizador francês traz ao Brasil animação feita em duo com sua filha

Michel Gondry não parecia bem disposto em sua passagem pela Berlinale, apesar de ter saído da maratona germânica com o Urso de Cristal da seção Generation pelo desenho animado "Maya, Me Dê Um Título". Ele virou sensação na Mostra de São Paulo, sobretudo entre as plateias mirins. Na Alemanha, talvez pela sensação térmica de - 5°, sob a neve de fevereiro, ele não exultava a mesma vibração que demonstrou ao levar sua obra para o Festival de Annecy, no calor francês de junho, onde deu até masterclass sobre a arte de animar. Mago dos videoclipes na década de 1990, o cineasta francês ganhou um Oscar, 20 anos atrás, por aquela que talvez seja a love story mais tocante (ou, no mínimo, a mais original) do século XXI: "Brilho Eterno De Uma Mente Sem Lembranças". Ninguém amou Kate Winslet com mais ardor... pelo menos nas telonas... do que Jim Carrey, que superou até o benquerer de Leonardo DiCaprio por ela em "Titanic" (1997). Ainda existe lirismo na fase atual do diretor de 62 anos, porém ela caminha por um terreno mais... infantojuvenil. A filha pequena dele é personagem e coautora de seus mais novos exercícios autorais. Fez com ela ainda "Maya, Donne-Moi Un Autre Titre". O primeiro desses dois experimentos está na Mostra de São Paulo, em sessões no Circuito SP Cine daqui até o dia 29.

"Concebi esses projetos para me comunicar com a minha filha e incorporei elementos que são parte do imaginário dela, como uma batata frita especial, construindo sua musicalidade a partir de um banco de sons que encontrei na internet, sem buscar que melodia e imagem tivessem uma conexão direta", disse Gondry ao Correio, em Berlim, quando sua animação virou febre na capital alemã, mesmo com ele meio devagar... devagarinho, andando por aquela metrópole do Velho Mundo. "Quando eu expliquei pra ela o que queria fazer, sua resposta foi um sincero: 'Bora, vamo fazer'. O maior barato do cinema animado é que, em sua dramaturgia, você pode colocar o mundo em perigo e escalar uma menina como a Maya para salvar a pátria".

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Michel Gondry e sua filha, Maya, na sessão da Berlinale onde a primeira parte de seu díptico animado foi laureada com o Urso de Cristal | Foto: Berlinale.de

Em sua passagem pelo Rio, há 16 anos, com direito a encontro com Caetano Veloso, em meio a uma retrospectiva de sua obra, o diretor de "Rebobine, Por Favor" (2008) descobriu que muita gente aprendeu a amar (ou acha que aprendeu) assistindo a "Brilho Eterno De Uma Mente Sem Lembranças". Fala pouco sobre paixão, mas não evita falar de sua gênese profissional, nos clipes da MTV. "Human Behavior", com Björk, é o mais aclamado deles.

"Quando a gente fazia esses vídeos musicais, no passado, havia televisão. As pessoas tinham o hábito de parar por horas... uma hora que fosse... para ver os filmes que fazíamos para músicas que viraram hit com a preocupação de não deixar a forma plástica daquelas narrativas ultrapassar a beleza da história narrada nas letras. Hoje, as pessoas assistem a clipes no YouTube como querem. Elas não têm mais espaço na agenda para reverenciarem as tramas que poderiam ser montadas a partir de canções, pois o celular ocupa a atenção de todos e nos devora", disse Gondry, que já vem sendo cotado para a categoria anima do Oscar de 2026 pelas duas aventuras com Maya.

 

AS BOAS DA PAULICEIA - QUINTA-FEIRA (23/10)

De Volta Pra Casa | Foto: Divulgação

DE VOLTA PARA CASA ("Hui Jia"), de Tsai Ming-liang (Taiwan): Nesta análise geopolítica do diretor de "O Buraco" (1997), somos apresentados a Anong, um dos muitos laosianos que deixaram sua terra natal. No início de 2025, ele viajou para rever sua família. Partir parece ser seu destino. "Falo de homens em instâncias distintas da linguagem, que não falam a mesma língua, mas se encontram", explicou Tsai ao falar o longa na Berlinale. Onde: Cinesesc, 15h.

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Love Kills | Foto: Filmland Internatonal

LOVE KILLS, de Luiza Shelling Tubaldini (Brasil): Versão para as telas da HQ homônima de Danilo Beyruth. A trama se passa num centro de São Paulo devastado pelo crack. Na maior metrópole do país, uma jovem vampira, Helena, frequenta um estranho café na metrópole, cativando um garçom ingênuo. À medida que ele descobre os segredos dela e o submundo da cidade, ele é atraído para um mundo perigoso de intrigas. Onde: Cinesesc, 21h.

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Sexa | Foto: Divulgação

SEXA, de Gloria Pires (Brasil): Que delícia é ver uma de nossas maiores estrelas estrear na direção. Gloria é Bárbara, empoderada figura que, aos 60 anos, está indignada com as injustiças do envelhecimento. Depois de seu último romance, ela abre mão do amor para ter uma boa relação com o filho, que a vê como uma idosa recatada e do lar. E ela quer revirar as caixinhas em que a depositaram. Para isso, conjuga o verbo "amar". Onde: Reserva Cultural, 21h40.